VOLTAR

Brasil é o 4o país mais desigual da América Latina

OESP, Metrópole, p. C3
22 de Ago de 2012

Brasil é o 4o país mais desigual da América Latina
Relatório da ONU sobre a situação das áreas urbanas mostra ainda que 1 em cada 4 brasileiros vive em moradias precárias

FELIPE WERNECK / RIO

O Brasil é o quarto país mais desigual da América Latina, atrás apenas de Guatemala, Honduras e Colômbia. É o que indica o relatório "Estado das Cidades da América Latina e do Caribe 2012 - Rumo a uma nova transição urbana", divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat). A região ainda tem 111 milhões de pessoas vivendo em moradias precárias (um quarto da população).
O órgão admite, no entanto, que houve melhora na distribuição de renda nos últimos anos. Em 1990, o Brasil encabeçava a lista dos piores. O país da região com menor índice de desigualdade atualmente é a Venezuela. "Para as Nações Unidas, o principal desafio é desenvolver estratégias para combater a desigualdade. Isso é o mais importante. Sabemos que as cidades latino-americanas têm riqueza suficiente para reduzir essa situação", disse o representante do ONU-Habitat, Erik Vittrup.
Favelas. O relatório internacional divulgado ontem mostra também que um quarto da população da América Latina é pobre, ou seja, vive com menos de US$ 2 por dia, conforme critério adotado pela ONU. São 124 milhões de pessoas, das quais 111 milhões moram em moradias precárias, incluindo favelas. Em 20 anos (1990-2010), aumentou em 5 milhões o número de habitantes nos chamados assentamentos precários.
No Brasil, o porcentual de moradores desses locais (28%), com deficiências estruturais, falta de saneamento e de água, é um pouco maior do que a média latino-americana, de 25%. "As favelas deveriam ser um foco prioritário", diz Vittrup.
O porcentual de pessoas sem saneamento adequado na região chegou a 16% da população, ou 74 milhões de pessoas. Em relação ao abastecimento de água, a situação é melhor: 92% da população urbana tem acesso a água encanada. Mas a qualidade e o custo do serviço ainda são questionáveis.
Violência. Sobre a questão da violência urbana, o representante da ONU disse que o problema é tão generalizado na região que foi apontado como principal prioridade em uma consulta a prefeitos. "Nesse quesito, a situação é mais crítica no México e na Guatemala", disse Vittrup. De acordo com o relatório, as cidades da região apresentam altos níveis de violência e insegurança, que "parecem superar a capacidade de resposta de vários governos".
Entre as recomendações, o relatório aponta a necessidade de padrões de crescimento urbano mais sustentáveis e sugere que se aproveitem investimentos públicos para o benefício da população. Também destaca a necessidade de um planejamento mais ordenado e de se "orientar" os mercados imobiliários. "O parâmetro fundamental de desenvolvimento urbano deve ser o interesse coletivo", ressalta Erik Vittrup.

Na lista de municípios, Goiânia está em último

Goiânia é a cidade mais desigual da América Latina, conforme o estudo da ONU. Na lista dos dez locais da região com maior índice de Gini, que mede a desigualdade de renda, cinco são brasileiros.
Goiânia apresentou Gini de 0.65 (o índice varia de 0 a 1; quanto mais próximo de 1, pior). Fortaleza é a segunda cidade da lista, seguida por Bogotá, Belo Horizonte, Brasília e Curitiba. O Rio de Janeiro aparece na 13.ª posição e São Paulo, na 19.ª.
O estudo da ONU destaca que a capital de Goiás passa por um processo de favelização, por causa da baixa oferta de habitações. O ex-prefeito Iris Rezende (PMDB), porém, rebateu as informações da área de assentamentos humanos da ONU. "Em Goiânia não há favelas", diz, destacando que os dados "são absolutamente e visivelmente questionáveis".
"Eles inventam teorias, sem lógica ou fundamento", critica o ex-prefeito. "Em Goiânia há pobres, mas não miseráveis, e uma parcela é muito rica, como em Nova York, Paris, Londres", avaliou.
"Aqui não é e nunca foi o pior dos mundos", diz o promotor de Justiça e Urbanismo e Meio Ambiente, Maurício Nardini. Conforme o IBGE, Goiânia tem uma das melhores taxas de infraestrutura urbana no País, por ser uma das cidades mais arborizadas (89,5%). Procurado, o prefeito atual, Paulo Garcia (PT), estava em gravação, no primeiro dia de horário eleitoral, e não falou sobre o caso.
Fortaleza. Já na capital cearense, segunda no ranking, com um índice Gini acima de 0,60, os especialistas defendem o trabalho da ONU. Um estudo da Universidade Federal do Ceará (UFC) destaca o contraste local entre edifícios luxuosos à beira-mar e em bairros nobres - ao preço de R$ 5 milhões - e casebres à beira de rios sem nenhum saneamento básico. O último levantamento divulgado pelo Laboratório de Estudos da Pobreza da UFC, de 2008, aponta que o custo econômico da desigualdade em Fortaleza alcança mais de R$ 4 bilhões. Isso representa mais de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) do Ceará.
Os pesquisadores da UFC ressaltam que a distribuição de renda deveria se constituir em um ponto de reflexão na agenda de desenvolvimento do governo para esta década. Para eles, todos os esforços governamentais deveriam ser conduzidos para diminuir uma desigualdade causada principalmente pela vinda anual de 40 mil pessoas para áreas pobres da periferia.
A pesquisa sinaliza que Fortaleza precisa investir R$ 160 milhões ao ano em transferência de renda. Dessa forma, quase 400 mil fortalezenses com renda per capita mensal inferior a um oitavo do salário mínimo poderiam sair da linha da pobreza extrema. /FELIPE WERNECK, RUBENS SANTOS e LAURIBERTO BRAGA, ESPECIAIS PARA O ESTADO

É preciso rever o crescimento das nossas cidades

Análise: Heloísa Proença
EX-SECRETÁRIA DE PLANEJAMENTO DE SÃO PAULO, EX-PRESIDENTE DA EMURB, CONSULTORA DAS PREFEITURAS DE BOGOTÁ, CURITIBA

Se quisermos nos conectar com o que é mais dinâmico, eficiente, integrado e democrático no desenvolvimento, vamos ter de enfrentar a problemática do crescimento e do modelo de adensamento das cidades. Precisamos rever urgentemente o modelo de crescimento das nossas cidades. A desigualdade e a expansão horizontal provocam uma relação muito perversa: do poder público, exige um custo altíssimo para levar infraestrutura a lugares cada vez mais distantes - custo pago pelo povo. Da população, o sacrifício do movimento pendular diário de casa para o trabalho, e o desgaste também econômico que isso gera. Na verdade, a população paga duas vezes.
Em São Paulo, por exemplo, a densidade é de 70 habitantes por hectare. Trabalhar por um adensamento maior, de 200 habitantes por hectare, por exemplo, incentivaria uma relação mais equilibrada entre oferta de moradia e emprego, o que melhoraria a qualidade de vida da população. Hoje existe um acesso a serviços e benefícios muito desigual.

Não é preciso apenas levar infraestrutura para as periferias, mas reservar terra mais barata em locais onde essa estrutura já exista, para que toda a população usufrua.

OESP, 22/08/2012, Metrópole, p. C3

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,brasil-e-o-4-pais-mais-desi…
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,na-lista-de-municipios-goia…
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,e-preciso-rever-o-crescimen…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.