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Belo Monte vai ser uma hidrelétrica sazonal

OESP, Economia, p. B4
15 de Mar de 2010

Belo Monte vai ser uma 'hidrelétrica sazonal'
Na cheia produzirá como Itaipu, mas na seca sofrerá redução de 93% na capacidade

A hidrelétrica de Belo Monte vai trabalhar da maneira que a natureza mandar, submetendo-se ao regime de vazão do Rio Xingu (PA). Esse conceito, ambientalmente correto, evita que sejam encravados na Amazônia um monstrengo de concreto e um lago artificial. A usina, de produção sazonal, funcionará como uma espécie de hidrelétrica de equilíbrio da geração, distribuição e consumo de energia nas Regiões Norte e Sudeste e Nordeste.

O ritmo de Belo Monte vai ser ditado pela natureza do rio, que tem vazões que oscilam brutalmente ao longo do ano. Para evitar maiores danos ao meio ambiente, o reservatório será relativamente pequeno, com a usina funcionando a pleno vapor só na época das cheias, principalmente no primeiro semestre.

A produção na época das secas é menor em todas as hidrelétricas. Mesmo nas usinas que possuem vastos reservatórios, a geração nos meses em que chove menos é controlada, justamente para que os lagos não baixem demais, a ponto de ameaçar a recomposição de seus estoques no período chuvoso seguinte.

O que chama a atenção em Belo Monte, porém, é o tamanho da diferença de produção na cheia e na seca. Segundo a Eletrobrás, responsável pelos estudos da hidrelétrica, considerando o histórico de vazões do rio Xingu desde a década de 30 até 2003, a futura produção mensal média de Belo Monte deverá variar de 10.361megawatts médios (MWmed) em abril, no pico das chuvas, para singelos 690 MWmed em setembro, no auge da seca.

Isso significa que, entre o teto e o piso, a geração de Belo Monte vai variar 93%. Numa época do ano, a usina produz como se fosse uma Itaipu; no período seco vira uma usina igual à de Estreito, hidrelétrica que fica na divisa do Maranhão com Tocantins.

Os relatórios da Eletrobrás também revelam uma média, baseada em histórico de 1931 a 2003, das vazões do rio. Nos meses de abril, passam pelo Xingu, na altura do local onde será construída a usina, uma média de 19.816 metros cúbicos de água por segundo. Já nos meses de setembro, o fluxo cai para 1.065 metros cúbicos por segundo - uma redução de 94%.

No setor elétrico, existe um indicador chamado "fator de capacidade", que é calculado dividindo-se a energia média produzida pela potência instalada de uma usina.

O presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz Lopes, que participa dos estudos sobre Belo Monte há pelo menos duas décadas, disse que esse fator, no caso da usina do Xingu, é de aproximadamente 0,44 - em uma escala de 0 a 1. O número, disse, é ligeiramente inferior à média das hidrelétricas existentes hoje, entre 0,50 e 0,60.

Horário de pico. Para o executivo da estatal de energia, mesmo com essa capacidade de geração menor - devido à sazonalidade da produção -, a grande vantagem de Belo Monte está no papel que ela desempenhará no sistema interligado nacional. Um papel de complementaridade.

"As vazões máximas do rio Xingu ocorrem entre abril e maio, enquanto as vazões máximas no Sudeste e no Nordeste acontecem em fevereiro e março. Assim, quando os reservatórios dessas regiões começam a decair, o Xingu está subindo.

Então, será preferível gerar o máximo de energia no Xingu e guardar água nos outros reservatórios. Esse é o grande diferencial que fez de Belo Monte nossa grande esperança no setor elétrico", disse Muniz.

Na prática, é como se Belo Monte, que vai operar a fio d´água, ou seja, com reservatório de água limitado, fizesse seu estoque de água em outras represas, no Sudeste, no Centro-Oeste e no Nordeste do País.

"Ela acaba acumulando energia nos reservatórios de outras regiões. Esse descompasso é positivo, porque permite complementação entre Belo Monte e a geração de outras regiões", disse o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim.

Já nos meses de menor vazão, Belo Monte poderia, por exemplo, ser poupada ao longo do dia e ajudar o sistema interligado no horário de maior consumo, entre 18h e 21h.

"Ela pode ser usada no horário de pico, operando durante poucas horas, com capacidade total, ou ser mantida gerando durante todo o dia a fio d"água", Muniz.

História cheia de polêmica:
1975 - Eletronorte inicia estudos
1985 - Plano prevê 40 usinas
1989 - Índios protestam
2001 - Governo edita a MP do Apagão
2010 - Ministério do Meio Ambiente libera Belo Monte

Projeto original previa alagamento de área maior
Plano propunha alagar área de 1,2 mil km quadrados, mas revisão reduziu área do reservatório para 516 km quadrados

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que o projeto original da Usina de Belo Monte previa o alagamento de uma área de 1,2 mil quilômetros quadrados. O reservatório, porém, atingia áreas indígenas e foi reprogramado para uma área bem menor, de 516 quilômetros quadrados.
O presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz Lopes, porém, destacou que mesmo no caso do desenho original, com mais do que o dobro de área submersa, Belo Monte ainda produziria bem menos energia na seca, já que as mudanças drásticas de vazão são uma característica dos rios amazônicos. "No Rio Xingu não haveria lugar para fazer um reservatório que mudasse isso significativamente. E não precisa", destacou o presidente da Eletrobrás.
Segundo o presidente da EPE, a oscilação na produção de energia tampouco vai gerar problemas no bolso dos investidores que vencerem o leilão de concessão da hidrelétrica, previsto para abril. "O vendedor (da energia de Belo Monte) tem o contrato. A receita dele é dada pelo contrato e é praticamente a mesma durante todo o ano."
Preço. O governo anunciou no início do mês o aumento em cerca de 19%, de R$ 68 para R$ 81 por megawatt/hora (MWh), do preço-teto da energia para o leilão da Belo Monte. A licitação deve ocorrer, ainda de acordo com o governo, no mês que vem.
O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, disse que esse é o valor que consta da revisão feita pela Empresa de Pesquisa Energética nos cálculos econômicos da usina.
Na mesma ocasião, Lobão disse ainda que também o custo total da obra foi recalculado, de R$ 16 bilhões para pouco menos de R$ 20 bilhões. / L.G.

OESP, 15/03/2010, Economia, p. B4

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