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Câmara dificulta a cobrança de royalties

FSP, Dinheiro, p. B4
13 de Nov de 2003

Câmara dificulta a cobrança de royalties
Deputados aprovam MP que permite uso de soja modificada na atual safra; texto tem de ser aprovado no Senado

Fernanda Krakovics

A Câmara dos Deputados aprovou ontem a medida provisória que autoriza o plantio e comercialização de soja transgênica na safra 2003/2004. Entre as modificações incluídas no texto pelos parlamentares está a que dificulta a cobrança de royalties pela Monsanto, empresa que detém a tecnologia de soja transgênica.
A empresa anunciou a intenção de cobrar royalties sobre os grãos que serão colhidos pelos agricultores no próximo ano. O texto aprovado exige que a cobrança incida sobre a semente da soja. Na prática, isso não poderá ocorrer na atual safra, pois os produtores compraram sementes contrabandeadas da Argentina, sem registro que permita a exigência de royalties pela Monsanto.
"Os produtores já pagaram pelo direito de usar a tecnologia quando adquiriram as sementes na Argentina. Essa questão vai para a OMC [Organização Mundial do Comércio]", disse o Paulo Pimenta (PT-RS), relator da matéria.
De acordo com Pimenta, um saco de semente produz 50 sacos de grãos, o que aumentaria muito a rentabilidade para a empresa. Ele entende que não cabe cobrança de royalties na atual safra.
A cobrança de royalties no futuro será regulamentada pela lei de biossegurança, que vai reger o plantio e a comercialização de todos os produtos transgênicos e está em tramitação no Congresso.
Outra alteração inserida pelos deputados é a autorização para a multiplicação de sementes de variedades de soja transgênica desenvolvidas por instituições de pesquisa brasileiras.
A comercialização dessas sementes fica vetada até a existência de legislação específica que as libere -no caso, o projeto de lei de biossegurança. A MP aprovada permite que essas sementes tenham registro provisório no Ministério da Agricultura.
Na prática, essa regra, que não constava no texto original enviado pelo governo, permite a criação de um estoque de sementes transgênicas. A autorização foi inserida no projeto de lei de conversão da MP 131, que ainda terá de ser aprovada no Senado. A votação foi simbólica, sem identificação nominal dos deputados.
Segundo Pimenta, há 42 variedades de soja transgênicas desenvolvidas pela Embrapa, Fundação Mato Grosso, Coodetec -uma associação de cooperativas do Paraná- e pela subsidiária da Monsanto no Brasil. Todas elas são resistentes ao herbicida glifosato.
"Com a proibição da multiplicação de sementes não teríamos nos próximos anos produção para o cultivo comercial, causando um prejuízo incalculável ao país, que estará privado desse insumo por pelo menos três anos", afirmou o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR).
Pimenta disse que essas sementes estão em fase de desenvolvimento e só estarão prontas para o plantio daqui a três anos.
A modificação foi inserida no parecer do relator momentos antes da votação, com apoio da bancada ruralista. O Ministério do Meio Ambiente, deputados do núcleo agrário do PT e ambientalistas foram contrários à medida.
A MP foi editada para resolver o problema de produtores, sobretudo do Rio Grande do Sul, que já usam sementes geneticamente modificadas, contrabandeadas da Argentina, há cerca de seis anos. A legislação em vigor proíbe o uso de sementes transgênicas.
Dos 93 deputados do PT, 22 encaminharam uma declaração de voto contrária ao parecer de Pimenta à mesa diretora da Casa.

Produtores do RS e Monsanto não chegam a acordo

LÉO GERCHMANN

Reunião ocorrida ontem entre o gerente de assuntos corporativos da Monsanto, Alfredo Miguel Neto, e representantes da Fetag (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul) mostrou o impasse existente em relação à forma como os royalties da empresa norte-americana sobre a soja transgênica serão cobrados. A Monsanto quer em média R$ 1 por saca de soja transgênica, e os agricultores aceitam pagar só no momento em que a semente modificada for efetivamente comprada pela produção.
Dezesseis sacas de soja equivalem a uma tonelada. A Monsanto propõe que sejam pagos R$ 15 por tonelada de quem plantar declaradamente transgênico e R$ 25 de quem não houver declarado e tiver a carga apreendida. Na média, isso equivale a R$ 1 a saca -valor utilizado por produtores e Monsanto.
"Hoje, a produção é misturada. A cobrança da Monsanto é justa, mas tem de ocorrer quando for feita proposta de preço", disse o presidente da Fetag, Ezídio Pinheiro.
O presidente da Monsanto, Richard Greubel, já disse que pretende cobrar ainda nesta safra, no momento em que a produção for vendida. É o que os produtores não aceitam. Para a próxima safra, quem quiser a semente saberá antes o que paga à empresa, que tem a patente da tecnologia Roundup Ready.
Segundo a Fetag, o gerente de assuntos corporativos da Monsanto, Alfredo Miguel Neto, ameaçou na reunião prejudicar as exportações de soja transgênica caso a empresa não receba royalties. O encontro foi fechado. De acordo com a entidade, o representante da Monsanto disse que, caso os produtores não paguem os royalties, a empresa poderá afirmar aos importadores que o produto brasileiro "é pirata".
O relato da Fetag sobre as afirmações da Monsanto foi informado à Folha após a reunião. A reportagem não consegui localizar a empresa para comentar as declarações.

Apreensão
Fiscais da Secretaria da Agricultura gaúcha anunciaram a apreensão de carga de transgênicos oriundos de Santa Catarina -é proibida a transferência da produção transgênica de um Estado para outro.

FSP, 13/11/2003, Dinheiro, p. B4

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