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Brasil aproveita mal potencial de energia solar; preço é obstáculo

OESP, Vida, p. A21-A22
25 de Jan de 2009

Brasil aproveita mal potencial de energia solar; preço é obstáculo
Países menos ensolarados, como Alemanha, produzem mais energia, que é 10 vezes mais cara que a convencional

Herton Escobar

Muito antes de descobrir as reservas de óleo do pré-sal, o Brasil já era - e sempre foi - uma das nações mais ricas do mundo em energia. É o país com a maior área territorial dos trópicos e, consequentemente, recebe uma quantidade gigantesca de radiação solar. O grau de aproveitamento dessa energia para produção de eletricidade, porém, é pífio. Nações de clima temperado e com territórios muito menores, que passam vários meses cobertos de neve, como Alemanha e Espanha, produzem mais energia a partir do Sol do que o Brasil.

"O lugar menos ensolarado do Brasil (Florianópolis) recebe 40% mais energia solar do que o lugar mais ensolarado da Alemanha", compara o especialista Ricardo Rüther, do Laboratório de Energia Solar da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Segundo ele, só em 2007, os alemães instalaram em seus telhados, na forma de painéis solares, o equivalente ao que produz a usina nuclear de Angra 2 (1.200 megawatts). O país europeu é o pioneiro no incentivo ao uso da energia solar, com um programa federal que subsidia a produção.

No Brasil, o uso da energia solar ainda se resume a aquecedores para água de chuveiro. O uso de sistemas fotovoltaicos para produção de eletricidade é bastante limitado. Mas o potencial é enorme. "Se a área do lago de Itaipu fosse coberta com painéis solares, isso produziria mais do que o dobro da energia que é produzida pela via hidrelétrica", afirma Rüther. No lugar dos atuais 25%, a usina produziria 50% da eletricidade consumida no Brasil.

Um problema é o preço: a energia elétrica solar ainda custa cerca de dez vezes mais do que a energia elétrica convencional, segundo o pesquisador Enio Pereira, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Outra é a escala: "O que teria de ser instalado em Itaipu corresponde a cerca de dez vezes o que já se instalou de painéis fotovoltaicos até hoje no mundo", afirma Rüther.

DESAFIO TECNOLÓGICO

Assim como no caso do pré-sal, ainda é preciso investir muito em infraestrutura e tecnologia até que o potencial energético do Sol possa ser colocado em prática. Um dos principais limitantes ao uso da energia solar para a produção de eletricidade - além do custo - é que ela não funciona 24 horas por dia e não pode ser estocada. "Ninguém vai investir numa grande infraestrutura para algo que só funciona quando o Sol está brilhando", resume o pesquisador Daniel Nocera, coordenador do Projeto Revolução Solar no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

O projeto reúne várias pesquisas que buscam baratear o uso da energia solar pelo desenvolvimento de novas tecnologias - entre elas, um sistema de armazenamento de energia solar na forma de hidrogênio, por meio da dissociação de moléculas de água. "No fundo, é tudo uma questão de preço, e isso cria uma questão para a ciência, que é o desafio de tornar a tecnologia mais barata", afirma Nocera.

Alternativa precisa de incentivos do governo
Aproveitamento da energia solar requer tecnologia nova e cara

O aproveitamento em grande escala da energia solar no Brasil para produção de eletricidade depende de incentivos do governo, a exemplo do que ocorre na Alemanha e na Espanha, dois países líderes no uso da tecnologia, segundo especialistas ouvidos pelo Estado. "Não há nenhum incentivo governamental hoje para a produção de energia solar no Brasil", diz o pesquisador Enio Pereira, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). "Nosso potencial de aproveitamento é enorme, mas, sem apoio do governo, isso não vai decolar nunca."

Como a tecnologia solar ainda é nova e cara, não consegue competir no mercado com as fontes tradicionais - e muito mais baratas - de energia. "No começo precisa ter subsídio", diz o físico Chigueru Tiba, da Universidade Federal de Pernambuco. "Todos os países subsidiam indústrias-chave."

É o que fazem Espanha e Alemanha, que garantem a compra da energia produzida via usinas solares por um período predeterminado, até que a escala de produção se torne economicamente autossustentável. Um exemplo no Brasil seria a indústria de álcool combustível, que teve subsídios no início, ganhou escala, e agora caminha com as próprias pernas.

A energia solar não está contemplada no Proinfa, programa do governo federal que busca promover o desenvolvimento de fontes alternativas de energia. Os incentivos são para energia eólica, fontes de biomassa e pequenas centrais hidrelétricas.

Segundo o diretor-substituto do Departamento de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia (MME), Paulo Leonelli, o Proinfa foi projetado para estimular tecnologias já consolidadas, com potencial para produzir energia em grande escala e num curto espaço de tempo. "A energia solar não está ainda nesse patamar", afirma. "Acho que em alguns anos a realidade será diferente, mas, por enquanto, ainda é uma tecnologia muito cara, que não se paga por si só."

Apesar de ser rico em silício, o País não possui produção de painéis fotovoltaicos, o que significa que todo o material para um projeto desse tipo teria de ser importado. Outros países já trabalham em escala comercial com tecnologias alternativas à fotovoltaica, que utilizam espelhos para concentrar a radiação solar sobre linhas de fluidos condutores de calor (como uma criança que utiliza uma lupa para incendiar uma folha de papel). Os fluidos superaquecidos são então usados para produzir vapor, que por sua vez é usado para movimentar uma turbina e produzir eletricidade.

PLANEJAMENTO

Em novembro, o MME criou um grupo de trabalho especialmente dedicado ao estudo do aproveitamento da energia solar no País. O grupo conta com a participação de especialistas acadêmicos e a expectativa é apresentar um plano de trabalho no prazo de seis meses a um ano. "O governo está sensível a essa questão da energia solar e vamos encontrar uma maneira de fomentá-la", afirma Leonelli.

OESP, 25/01/2009, Vida, p. A21-A22

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