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Bolsonaro e parlamentares lideraram desinformação também na área ambiental, diz pesquisa

O Globo, Política, p. 9
11 de Mar de 2023

Bolsonaro e parlamentares lideraram desinformação também na área ambiental, diz pesquisa
Gestão do ex-presidente terminou em 2022 com alta de quase 60% no desmatamento, na comparação com os quatro anos anteriores, segundo o Inpe

Por Marlen Couto - Rio
11/03/2023

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e parlamentares bolsonaristas impulsionaram, nos últimos dois anos, a desinformação sobre a agenda ambiental no Brasil. A conclusão é de um relatório inédito do NetLab, laboratório vinculado à Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que mapeou palavras-chave e hashtags ligadas ao debate no Brasil em sete plataformas: Facebook, Instagram, WhatsApp, Telegram, YouTube, TiTok e Twitter.

Os conteúdos buscam amenizar a destruição ambiental nos últimos anos, negam o impacto do agronegócio, reforçam teorias da conspiração, como a ideia de que estrangeiros querem roubar a floresta Amazônica, e pregam que o discurso ambientalista quer frear o progresso do país. A desinformação ambiental está no centro das preocupações da ministra Marina Silva (Rede), mas uma estratégia de enfrentamento ainda está em discussão na pasta e deve contar com o reforço da inédita Secretaria de Políticas Digitais da Secom, que se dedica ao tema das fake news. Os dados do levantamento expõem o desafio que o governo terá ao enfrentar oposição em pautas ambientais.

Da lista, Bolsonaro foi quem mais abordou a temática ambiental no período, com 10,2 mil publicações no período nas diferentes plataformas - a maioria (757 mensagens) no Telegram. Somente no Facebook e Instagram, as postagens alcançaram mais de 43,2 milhões de curtidas, comentários e compartilhamentos.

A atuação do ex-presidente foi principalmente na linha de negar indicadores ambientais negativos de seu governo. A gestão de Bolsonaro terminou em 2022 com alta de quase 60% no desmatamento, na comparação com os quatro anos anteriores, segundo dados do Inpe. Em meio aos recordes de desmatamento, em agosto de 2022, por exemplo, Bolsonaro disparou em seu canal no Telegram que o "Brasil é uma superpotência ecológica e o país que mais preserva no mundo".

Coordenadora do NetLab, a pesquisadora Rose Marie Santini aponta que há uma campanha permanente e perene de desinformação sobre o tema nas plataformas, o que se agrava com o fato de as empresas do setor não darem prioridade à moderação de conteúdo com informação ambiental. Esse ecossistema, avalia, contribuiu para a crise humanitária ianômani.

- É justamente a continuidade no tempo e a diversidade de fontes que faz com que as pessoas comecem a ser impactadas - diz Santini. - A desinformação seguirá como tendência. O relativismo e negacionismo científico servem para levantar controvérsias e dúvidas numa parcela da população e isso é fundamental para esses políticos avançarem com algumas pautas, principalmente no Legislativo.

Parlamentares entre os principais disseminadores desses conteúdos nas redes, segundo os dados. Entre eles estão a ex-ministra Tereza Cristina (PP-MS), eleita para o Senado, e os deputados Ricardo Salles (PL-SP) e Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Alinhada a bandeiras do agronegócio, a ex-ministra da Agricultura fez mais de 1,5 mil publicações sobre o tema. No Instagram, seu perfil somou mais de 2,1 milhões de interações. Em 2021, a hoje senadora publicou, por exemplo, que "a soja brasileira não exporta desmatamento". A conexão entre a produção de soja no país e o desmatamento em regiões como a Amazônia e o Cerrado é documentada por diversas pesquisas. Um estudo publicado na revista Science em 2020 mostrou que até 22% das exportações que saem da Amazônia e do Cerrado brasileiros para a União Europeia podem ter saído de áreas desmatadas ilegalmente nos dois biomas.

Em volume menor de postagens, Salles e Eduardo miraram organizações da sociedade civil pró-preservação e usaram as redes para apontar supostos interesses internacionais na Amazônia, em resposta a críticas à gestão ambiental do governo Bolsonaro. Em vídeo publicado em março do ano passado, o ex-ministro do Meio Ambiente buscou desresponsabilizar o governo pelo aumento do desmatamento na Amazônia, com o argumento de "as pessoas foram deixadas de lado" em governos anteriores na região. Ele ressalta que o Brasil é o país que mais preserva florestas.

- A indústria de desinformação ambiental não é uma novidade, mas agora vai estar muito forte no Congresso, e vai continuar a se valer dessas narrativas para fazer o enfrentamento - acrescenta o ex-deputado federal Márcio Santilli, um dos fundadores do Instituto Socioambiental (ISA).

Na Câmara, o comando da Comissão de Meio Ambiente (CMA) ainda não está definido e é alvo de disputa entre diferentes partidos. Apontada no mês passado, a possibilidade de Ricardo Salles ser indicado para o posto preocupou o governo e ambientalistas. Como mostrou o colunista Lauro Jardim, a avaliação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é que a comissão será a mais importante da Casa na nova legislatura, à frente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), tradicionalmente disputada entre as siglas.

No Senado, a nova presidente da CMA, Leila Barros (PDT-DF), já sinalizou que vai incluir na pauta projetos de interesse de ruralistas. Entre eles estão as propostas de licenciamento ambiental, de regularização fundiária e de liberação de agrotóxicos.

O GLOBO pediu um posicionamento dos parlamentares citados sobre o relatório, mas não houve resposta. A reportagem não conseguiu contato com Jair Bolsonaro.

O Globo, 11/03/2023, Política, p. 9

https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2023/03/bolsonaro-e-parlament…

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