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Balanço sobre energia elétrica e gás

FSP, Dinheiro, p. B2
Autor: ROSA, Luiz Pinguelli
05 de Jan de 2007

Balanço sobre energia elétrica e gás
As chuvas no fim de 2006 foram favoráveis para os reservatórios, São Pedro parece ser petista ou aliado

Na virada de 2006 para 2007, cresceu a preocupação expressa pela mídia com um novo apagão. Mas a situação atual é diferente daquela de 2001. As chuvas no fim de 2006 foram favoráveis.

São Pedro parece ser petista ou está entre os aliados. Apesar do progressivo esvaziamento dos reservatórios de hidrelétricas em comparação com os anos anteriores, o nível médio de água neles está acima do que determina a curva de aversão ao risco, definida como limite a ser evitado. Se as chuvas diminuírem e/ou a economia crescer e o consumo subir, para evitar no curto prazo um alto risco de racionamento, ligam-se termelétricas. Mas várias não dispõem de gás. Eis a questão. Alertei para isso em artigos, em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, a convite do ministro Tarso Genro (Relações Institucionais), e na minha intervenção em encontro da comunidade científica com o presidente Lula.

A existência do problema foi reconhecida quando a Aneel retirou várias termelétricas do plano de operação, por não disporem de gás para operar, segundo a Petrobras. Antes disso, quando o Operador Nacional do Sistema mandou ligar um conjunto de termelétricas, menos da metade operou. A resolução da Aneel revelou que o risco de déficit de energia é bem maior que o que se calculava. Houve uma polêmica com o Ministério de Minas e Energia e determinou-se que as termelétricas operassem por tempo limitado em teste. O resultado foi pior que o esperado. Pediu-se à Petrobras que remanejasse o gás de outros usuários.

Por meio de seu diretor de Gás e Energia, Ildo Sauer, a Petrobras informou que: 1) não dispõe do gás para operar por prazo maior essas termelétricas; 2) cerca de 3 GW termelétricos não estão contratados; 3) há problemas no novo modelo devido aos consumidores livres. Eles compraram energia hidrelétrica demasiadamente barata que as geradoras da Eletrobrás tinham descontratado por força da regulamentação com grandes perdas financeiras. Os consumidores livres, grandes indústrias intensivas em energia, absorvem 30% da energia elétrica do país e estão fora do sistema atendido pelas concessionárias com tarifas altas. Se o risco aumenta, eles terão de pagar mais nos novos contratos.

Seria injusto concentrar a culpa no gás natural como bode expiatório. Uma usina termelétrica no sistema brasileiro opera em complementação às hidrelétricas. Não faz sentido verter água enquanto se queima gás, fóssil e importado. Por outro lado, quando abaixa muito o nível médio dos reservatórios, devem-se ligar as termelétricas, na falta de novas hidrelétricas. Há o problema dos contratos usuais, em que se paga pelo uso de gás sem interrupção. Antes mesmo da crise da Bolívia, a Petrobras estudava a importação de gás natural liquefeito por navios, que pode ser interrompida conforme a necessidade. O problema é que leva tempo para implantar uma usina de regaseificação.

Pensa-se em adaptar termelétricas para serem bicombustíveis, podendo usar diesel, por exemplo, no lugar de gás. Mas é muito mais caro.

Na implantação do novo modelo, mantiveram-se contratos privilegiados. Algumas termelétricas chegaram a vender energia sem gerá-la, repassando energia hidrelétrica comprada barato das estatais federais, obrigadas a descontratar grande parte da energia. As termelétricas foram introduzidas sem considerar o sistema hidrelétrico brasileiro, e os leilões de energia levaram a termelétricas a carvão e a diesel, caras e poluentes, emitindo mais gases do efeito estufa.

O governo deve dar mais atenção às fontes renováveis, entre as quais a geração hidrelétrica, embora deva reconhecer seus problemas ambientais, incluindo emissões de metano medidas pela Coppe e pela USP/São Carlos, objeto de recente reunião em Paris. Quando presidi a Eletrobrás, ela assumiu o compromisso de comprar energia de usinas eólicas e de biomassa e de pequenas hidrelétricas do Proinfa, totalizando 3,3 GW, e foram feitos investimentos na duplicação de Tucuruí, nas duas novas turbinas de Itaipu e na hidrelétrica de Peixe Angical, em parceria de Furnas com a EDP. Mas concordo com a ministra Marina Silva (Meio Ambiente): as regras ambientais têm de ser obedecidas.
Cabe ao governo convencer a sociedade da qualidade dos projetos. E discordo de substituir futuras hidrelétricas por reatores nucleares. A emenda é pior que o soneto.

LUIZ PINGUELLI ROSA, 64, físico, é coordenador do Programa de Pós-Graduação em Planejamento Energético da Coppe/UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Foi presidente da Eletrobrás (2003-04).

FSP, 05/01/2007, Dinheiro, p. B2

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