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Aumenta conflito entre indígenas e produtores

Folha de Boa Vista - http://www.folhabv.com.br/
Autor: ANDREZZA TRAJANO
28 de Mai de 2009

O conflito existente entre índios, reassentados remanescentes da terra indígena Raposa Serra do Sol e assentados da reforma agrária, todos habitantes do Projeto de Assentamento Nova Amazônia I, na zona rural de Boa Vista, está longe de acabar.

Na madrugada de ontem, índios integrantes da comunidade Lago da Praia - ligada ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) -, existente no local, denunciaram que uma escola indígena que funcionava no projeto foi supostamente destruída pelos produtores. Em contrapartida, os produtores acusam os índios de matarem seus animais de criação.

A área é administrada pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra)e a discussão gira em torno de uma possível ampliação da reserva Serra da Moça, localizada próximo ao projeto, que viria a "engolir" o PA Nova Amazônia.

Há 15 dias, o clima que já era tenso na região recrudesceu. Cento e sessenta famílias de assentados e reassentados bloquearam com caminhões e tratores a vicinal 1, que dá acesso à comunidade. Apenas veículos escolares e de saúde são autorizados a passar.

Do outro lado, as 14 famílias indígenas que vivem na comunidade levaram cerca de 200 índios do CIR para a região, como forma de protegê-los de possíveis confrontos.

FOGO - De acordo com o índio macuxi Jabson Silva, que vive na Lago da Praia, o fogo que destruiu a escola estadual indígena João Gomes de Souza teve início às 3h de quarta-feira. Algumas cadeiras e livros foram retirados antes que o fogo destruísse toda a estrutura física. Cerca de 20 crianças estudavam lá.

Um indígena teria visto os autores do crime fugindo em uma motocicleta em direção ao bloqueio. O que aponta, segundo ele, a participação dos produtores. "Tentamos apagar o fogo, mas não deu. O pessoal ficou assustado porque nunca tinha visto aquilo e nem acreditava que os assentados e reassentados seriam capazes de cometer esses atos. Ficamos espantados e ao mesmo tempo de cabeça erguida, porque eles fizeram isso para nós recuarmos, mas vamos continuar lá. Quanto às aulas, elas vão continuar em casas ou debaixo de árvores", afirmou Silva, acrescentando que ainda ontem iria formalizar denúncia junto às polícias Civil e Federal.

O presidente da Associação dos Expropriados de Terras Homologadas do Estado de Roraima (Assoether) Edivan Silva, afirmou que só tomou conhecimento da destruição da escola por meio da reportagem. Porém, não descartou que algum produtor possa ter cometido o ato.

"Não vou descartar nem afirmar nada, porque tem muitas pessoas revoltadas com toda essa situação. Mas os índios podem ter armado isso pra gente, como fizeram nos conflitos ocorridos da Raposa Serra do Sol", acusou.

ANIMAIS - Edivan denunciou que desde a chegada dos indígenas ao PA Nova Amazônia, a tranquilidade da região acabou. Animais têm sido mortos e outros furtados. Os índios também bloquearam há meses um rio que divide a reserva Serra da Moça do projeto de assentamento. Desde então, os animais que bebiam água no rio estão bebendo em caixas d'água.

Polícias Civil e Federal afirmam que ainda não foram notificadas pelo CIR

A Polícia Federal informou que assim que for notificada oficialmente da destruição da escola indígena no Projeto de Assentamento Nova Amazônia I, vai submeter o caso a análise da Corregedoria, para saber se o caso, inclusive do bloqueio da vicinal 1, é de competência da instituição. Caso não seja, as informações serão repassadas ao Estado para providências.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, até as 18h de ontem, nenhum ofício do Conselho Indígena de Roraima (CIR) havia chegado à instituição informando sobre a destruição da escola estadual Indígena João Gomes de Souza.

Porém um produtor rural, morador do PA Nova Amazônia, registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia do Interior (DPI), localizada no bairro Santa Cecília, no Cantá, de que os indígenas teriam ateado fogo na escola. O titular da especializada, Rodrigo Kulay, solicitou ao Corpo de Bombeiros que fizesse perícia no local e iniciou as investigações.

INCRA - O superintendente do Incra, Titonho Beserra, disse à Folha que a autarquia não vai gerenciar os conflitos existentes no projeto. Afirmou que esses atos são criminosos e que nestes casos quem deve agir são as instituições policiais.

Produtores protestam contra tamanho de área que será destinada aos índios

Outro protesto dos produtores que vivem no Projeto de Assentamento Nova Amazônia I versa quanto o tamanho da área que será destinada aos indígenas da comunidade Lago da Praia.

Eles afirmam que estas terras superam os moldes da reforma agrária, que é de até 100 hectares, enquanto os remanescentes da Raposa Serra do Sol, que possuíam áreas superiores a 1.000 hectares fora da reserva, têm que se contentar com até 400 hectares no projeto de assentamento.

O impasse começou a ser costurado há cerca de 20 dias, quando o superintendente do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Titonho Beserra, propôs as partes que a área em litígio fosse dividida ao meio, atendendo a todos igualmente.

Na sexta-feira passada, também ficou acordado o reconhecimento de posse das famílias indígenas da região como assentados, durante reunião entre o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, juntamente com o presidente do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, representantes indígenas e Titonho Beserra.

Entretanto o presidente da Associação dos Expropriados de Terras Homologadas do Estado de Roraima (Assoether), Edivan Silva, voltou a afirmar que os produtores só vão assinar um acordo se os indígenas forem assentados em áreas de até 100 hectares.

"Não podemos permitir que os índios fiquem em áreas maiores, porque os próprios desintrusados da Raposa ficaram em pequenas. E se ficarem em lotes grandes, será um 'pé' para aquela região ser transformada em uma reserva", afirmou Silva, acrescentando que hoje não existe mais clima para índios e produtores viverem em paz no mesmo espaço.

INCRA - O superintendente do Incra, Titonho Beserra, afirmou que vai assentar todas as pessoas que vivem na região nos moldes de regularização fundiária. "Lá [no PA Nova Amazônia] não existe maloca indígena. Todos terão que entregar documentação para serem legalizados, inclusive os índios", frisou.

Beserra destacou que a instituição tem autonomia e critérios para realizar os assentamentos, sem precisar passar por aprovação dos produtores, como eles estão pleiteando. A área que será reconhecida como assentamento das famílias indígenas tem 3.200 hectares.

"Os mesmos critérios que utilizamos para os desintrusados da Raposa, vamos fazer com as famílias indígenas, que é de reassentamento em áreas de regularização fundiária, de até 300 hectares. Também estamos estudando a possibilidade de implantação de um projeto de desenvolvimento sustentável voltado para os indígenas. Ainda não há nada definido, nem existem privilégios", enfatizou o superintendente.

ANÁLISE - O índio Jabson Silva, que vive na Lago da Praia, disse que a comunidade ainda está avaliando a proposta do Incra.

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