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Após morte de gêmeas, mãe adolescente amarga depressão

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Autor: Jacqueline Lopes e Alessandra Carvalho
22 de Set de 2009

A adolescente de 17 anos passa o dia parada no sofá, chora muito e não consegue desabafar. O estopim da depressão foi a perda das filhinhas de 1 ano e 1 mês Anna Clara e Anna Karla, gêmeas terena que morreram a caminho de atendimento médico no dia 8 de setembro, na Capital.

Na casa delas, no Jardim Uirapuru, bairro pobre situado na saída para São Paulo, no fundo do Los Angeles, a casa ainda no reboco e sem piso pode ser avistada em frente a um pé de ingá. São quatro cômodos alugados pela avó M.E., 43. Ela trabalha de empregada doméstica, vive com um salário mínimo e é o arrimo de família há pelo menos 10 anos, tempo em que se separou do marido e trocou a aldeia Cachoeirinha, em Miranda, pela Capital.

Em Campo Grande, com os filhos de 7 e 10 anos, a terena M.E. veio em busca de uma vida melhor. Hoje, dez anos depois, a tristeza toma conta da família. "Desde que perdi minhas netas não consigo ter forças para ir trabalhar", lamenta a avó.

Na cidade, a família não participa de programas sociais e enfrenta a falta de dinheiro para pagar a passagem de ônibus R$ 2,50 e buscar no posto Guanandi documentos que precisam ser levados para o 4 DP (Distrito Policial), delegacia que investiga a morte das menininhas.

No sofá, com uma coberta, a mãe adolescente está em silêncio.

A jovem ficou grávida em um dos passeios na Aldeia Cachoeirinha. Lá, começou a namorar o terena agente de saúde, homem dez anos mais velho, pai do filho de 2 anos. O casal nunca viveu junto. Do relacionamento de férias, nasceram as gêmeas.

Aluna do 8 ano, em Campo Grande, quando descobriu que teria filhos gêmeos, teve que parar os estudos. A gestação foi complicada e as meninas nasceram prematuras.

Elas mamavam no peito e comiam papinha de arroz com feijão. Com 1 ano e 1 mês, as menininhas já ensaiavam as primeiras passadas sempre perto da mãe e do irmãozinho. A dor pela morte das irmãzinhas foi vivenciada também pelo menino terena de 2 anos. "Ele ficou uma semana doente, de cama, depois da morte das meninas", diz a avó.

A adolescente conversa com as amigas da mesma idade e sempre chora muito e fala da falta que sente das meninas. Ao Midiamax ela falou pouco sobre a dor e foi preservada. A menina mãe não recebe atendimento psicológico e nem recurso tem para ir a um dos Caps (Centros de Atendimento Psicossocial) de Campo Grande.

"Minhas netinhas eram muito bem cuidadas. Eu ganho salário e meu dinheiro era para o aluguel e para a comida, nunca faltou comida", diz.

O caso

Sem o laudo que aponte a causa da morte das menininhas terena, Anna Clara e Anna Karla, de 1 ano e 1 mês, a investigação policial segue sem a principal fonte de informação. As crianças morreram na manhã de 8 de setembro, uma terça feira, tão logo a mãe O.V., 17, e a avó, M.E., 43, desciam do ônibus, nas Moreninhas. Elas tentavam pela segunda vez atendimento médico às pequenas.

O pai, agente de saúde terena, C.A., é separado da mãe das crianças e mora em Miranda. As crianças, o irmãozinho de 2 anos, a avó e mãe residiam no Jardim Uirapuru, bairro sem infraestrutura situado na saída para São Paulo, na região do Los Angeles.

A mãe e a avó prestaram depoimento ontem no 4 DP das Moreninhas. A delegacia apura o caso complexo que envolve saúde pública e situação dos índios em área urbana.

"No domingo, elas estavam bem, mamando no peito. Na segunda à noite deu febre nelas. Fomos no Guanandi porque lá é 24 horas e a gente pensou que lá iam fazer os exames. Mas, só mandaram fazer inalação e dar sete gotas de dipirona", relata a avó. Ela é quem cuida da filha adolescente.

Ao chegar a casa, as meninas tomaram o leite materno, brincaram um pouco e dormiram. Às 4 horas começaram a gemer com febre. A mãe e avó arrumaram as meninas e foram pegar o ônibus e desta vez, buscar socorro no posto 24 horas das Moreninhas. "Quando desci do ônibus a Ana Karla parou de respirar nos meus braços e a Ana Clara já estava morta com a mãe dela. A gente cuidava bem delas. Não sei o por que disso ter acontecido e se foi a gripe suína. Eu não sei", desabafa a avó.

Embora as meninas tenham nascido na aldeia Cachoeirinha, em Miranda, terra da avó e dos pais, elas moravam na Capital, e desde que nasceram recebiam atendimento pediátrico do Posto do Los Angeles. Ao Midiamax, o secretário municipal de Saúde, Luiz Henrique Mandetta havia dito que o caso deveria ser apurado com cautela por se tratar de crianças indígenas.

Incógnitas

Para o delegado Wellington Oliveira, do 4 DP (Distrito Policial), responsável pela investigação, o exame pericial poderá esclarecer as condições de saúde das crianças e ainda, apontar se houve negligência do Estado. Entres os aspectos investigados estão o fato de a possibilidade de as meninas não terem recebido atendimento médico a contento, ou, acompanhamento social. As crianças pesavam 7 quilos e estavam 2 abaixo do peso ideal.

"As meninas nasceram prematuras. Tudo precisa ser apurado com muito cuidado. A mãe está completamente desolada".

Há suspeita de que as crianças possam ter sido contagiadas pelo vírus Influeza A (gripe suína) pelo curto período entre os sintomas e o óbito, 48 horas. Neste caso, o procedimento imediato teria que ser a internação.

Às crianças no posto Guanandi, além do dipirona receitado para a febre, os medicamentos broncodilatadores utilizados na inalação foram o Berot e Atrovent.

O delegado reúne os dados e frisa que o CRM (Conselho Regional de Medicina) poderá ser acionado caso fique claro a negligência médica.

"Em 10 dias o laudo deve ficar pronto. O inquérito apura a suspeita de homicídio culposo (não intencional). O que deixa o caso intrigante é o fato de serem duas vítimas. Estamos ouvindo a família e os médicos", finaliza o delegado.

Serviço - Rua Raizinha, 504, Jardim Uirapuru

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