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Bispo em greve de fome recebe carta de Lula

FSP, Brasil, p.A20
01 de Out de 2005

Sem comer há seis dias, contra a transposição do São Francisco, religioso reza missa em Pernambuco
Bispo em greve de fome recebe carta de Lula
Fabio Guibu
Cerca de cem pessoas participaram ontem de uma romaria em Cabrobó (a 600 km de Recife, PE) em homenagem ao bispo diocesano de Barra (a 610 km de Salvador, BA), dom Luiz Flávio Cappio, 58, em greve de fome há seis dias para protestar contra o projeto de transposição das águas do rio São Francisco.
O grupo foi recebido pelo religioso, que rezou uma missa. Apesar de ingerir apenas água, ele ainda não apresenta sinais de fraqueza. O bispo iniciou seu protesto no dia 26 e disse que o manterá "até a morte, se preciso for". Ele enviou uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dizendo ser admirador dele e militante de "todas as campanhas eleitorais do PT". Mas, em seguida, avisa: "Minha vida está em suas mãos".
Em resposta, o presidente enviou ontem um emissário a Cabrobó para entregar hoje uma carta ao bispo. O teor da carta não foi divulgado. Entre outros pontos, Lula diz no documento que as obras do projeto ainda não começaram e o que está em andamento é a revitalização do rio.
Caberá ao assessor especial da Presidência Selvino Heck entregar a carta pessoalmente ao religioso, que desenvolve um projeto de construção de cisternas comunitárias na região. Nesta semana, a presidência da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) também enviou uma carta a Lula pedindo que o presidente reconsidere a decisão de colocar em prática a transposição.
"Apelamos para que reconsidere a decisão política que, ainda longe de um consenso na região nordestina a respeito da viabilidade e dos resultados socioambientais da transposição do no são Francisco, divide as mentes e os corações% diz o documento.
Cappio também enviou uma carta manuscrita às paróquias. Nela, diz estar disposto a permanecer em greve de fome "para que o senhor presidente da República revogue sua disposição de realizar o projeto de transposição".
O bispo, que integra a ordem franciscana, ainda registrou em cartório sua intenção de morrer "pela vida do rio São Francisco e de seu povo". Na declaração, afirma que não quer morrer, mas que, se isso ocorrer, seu corpo deve ser enterrado "junto ao Bom Jesus dos Navegantes".
No documento, o bispo justifica o seu protesto. Diz ser contrário à transposição porque considera prioritária a revitalização do rio e a realização, pelo governo, de "ações que garantam o verdadeiro desenvolvimento para as populações pobres do Nordeste: uma política de convivência com o semi-árido para todos, próximos e distantes do rio".
"Esperávamos do senhor [presidente] um apoio maior em favor da vida do rio e do seu povo. Esperávamos que [...] o governo revisse sua disposição de levar a cabo este projeto que carece de verdade e de transparência."
Defensor do povo ribeirinho e autor de um livro sobre o rio São Francisco, Cappio conheceu Lula em 1994, apresentado por seu então professor de teologia, frei Leonardo Boff. Com o presidente, o bispo participou da Caravana da Cidadania pelo rio São Francisco, percorrendo o curso d'água, da nascente à foz. Ele escolheu Cabrobó para promover a greve de fome por ser a cidade o ponto inicial do projeto de transposição.
O governo pretende bombear parte da água do rio para beneficiar moradores do semi-árido dos Estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. A obra vai custar R$ 4,5 bilhões.

FSP, 01/10/2005, p. A20

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