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Baixo nível escolar e maior renda 'seguram' brasileiros

OESP, Nacional, p. A7
04 de Jan de 2010

Baixo nível escolar e maior renda 'seguram' brasileiros
Garimpeiros e trabalhadores que vivem do ouro preferem reconstruir a vida no Suriname, onde não pagam impostos e ganham mais dinheiro

Felipe Recondo, Felipe Recondo em Panamaribo

Eles perderam tudo o que demoraram anos para conseguir, foram atacados, saqueados, as mulheres violentadas e todos expulsos do lugar que escolheram para viver. Mesmo assim, garimpeiros brasileiros e trabalhadores que viviam indiretamente da extração do ouro em Albina - a 150 quilômetros de Paramaribo, capital do país - preferem reconstruir a vida no Suriname. E a razão é primordialmente econômica.

Com o baixo nível de escolaridade, sem profissionalização e vindos de cidades com poucas oportunidades de emprego, geralmente no interior do Pará e Maranhão, esses garimpeiros ganhariam no Brasil um quinto do que recebem nos garimpos do Suriname. Dinheiro livre de qualquer tributação no país.

Deniclea Furtado, 34 anos, trocou o emprego de faxineira numa escola de Belém (PA) pela vida incerta no Suriname há 12 anos. No Brasil, recebia R$ 700 em média. "Com os impostos e as despesas básicas de casa, não sobrava quase nada", diz. No garimpo, ela trabalhava como cozinheira e aumentava a renda com a venda de mercadorias, tirando ao final do mês R$ 3 mil. "Aqui eu vivo melhor."

Reginaldo Bitencourt, há três anos no Suriname, conta que tem "coisas que nunca iria conseguir" no Brasil. "Tenho minha casa alugada, tenho móveis, televisão. Aqui vivo bem." Na semana passada, ele embarcou no avião da Força Aérea Brasileira que levou brasileiros ao Pará. Mas ele só voltou para tirar novos documentos.

EXPULSOS

Para aqueles que vivem da extração do ouro, as explicações econômicas se somam às limitações impostas pelo governo brasileiro. Com o aumento da fiscalização dos órgãos ambientais e o fechamento de Serra Pelada (PA), garimpeiros brasileiros se viram obrigados a deixar o País.

Foi no início da década de 90 que o movimento em direção aos garimpos do Suriname, Guiana Francesa, Guiana e Venezuela se intensificou. Hoje, conforme estimativas do governo, há 18 mil brasileiros no Suriname, país com população de quase 500 mil pessoas. Somando os quatro países, seriam 80 mil brasileiros em busca de ouro.

"O Brasil tem muito ouro. Não tinha a necessidade de estarmos aqui. Mas o governo fechou o garimpo em que eu trabalhava. Perdi todas as máquinas, aí tive de vir pra cá", explica Carlos Gonçalves, garimpeiro há 28 anos, oito deles no Suriname, onde a polícia não reprime a atividade. Além disso, não é preciso visto: basta o passaporte.

Na Guiana Francesa, é preciso visto para entrar no país. De acordo com informações do governo brasileiro, o garimpeiro que busca trabalho em território francês está disposto a tudo, inclusive enfrentar a polícia. Quem vai para o Suriname, mesmo de forma irregular, encontra condições de organizar vilas de brasileiros e levar a família para a área de garimpo.

Vítimas voltam ao garimpo, mas evitam Albina

Felipe Recondo, enviado especial em Panamaribo

Sem acreditar na ajuda financeira do País, brasileiros atacados em Albina por quilombolas, na véspera do Natal, estão voltando para os garimpos por conta própria, seja na Guiana Francesa ou no interior do Suriname. Eles dizem que só não retornarão para Albina. Na semana passada, funcionários da Embaixada do Brasil percorreram os hotéis, em que eles foram hospedados, para mensurar perdas e calcular quanto cada um precisaria para retomar atividade.

"Tem muita gente que já foi para o garimpo. Quem conseguiu correr (do ataque) e salvar algum dinheiro está voltando a trabalhar", diz Carlos Roberto Brito, de 46 anos. Ele perdeu 246 gramas de ouro, 1.500 euros e 1.200 kg de mantimentos.
Brito afirma que a prioridade é reencontrar sua mulher, Maria Glória, que está na Guiana Francesa. Cansado de "viver no mato" após mais de 20 anos como garimpeiro, ele pensa em voltar ao Pará e "abrir uma venda em Gurupá". F.R.

OESP, 04/01/2010, Nacional, p. A7

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