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Barragem rompe e inunda cidades da PB

FSP, Cotidiano, p. C11
19 de Jun de 2004

Barragem rompe e inunda cidades da PB
Em Alagoa Grande e Mulungu ao menos três pessoas morreram e outras 1.600 estão desabrigadas, segundo a Defesa Civil

Eduardo de Oliveira
Da Agência Folha
Adelson Barbosa
Free-Lance para a Agência Folha

A inundação decorrente de um vazamento na Barragem de Camará (152 km a oeste de João Pessoa, na Paraíba) matou ao menos três pessoas, duas em Alagoa Grande e uma em Mulungu, e deixou outras 1.600 desabrigadas nos dois municípios. Uma pessoa ainda era tida como desaparecida ontem à noite.
Os dados são da Defesa Civil paraibana, que, até as 20h de ontem, ainda não havia fechado um balanço. O próprio órgão divulgou dados conflitantes ao longo de todo o dia, chegando a contabilizar quatro mortes, 4.500 desabrigados e um número não definido de desaparecidos.
Os municípios mais atingidos pela enchente -Alagoa Grande e Mulungu- ficam rio abaixo logo depois da barragem, na região do Estado conhecida como "brejo" -que divide o litoral do sertão.
O abastecimento de água e a rede telefônica ficaram comprometidos ao longo de todo o dia de ontem nas duas cidades.
Em Mulungu, que já enfrentou uma grande enchente em fevereiro, a rede elétrica foi totalmente danificada. Estima-se que o município ficará 15 dias sem energia.
Alagoa Nova, onde fica a barragem, teve poucos estragos em casas na zona rural, pois a construção fica na parte baixa da cidade.
Araçagi, Alagoinha, Mamanguape e Rio Tinto, as duas últimas já localizadas próximo ao litoral paraibano, também sofreram transtornos.
O vazamento
O secretário-adjunto de Recursos Hídricos do Estado, Sérgio Góis, disse que o vazamento surgiu por volta das 20h de anteontem. Segundo ele, um buraco de 20 metros de altura por 15 metros de largura surgiu da base para cima na parte esquerda da obra, na junção entre o muro de concreto e a lateral de solo e pedra, onde ela se fixa.
Góis apontava ontem duas hipóteses como causas para o buraco: problema no projeto da barragem ou na execução da construção. Ele descartou que as chuvas que atingem a região há três dias tenham relação com o ocorrido.
O secretário-adjunto relatou que por volta das 10h de ontem quase todo o reservatório havia secado. A barragem pode armazenar 26,5 milhões de m3 de água (26,5 bilhões de litros). Antes do vazamento, tinha 17 milhões de m3 (64% da sua capacidade).
"A grande quantidade de água e a velocidade com que ela atingiu o rio [Mamanguape] foram os responsáveis pelas enchentes nas cidades e pelos estragos provocados", disse Góis.
A Defesa Civil não estimou quanto o nível do Mamanguape subiu acima do normal. O coordenador estadual do órgão, coronel Álvaro Vitorino de Pontes, disse que em Alagoa Grande e Mulungu, as primeiras duas cidades ao longo do rio depois da barragem, o nível da enchente ficou em torno de 1,5 metro.
Além de inundar e provocar mortes, a força das águas destruiu a ponte que liga Alagoa Grande e Areia. Não havia ontem estimativa dos prejuízos causados.
Humana e material
Diante da situação, que descreveu como "calamitosa", o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), ligou para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo ajuda humana e material.
"O presidente foi extremamente solidário e ágil nas providências. Já tem medicamentos e mantimentos sendo deslocados para cá. Recebi toda a solidariedade por parte do presidente da República", disse o governador.
Segundo o subprocurador-geral da Justiça da Paraíba, Doriel Veloso Gouveia, somente após a realização de investigação sobre os motivos que causaram o rompimento o órgão irá se pronunciar sobre possíveis ações judiciais.
Colaboraram RACHEL AÑON e MARTHA ALVES, da Agência Folha

Governo diz que houve falhas técnicas na obra

Da Agência Folha

O governador Cássio Cunha Lima (PSDB) disse ontem que interesses eleitorais representaram o pano de fundo para o "erro técnico ou má execução da obra", prováveis causas do acidente na barragem apontadas pelo governo.
Em 2002, ele polarizou a disputa ao governo da Paraíba com Roberto Paulino (PMDB), vice-governador que tentava a reeleição.
Paulino havia assumido o governo no lugar de José Maranhão (PMDB), que se desincompatibilizou e foi eleito senador naquele ano. A obra da barragem foi executada durante a gestão de Maranhão.
"O obra foi inaugurada no primeiro semestre de 2002. É aquela história de fazer a toque de caixa para ser inaugurada logo, por conta de prazo eleitoral", afirmou Cunha Lima. "Toca de todo jeito para poder fazer a festa de inauguração e dá nisso."
O senador Maranhão rebateu a hipótese de que tenha havido erro no projeto da barragem e refutou o caráter político aventado pelo governador.
"Eu posso dizer que não houve erro técnico na construção. O que ocorreu foi uma fatalidade. Não há esse caráter político. A obra demorou de dois a três anos para ser concluída. Nem pode-se dizer que foi feita a toque de caixa, pois nem tínhamos caixa para isso", declarou Maranhão.
A assessoria de imprensa do consórcio responsável pela obra, formado pela Andrade Galvão Engenharia Ltda. e CRE Engenharia Ltda., informou ontem que técnicos das empresas estavam na barragem apurando as causas do vazamento.
Outras obras
Cunha Lima disse que vai determinar inspeções em outras obras do governo estadual inauguradas ao longo de 2002.
"Esse não foi o primeiro problema. Tivemos também problema na [rodovia] PB-008 e numa adutora, entre outros. Eu estou determinando a instauração de uma equipe, com a participação do Ministério Público e do próprio governo federal, para fazer uma avaliação completa dessa obras", disse.

Chuva já matou 104 pessoas

Jairo Marques
Da Agência Folha

Pelos menos 104 pessoas morreram em decorrência das chuvas que assolaram os Estados do Nordeste neste ano.
De acordo a Sedec (Secretaria Nacional de Defesa Civil), apenas 7% dos 5.507 municípios brasileiros possuem Corpo de Bombeiros capacitado para atuar em desastres. Um outro dado aponta que 120 cidades brasileiras, mais as capitais, têm potencial para sofrer tragédias naturais.
A Paraíba foi o Estado que mais registrou mortes ocasionadas pela força das águas: 33. Alagoas vem em seguida, com 29, 23 delas só de 31 de maio a 2 de junho, a maioria em deslizamentos.

FSP, 19/06/2004, Cotidiano, p. C11

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