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Após conflitos em Caarapó, polícia retoma atendimento a índios em aldeia

G1- http://g1.globo.com
Autor: Gabriela Pavão
16 de Ago de 2016

Quase um mês depois do mais recente conflito entre produtores rurais e indígenas em Caarapó, no sul de Mato Grosso do Sul, policiais civis do município voltaram a atender a comunidade indígena nas aldeias. A iniciativa faz parte do projeto "Polícia Civil: garantidora de direitos no inquérito policial e fomentadora de cidade das comunidades indígenas de Caarapó", que leva atendimento para moradores da aldeia TeyKue, que fica a cerca de 20 km da delegacia.

O projeto surgiu depois que a delegacia percebeu que muitos inquéritos envolvendo indígenas estavam parados há mais de 5 anos por falta de oitivas, já que os indígenas dificilmente vão até à delegacia na cidade. A distância e a falta de transporte dificultam o trajeto, que geralmente é feito a pé pelos indígenas.

No primeiro dia da retomada, na quinta-feira (11), foram feitos 25 atendimentos, sendo 8 oitivas, 10 atendimentos de carteira de identidade e 7 serviços de orientação a pessoas, segundo o delegado Rodrigo Blonkowski, titular da Delegacia de Polícia Civil do município.

Ele disse ao G1 que a confecção de identidade civil é uma das principais preocupações dos indígenas, que geralmente só tem o registro indígena feito pela Fundação Nacional do Índio (Funai), mas quando o assunto é sobre os delitos mais cometidos, a realidade da aldeia é a mesma da cidade.

"A violência doméstica, infelizmente, é o carro-chefe dos delitos na aldeia, não é só mal do branco, é mal do índio também", afirmou.

Estupros

O alto índice de estupro, principalmente envolvendo crianças e adolescentes, é uma particularidade da comunidade indígena, segundo o delegado, além dos casos de suicídio na reserva, que representam 100% dos registros feitos em Caarapó.

"Antes de fazer o projeto de atendimento aqui nas aldeias, nós fizemos levantamento de estatísticas e vimos que os casos de estupro na reserva representavam 2/3 dos casos de estupro da cidade. Isso se explica um pouco pela cultura deles, onde a mulher é um pouco mais vulnerável, e também pela violência, porque lá é muito comum problemas com bebida alcoólica e droga", explicou.

Para tentar mudar a realidade, o projeto vai além do atendimento dos casos de delito e busca também conscientizar a população indígena sobre a questão, com a ajuda de outras instituições do poder público. O delegado convidou o Conselho Tutelar para acompanhar os trabalhos e fazer atendimento no local.

"Foi o único órgão que participou junto conosco, eles foram lá e atenderam as demandas que cabem a eles e a gente está com ideia de fazer palestras para falar sobre a questão das drogas e sobre a própria violência doméstica", ressaltou Blonkowski.

Satisfeito com o trabalho, o delegado ressalta que mais além de agilizar inquéritos e desafogar o trabalho da polícia, o contato entre a delegacia e os indígenas fortalece o respeito e a confiança entre eles. Ele também lembra que o projeto só é possível porque os indígenas querem e buscam ajudar na estrutura para os atendimentos.

"Os índios escutam muito a polícia e o que a gente vê ali é que falta a presença das instituições do estado dentro da aldeia. Nós levamos policiais, papiloscopistas, equipamentos e eles arrumam uma sala dentro da escola, com acesso à internet para que a gente possa fazer nosso trabalho. Além disso, os capitães também fazem a ponte entre a gente e as pessoas que precisam ser intimadas, por exemplo", afirmou.

A intenção é levar atendimento até a aldeia TeyKue uma vez por semana. O projeto foi selecionado para concorrer na categoria "Justiça e Cidadania" do Prêmio Innovare, que busca identificar e premiar práticas inovadoras que aumentem a qualidade da prestação jurisdicional.

Conflitos

Sobre o conflito agrário na região entre indígenas e produtores rurais, o delegado ressalta que a proximidade da Polícia Civil com os índios pode ajudar a amenizar o problema.

"Quando tem conflito todo mundo saiu perdendo, o indígena, o fazendeiro, a cidade. Se você conseguir um laço de confiança é muito fácil lidar com eles. Aqui nossos investigadores nunca tiveram problema, até na época do conflito a gente conversava com eles diariamente a gente conseguiu negociar inclusive a devolução das armas dos policiais militares", ressaltou.

O último confronto aconteceu na fazenda Ivu, em Caarapó, no sudoeste do estado, onde um índio morreu e outros seis ficaram feridos na terça-feira (14). Os indígenas tentaram retomar a área, que está dentro da terra indígena Dourados Amambaipeguá I, e os fazendeiros tentaram impedir a ação. Um acusa o outro de ter iniciado o embate.

A área consta no Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação aprovado pela aprovação pela Fundação Nacional do Índio (Funai) no dia 12 de maio de 2016, que considerou a área terra indígena. O procedimento de identificação e delimitação da terra foi realizado no âmbito do Compromisso de Ajustamento de Conduta(CAC), firmado em novembro de 2007, entre Funai e Ministério Público Federal (MPF).

Segundo a assessoria da Funai, o próximo passo é a demarcação e homologação da terra. A área está localizada nos municípios de Caarapó, Laguna Carapã e Amambai e tem 55.590 hectares. A Dourados Amambaipeguá I é tradicionalmente ocupada pelo povo guarani-kaiowá.

Dourados Amambaipeguá I

A Terra Indígena Dourados Amambaipeguá I abriga quatro comunidades (tekoha) denominadas Javorai Kue, Pindo Roky, Km 20/ Urukuty e Laguna Joha, com população aproximada de 5.800 pessoas, de acordo com a Funai.

Devido ao processo de expropriação dos territórios indígenas, que ali teve início em 1882 com o início da atividade de produção de erva-mate e a chegada de colonos gaúchos após a Guerra do Paraguai (1864 a 1870), os guarani-kaiowá passaram a viver dispersos pela região, conforme a fundação.

http://g1.globo.com/mato-grosso-do-sul/noticia/2016/08/policia-retoma-a…

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