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A biodiversidade e os piratas

GM, Opinião, p. A3
Autor: BOLSON, Eder Luiz
31 de Jan de 2005

A biodiversidade e os piratas

Eder Luiz Bolson

Empresas estrangeiras patentearam pilocarpina, curare e cupuaçu. Depois do descobrimento da América, o ouro e as pedras preciosas coletadas nos trópicos dinamizaram e enriqueceram a economia européia. Atualmente, o principal lastro para construir riquezas chama-se biodiversidade. Biodiversidade significa variações entre tipos de organismos vivos pertencentes, entre outros, aos ecossistemas terrestres, marinhos e de água doce. A ciência dominante hoje é a biotecnologia. Os produtos químicos estão sendo substituídos por produtos biológicos nas áreas de saúde, agropecuária e meio ambiente. A base científica, que já lastreia mais de US$ 35 bilhões anuais em negócios com fármacos, cosméticos, vacinas, sementes, fermentos, biofertilizantes, bioinseticidas, enzimas ou bactérias para a biorremediação de resíduos, é coletada na natureza, na biodiversidade. Somos visitados por biopiratas, mas muitos vivem por aqui mesmo. São serviçais brasileiros vestindo aventais de cientistas que se enriquecem vendendo nossa biodiversidade por preço vil. Muitos produtos nativos do Brasil já ostentam patentes em nome de empresas estrangeiras, entre eles o veneno da jararaca, a pilocarpina, o cunaniol, o curare e o cupuaçu. Diante do tamanho do rombo feito pelos biopiratas considerados legais, parece até ridículo prender um amador, disfarçado de turista, que tenta esconder um par de aranhas venenosas no fundo falso da maleta ou acusar um outro de carregar ilegalmente microorganismos no barro preso ao solado de suas botas. Outra forma dita legal de biopirataria são os convênios "venha a nós" firmados por entidades estrangeiras com algumas de nossas financeiramente debilitadas instituições de pesquisa. Neles são ofertados recursos para pesquisas, salários e viagens para os pesquisadores em troca da prospecção e remessa de materiais biológicos para estudo no exterior. A Costa Rica firmou um desses convênios entreguistas: vendeu sua biodiversidade para um laboratório estrangeiro pela bagatela de US$ 2,8 milhões, um valor inferior ao que ela gasta anualmente com a importação de medicamentos. São conhecidas no mundo mais de 2.300 espécies de fungos de água doce, das quais 414 já foram localizadas no Brasil. No grupo das algas já foram identificadas nas águas brasileiras mais de 10 mil espécies. Entre as bactérias se destaca a Chromobacterium violaceum, encontrada no Rio Negro. Ela poderá ser utilizada tanto para curar a leishmaniose como para produzir plásticos biodegradáveis. Os animais invertebrados já inventariados nas águas doces do Brasil chegam a 3.154 espécies das quais 1.297 são insetos. As bacias hidrográficas brasileiras são tão extensas e ricas quanto pouco conhecidas. Sugiro que uma tripulação de cientistas brasileiros utilize um hidroavião para realizar uma bioprospecção nas nossas águas doces, antes que outros o façam. Nós brasileiros nascemos ricos, herdeiros de um imenso tesouro. A biodiversidade brasileira é avaliada em US$ 2 trilhões - o equivalente a oito vezes o valor da nossa dívida externa. Enquanto isso, entra governo, sai governo, e não vemos nenhuma iniciativa ou planejamento que aporte recursos compatíveis com as necessidades para explorarmos um tesouro com esse tamanho e potencial. A exploração comercial da biodiversidade a ser implementada pelos brasileiros é necessária e urgente. Se continuarmos inertes, assistindo à ação dos biopiratas na televisão, vamos continuar deitados eternamente numa biodiversidade esplêndida. Vamos morrer ricos, embora vivendo doentes, poluídos e com fome. kicker: Já foram identificadas nas águas brasileiras mais de 10 mil tipos de algas kicker2: A nossa biodiversidade é avaliada em US$ 2 trilhões, oito vezes o valor da dívida externa (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 3)(Eder Luiz Bolson - Engenheiro agrônomo vice-presidente do Sindicato das Empresas de Base Biotecnológica (SindBio) e presidente da Associação dos Produtores de Sementes e Mudas de Minas Gerais.)

Eder Luiz Bolson: Engenheiro agrônomo vice-presidente do Sindicato das Empresas de Base Biotecnológica (SindBio) e presidente da Associação dos Produtores de Sementes e Mudas de Minas Gerais.

GM, 31/01/2005, Opinião, p. A3

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