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Análise ampliada sobre reserva foi inédita na Justiça brasileira

Folha de Boa Vista-Boa Vista-RR
13 de Jan de 2005

O processo de demarcação e homologação da área indígena Raposa/Serra do Sol teve etapas até então desconhecidas do mundo jurídico. O juiz federal Helder Girão Barreto decidiu que a opinião de um antropólogo não bastava para oferecer as informações necessárias a uma decisão de alta complexidade, como o caso exige. Assim, nomeou uma comissão interdisciplinar para elaborar um laudo definitivo sobre a situação da área e o impacto que cada tipo de demarcação poderia causar.
Na verdade, nunca um processo demarcatório de área indígena teve como suporte laudo produzido por profissionais de fora do ramo da Antropologia. Com a novidade processual, ficou evidente a divergência de foco entre os que se preocupam exclusivamente com o aspecto de garantia de área física para os indígenas e aqueles que procuram ver o conjunto da sociedade como foco principal.
A idéia era avaliar com amplitude os aspectos sócio-econômicos-culturais envolvendo indígenas, produtores rurais, núcleos populacionais da área, além do interesse do Estado e do País, aí inserido o aspecto da segurança nacional. Somente a opinião de um antropólogo pareceu ao magistrado insuficiente para avaliar os parâmetros essenciais a uma decisão equilibrada.
A comissão, formada por doutores em suas áreas de conhecimento, estava assim composta: Erwin Frank (Antropologia); Jayme de Agostinho (Geografia da fome); Hamilton Gondim (Economia); Kleber Batalha Franklin (Relações Internacionais), todos da Universidade Federal de Roraima (UFRR), e Agronomia, da Universidade Federal de Viçosa/MG.
No transcurso do trabalho, houve divergência na opinião dos profissionais. O antropólogo Erwin Frank só admitia a demarcação de forma contínua, enquanto os demais membros opinavam pela demarcação em ilhas, fato que gerou dois laudos sobre a mesma questão.
Enquanto a comissão trabalhava, o ministro da Justiça, Márcio Tomás Bastos, deu entrevista garantindo a homologação contínua. A fim de evitar transtornos futuros, Girão decidiu liminarmente proibir qualquer demarcação que envolvesse as partes em conflito. Entendeu o magistrado que tanto os produtores quanto uma parcela dos índios concordavam com a homologação em ilhas. Assim, a conclusão aguardaria a decisão final da Justiça.
Aqui o juiz recebeu os estudos, enquanto em Brasília a Procuradoria Geral da República, a Funai e o Conselho Indígena de Roraima (CIR) tentavam derrubar a decisão junto ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. A relatora foi a desembargadora federal Selene Almeida, que veio a Roraima visitar as áreas antes de apresentar seu relatório. Após muita expectativa, Selene deu um voto considerado bastante detalhado, com 170 páginas, incluindo mapas e gráficos.
O relatório não apenas mantinha como ampliava a decisão de Girão. Novas áreas foram consideradas essenciais aos interesses do Estado e do País e, assim, inseridas entre as ilhas já propostas pelo relatório dos peritos. Paralelamente, um relatório da Comissão Externa da Câmara e do Senado apoiava a mesma proposta contida no voto da desembargadora.
Ao prosseguir com o andamento do processo em Boa Vista, o juiz abriu prazo para que as partes tomassem conhecimento dos laudos e formulassem questões sobre os mesmos, inclusive com possibilidade de pedirem impugnação parcial ou total. Todos os pontos considerados obscuros receberam a resposta dos membros da comissão.
Após essa etapa, correu o prazo para as alegações finais, após o que o juiz poderia dar sua sentença. Foi quando o ministro Carlos de Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF) atendeu ao pedido do Procurador-Geral da República, Claudio Fontelles, e determinou que o processo fosse enviado ao STF, para julgamento naquela corte, por se tratar, em seu entendimento, de conflito federativo.
A última decisão sobre o processo foi dada pela ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, na ação cautelar interposta pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PPS). A ministra suspendeu os efeitos da Portaria 820/98, pondo termo em qualquer outra iniciativa com pedido de liminar ou de antecipação de tutela que possa ocorrer até o julgamento do mérito de todas as ações que atualmente se encontram no Supremo Tribunal Federal. (C.P)(

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