VOLTAR

Brasil fica isolado em reunião da ONU sobre biodiversidade

FSP, Ambiente, p. B8
03 de Mar de 2020

Brasil fica isolado em reunião da ONU sobre biodiversidade

Ana Carolina Amaral
A diplomacia brasileira estaria trabalhando para frear o progresso das negociações de um novo acordo global pela conservação da biodiversidade, segundo diplomatas de diversas nacionalidades ouvidos pelo blog.

Os países têm até outubro - quando acontece a COP-15 da biodiversidade, na China - para chegar a um novo plano global, já que o atual, assinado em 2011, termina este ano.

Os objetivos são conservar áreas protegidas, evitar extinção de espécies e promover um uso sustentável dos recursos naturais, com apoio financeiro aos detentores de grandes reservas ambientais.

O primeiro rascunho do documento apareceu na última semana, em negociação que foi até o sábado (29) com diplomatas de 140 países reunidos em Roma.

O Brasil - um dos maiores detentores da biodiversidade do mundo - não parece interessado em um acordo global.

Segundo negociadores, o país teria se recusado a discutir questões técnicas e optado por trazer discussões que não estavam em negociação, usando linguagem agressiva e propostas absurdas - que chegaram a ser respondidas com risadas.

O blog conversou sob condição de anonimato com diplomatas de três países de diferentes regiões e dois representantes de ONGs internacionais que acompanharam as negociações na condição de observadores.

Em todos os relatos colhidos pelo blog, a atuação brasileira foi descrita como uma clara estratégia de distração, com constante desvio de atenção para questões que não estavam na mesa.

A radicalização dessa postura afastou países que costumavam ser representados pelos pronunciamentos brasileiros, como a Argentina, países africanos e grandes detentores de florestas.

Os depoimentos também apontam falta de embasamento técnico e linguagem agressiva como motivos para o isolamento do Brasil.

A representação brasileira chegou a gerar risos em uma reunião ao insinuar que a biopirataria seria a principal ameaça das áreas protegidas - apesar dos dados alarmantes sobre degradação e desmatamento.

O ministro Leonardo de Athayde também foi duramente criticado por causar confusão ao levar para a mesa questões da negociação de mudanças climáticas, que não caberiam no acordo de biodiversidade. Athayde é negociador-chefe do Brasil nos dois temas.

Segundo o Itamaraty, a estratégia brasileira tem como objetivo conseguir mais recursos financeiros para a conservação.

"Historicamente, o pilar de distribuição de benefícios tem sido negligenciado", diz nota do Itamaraty enviada ao blog. "O objetivo é fazer que se caminhe para maior efetivação desse pilar, o que poderia assegurar recursos e transferência de tecnologia para países em desenvolvimento".

No entanto, os pares internacionais têm outras interpretações sobre a conduta diplomática do Brasil, vista como um sinal de pouco comprometimento com a conservação da biodiversidade.

Na opinião de um dos negociadores de um país desenvolvido, a estratégia do Brasil seria pragmática e econômica. O país visaria, no curto prazo, evitar mais condicionantes ambientais para acordos comerciais.

O acordo comercial negociado entre Mercosul e União Europeia - colocado sob suspense desde a crise das queimadas na Amazônia - já menciona como condicionante o cumprimento do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, pelo qual o Brasil se compromete com o desmatamento ilegal zero.

Embora não acreditem que a atuação brasileira possa impedir a assinatura de um acordo pela biodiversidade no próximo outubro, os diplomatas temem que as intervenções do país atrasem o processo, evitando o alcance de consensos mais significativos - o que resultaria em um acordo fraco.

FSP, 03/03/2020, Ambiente, p. B8

https://ambiencia.blogfolha.uol.com.br/2020/03/02/brasil-atrapalha-acor…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.