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Atraso na ratificação de protocolo global sobre biodiversidade pode prejudicar país

Valor Econômico, Brasil, p. A2
12 de Jul de 2013

Atraso na ratificação de protocolo global sobre biodiversidade pode prejudicar país

Daniela Chiaretti
De São Paulo

A demora do Congresso Nacional em ratificar o Protocolo de Nagoya, o acordo internacional que dá as regras para o acesso e a repartição de benefícios do uso dos recursos genéticos da biodiversidade, pode prejudicar o Brasil.
"A pior situação possível para o Brasil, o lugar com mais biodiversidade do mundo, é chegar à próxima conferência internacional, em 2014, com 50 países tendo ratificado o protocolo, e o Brasil, não", alerta o pesquisador Carlos Joly, coordenador do programa Biota, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e professor do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Em 2010, delegações de quase 200 países chegaram a acordo sobre o protocolo, em conferência no Japão. Quase cem países assinaram o acordo e 18 o ratificaram internamente. Quando tiver sido ratificado por 50 países, o protocolo entrará em vigor. Se essa for a situação em outubro de 2014, na Coreia do Sul, quando está marcado outro encontro internacional, os 50 países começam a definir os detalhes do acordo. "Só quem tiver ratificado o protocolo vai poder discutir, e o Brasil corre o risco de ficar de fora."
O governo encaminhou o assunto ao Congresso em maio de 2012. A Câmara dos Deputados precisa criar uma comissão especial para discutir o tema, mas ainda não criou. Até agora, 18 países ratificaram o protocolo. "Há uma visão equivocada do assunto", diz Joly. "O governo não consegue ver o valor estratégico que a legislação de acesso aos recursos genéticos tem, do ponto de vista produtivo, para o país", afirma o pesquisador. "O Brasil só tem a ganhar com o Protocolo de Nagoya."
A visão equivocada passa pela interpretação de alguns representantes do agronegócio, segundo os quais o Brasil terá, por exemplo, que pagar pelo milho andino. "O protocolo não é retroativo", disse Zakri Abdul Hamid, presidente do IPBES, sigla em inglês para Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas. É algo como o IPCC - o braço científico da ONU para mudança climática -, mas para biodiversidade.
Zakri está no Brasil para participar de um encontro regional da América Latina promovido pelo Biota-Fapesp e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A reunião, que acontece esta semana em São Paulo, discute um plano para que os cientistas que trabalham com biodiversidade produzam diagnósticos regionais. O objetivo é um grande relatório, que irá mostrar o estado da biodiversidade no mundo e será lançado em 2018. "A biodiversidade é elemento crucial para a sobrevivência da humanidade", disse Zakri.
A antropóloga Maria Manuela Carneiro da Cunha, da Universidade de Chicago, falou sobre a contribuição dos conhecimentos de comunidades tradicionais para o tema. Lembrou o perigo que existe em se restringir a diversidade de culturas. Citou a fome na Irlanda, que matou 1 milhão de pessoas entre 1845 e 1849. Embora existissem mais de 400 variedades de batatas nos Andes, só duas foram levadas para a Irlanda. Houve uma praga e os irlandeses morreram de fome. "A variedade genética é fundamental", disse. No Rio Negro, na Amazônia, há mais de cem variedades de mandioca, porque as mulheres, que a cultivam, fazem experiências com as variedades e as trocam entre si.

Valor Econômico, 12/07/2013, Brasil, p. A2

http://www.valor.com.br/brasil/3195768/atraso-na-ratificacao-de-protoco…

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