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Aqui não

O Globo, Opinião, p. 17
Autor: AZEVEDO, TASSO
25 de Jul de 2018

Aqui não!

Tasso Azevedo é engenheiro florestal

No evento de sua oficialização como candidato do PSL à Presidência da República no último domingo, o deputado Jair Bolsonaro afirmou que, se eleito, vai retirar o Brasil do Acordo de Paris. Os argumentos do parlamentar são diretos: não existiria comprovação do aquecimento global e nem mesmo dos seus impactos, e o Acordo de Paris é uma conspiração internacional para impedir o desenvolvimento de nossa economia.
As postagens dos filhos do deputado nas redes sociais já indicavam uma profunda ignorância sobre os efeitos e causa das mudanças climáticas, mas ver isso transformado em discurso de um candidato a presidente é chocante.
A fala de Bolsonaro foi recheada de outras propostas estapafúrdias - como incorporar o Ministério do Meio Ambiente ao Ministério da Agricultura -, e a proposta de sair do Acordo de Paris acabou passando quase desapercebida ou mesmo considerada uma bravata. A experiência recente nos EUA nos mostra que é preciso levar a sério estes discursos e procurar desconstruí-los com argumentos claros antes que possa se consolidar pelo embate político.
Os estudos conduzidos pelos maiores cientistas brasileiros reunidos no Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas e na Academia Brasileira de Ciência são claríssimos ao apontar os enormes riscos dos impactos das mudanças do clima sobre a saúde, segurança, produção de alimentos, geração de energia e conservação da biodiversidade, entre outros. E estes impactos serão sofridos principalmente pelas populações mais pobres e vulneráveis. Este é o mesmo cenário verificado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas no contexto global.
O Brasil teve um papel fundamental no desenho do Acordo de Paris, sendo o arquiteto da proposta de compromissos nacionais voluntários revisados a cada cinco anos como pedra fundante do acordo. Mesmo em meio à crise política e ao processo de impeachment de 2016, a ratificação do Acordo de Paris foi um momento de rara coesão no Congresso brasileiro, sendo aprovado por unanimidade tanto na Câmara quanto no Senado.
A saída do Acordo de Paris - que só poderia acontecer se aprovado pela Câmara e pelo Senado - seria um vexame para a diplomacia brasileira e um ato de descaso com as populações em situação de risco. Muito além disso, representaria uma enorme perda de oportunidade para a economia brasileira tornar as suas vantagens comparativas em vantagens competitivas na nova economia, na qual energias renováveis, biocombustíveis, agricultura de baixo carbono e proteção das florestas podem ter precificado seu papel de redução das emissões globais de gases de efeito estufa.
Para o mundo basta um Trump. Não precisamos de outro. Aqui não!
A saída do Acordo de Paris, proposta de Bolsonaro, seria um vexame para a diplomacia brasileira

O Globo, 25/07/2018, Opinião, p. 17

https://oglobo.globo.com/opiniao/aqui-nao-22915925

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