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Caiapós se preparam para guerra contra os invasores

O Liberal - Belém - Pará
Autor: Carlos Mendes
18 de Fev de 2001

Os 120 índios Kayapó da reserva Baú, localizada entre os municípios de Altamira e Novo Progresso, estão furiosos com a decisão do ministro Nilson Naves, do Superior Tribunal de Justiça (ST J), que acolheu liminar da prefeitura de Novo Progresso contestando a Portaria 826/98, do Ministério da Justiça, sobre os 1,850 milhão de hectares da área. Desde o início da semana passada, os caciques Kayapó preparam a tribo para uma guerra. E avisam que se a decisão for mantida, durante o julgamento do mérito do mandado de segurança, as consequências serão imprevisíveis na região. "Haverá guerra e a culpa será do governo e da Justiça, que dizem uma coisa e fazem outra", adverte Bei Kayapó.

Os fazendeiros acreditam que o ST J também dará razão a eles no julgamento do mérito, reduzindo a área caiapó para 1,4 milhão de hectares. Hoje, na área contestada, vivem mais de 500 famílias de pequenos proprietários rurais, fazendeiros e madeireiros que exploram as últimas reservas de mogno da reserva. A Funai em Brasília, sempre omissa quando chamada pelos índios a defender seus direitos, não comenta o acatamento da liminar pelo ST J.

Mas o chefe do posto da Funai em Colider (MT), Megaron Txucarramãe, com sua experiência de negociador em grandes conflitos envolvendo índios e "brancos", faz um alerta: a situação merece uma providência imediata. os Kayapó estão muito descontentes".
Contesta -A subprocuradora da República em Brasília, Gilda Berger, responsável pelo setor de Direitos Indígenas do Ministério Público Federal, redigiu um parecer contestando os argumentos da prefeitura de Novo Progresso no recurso que ainda não foi julgado. Ela diz, no documento, que a prefeitura não é parte legítima na ação. E sustenta que a reserva Baú não está dentro do território daquele município.

A mesma opinião é compartilhada pelo procurador da República no Pará, Felício Pontes Júnior, para quem a decisão do ST J já "perdeu efeito". 0 procurador entende que é preciso dizer aos índios que não existe nenhuma decisão definitiva. A portaria baixada em setembro do ano passado pelo ministro da Justiça, José Gregori, reconhecendo a área Baú como tendo 1 ,850 milhão de hectares, enfatiza o procurador, "continua valendo".

0 ST J entendeu que a portaria 826/98, editada pelo ex-ministro da Justiça, José Carlos Dias, e não a de setembro do ano passado, do ministro Gregori, não atendeu as normas que regem o procedimento administrativo para a demarcação de terras indígenas. Ela teria sido editada "sem as peças técnicas necessárias ao processo de demarcação, além de não ter feito a publicação de seu resumo no Diário oficial da União e dos Estados, como manda a lei", segundo o ST J.

Violação -Os municípios de Altamira e Novo Progresso, bem como o governo do Pará, ainda de acordo com o ST J, foram alijados do processo administrativo que redundou na edição da portaria. "Houve violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa", argumenta o Tribunal. "É claro que o ST J se refere à portaria de 1998, que já caducou e foi substituída pela portaria do ministro Gregori", comenta Felício Júnior.

A prefeitura de Novo Progresso contesta o tamanho da reserva, afirmando que se ela ficar como está deverá engolir 60% do territÓrio municipal. "É uma área muito grande para tão poucos índios. Há centenas de famílias sem terra para plantar e criar gado na região que não podem ser ignoradas", afirma o prefeito de Novo Progresso, Juscelino Rodrigues (PSDB).

Megaron Txucarramãe discorda do prefeito e defende o direito de os Kayapó ficarem nos 1,850 milhão de hectares determinados pelo ministro Gregori. "Aquele local sempre foi dos índios e ninguém pode tirá- los de lá. Se querem entregar a terra para derrubar a floresta e retirar o mogno haverá luta", prevê.

Estudo -O procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas está definido pelo decreto 1.775/96. Segundo ele, a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em estudo antropológico de identificação, complementado por outros de natureza etno- histórica, sociológica, cartográfica, fundiária e ambiental. Esses estudos têm por finalidade reconhecer os quatro componentes das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios definidos pela Constituição, a saber: as terras por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem-estar, e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

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