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Brasileiros exploram a Amazônia

Valor Econômico, Tendências & Consumo, p. B6
25 de Mar de 2011

Brasileiros exploram a Amazônia
Agência Matueté usa barco da ONG ISA para pacotes de luxo

Daniela Chiaretti
De São Paulo

O que há em comum entre uma ONG famosa por seu trabalho com populações indígenas e uma agência de viagens personalizadas? Resposta: um barco de expedição e muita floresta.
O Instituto Socioambiental (ISA), a ONG que, somando tudo, tem mais de 30 anos de trajetória na defesa dos direitos dos índios no Xingu, no Vale do Ribeira e no rio Negro, é a dona do "Sebastião Borges", o barco que pertencia ao fotógrafo Pedro Martinelli, amigo e colaborador do ISA. Por sua vez, a Matueté (que quer dizer "muito bem feito", em tupi guarani) é a agência que existe desde 2002 e produz viagens no turismo de luxo. São mil brasileiros por ano viajando aqui e no exterior e outros mil estrangeiros viajando no Brasil. Em comum, buscam experiências diferentes e fora do turismo de massa.
A parceria recém-acertada entre ISA e Matueté é a de promover, no barco dos antropólogos, viagens de conhecimento da Amazônia. Isso significa que um pequeno grupo de turistas (até 12 pessoas) poderá subir o rio Negro em roteiros de 5 a 12 dias e intercalar jantares na casa dos ribeirinhos e luaus nas praias amazônicas com palestras sobre biodiversidade e características do ecossistema. É uma imersão na vida da floresta.
O ISA também tinha um bom motivo econômico para entrar na história - barcos têm manutenção cara e a iniciativa ajudará a viabilizar as viagens de trabalho dos pesquisadores da ONG. Ficou acertado que 10% do custo da viagem para o cliente irá para o fundo de pesquisa do ISA. O preço varia conforme a duração da viagem (o mínimo é de 5 dias) e o número de pessoas do grupo (que são fechados pelos clientes). Sem a parte aérea, sai por R$ 3 mil em um grupo de 10 pessoas ou R$ 4,5 mil, para seis, por 5 dias.

Para a Matueté trata-se de abrir um braço importante de negócios. Até há pouco, a floresta seduzia quase só estrangeiros, principalmente europeus. Isto ficou no passado. Se antes a empresa fazia cinco a seis viagens ao ano pelo Tapajós e os brasileiros não representavam 20% da clientela, hoje são 40 a 50 viagens pela Amazônia com fretamento de barco e os brasileiros são 40% dos viajantes. "O brasileiro, agora, quer entender o que é esta floresta que o Brasil se orgulha tanto de ter, o que significa este protagonismo ambiental em uma das áreas mais faladas e menos conhecidas do mundo", diz Martin Frankenberg, diretor da agência. A Amazônia tornou-se estratégica para a Matueté. Depois do Rio de Janeiro, é o destino mais importante. "A elite mundial quer conhecer a Amazônia e há uma pressão cada vez maior de brasileiros que querem conhecer também."
Mas viajar por ali não é para amadores. "A infraestrutura turística na Amazônia é a de um Brasil antigo", diz Frankenberg. Há basicamente três maneiras de se conhecer a região. Ou ir para hotéis de selva, ou embarcar em barcos grandes, de 150 cabines, com saídas regulares, ou fretar um barco pequeno e montar a viagem ao gosto do freguês - o nicho de atuação da Matueté.
Foi em 2009, quando lançou o Projeto Amazônia, que a agência se aproximou do ISA. A iniciativa foi desenhada pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), uma associação civil sem fins lucrativos que trabalha há 14 anos na proteção da biodiversidade. No pacote havia o roteiro da viagem e seminários com especialistas como o climatologista Carlos Nobre, a geógrafa Bertha Becker e o antropólogo Carlos Alberto Ricardo, sócio fundador do ISA e coordenador do Programa Rio Negro do ISA. "Assim a Amazônia deixa de ser teoria", diz Frankenberg. Um grupo de executivos da Natura conheceu a floresta sob esta perspectiva.
Beto Ricardo é um pioneiro nos estudos do alto rio Negro, que conhece desde 1987, quando chegou a São Gabriel da Cachoeira a convite dos índios da região, "para uma assembleia que tinha como tema o Programa Calha Norte, de inspiração militar", conta. "As terras indígenas não estavam demarcadas, o Brasil vivia o processo de preparação da nova Constituição Federal", lembra. O alto rio Negro é uma região de 23 etnias e população majoritariamente indígena. "A Amazônia só pode ser entendida em sua totalidade", ensina. "Uma região compartilhada por nove países e onde vivem mais de 370 etnias nativas", prossegue. No Brasil, são cerca de 250 etnias e algo próximo a 900 mil índios.
Os viajantes pela "maior bacia de água preta do mundo" terão informações como estas nas palestras no barco, entre um luau e outro. Não irão conhecer aldeias indígenas - para estas visitas é preciso ser convidado pelo cacique e ter autorização da Funai. O médio rio Negro é o paraíso dos pescadores esportivos de tucunarés, em busca de recordes. Esta prática pressiona os recursos pesqueiros do rio. "As viagens da Matueté no Sebastião Borges não incluem pesca de tucunaré", deixa claro Ricardo. O destino será lançado na Travelweek, uma grande feira de viagens que acontece em abril, em São Paulo.

Valor Econômico, 25/03/2011, Tendências & Consumo, p. B6

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