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Amigos e Companheiros:

Secretaria Geral da Associação Missão Tremembé-Fortaleza-CE
Autor: Maria Amélia Leite,
30 de Set de 2004

Estamos enviando cópia da carta dos Tremembé das Aldeias São José e Buriti, em Itapipoca, Ceará, e também da COPICE, em apoio aos seus parentes, que têm sofrido uma voraz perseguição por parte do Empreendimento Turístico Nova Atlântica em Itapipoca, e também por parte dos empresários de viveiros de camarão em cativeiro, localizados nas terras dos Tremembé de Almofala, nas aldeias Camondongo, Passagem Rasa e Barra da Tijuca, no município de Itarema.

Já são muitos meses de perseguição, ameaças de morte, todo tipo de humilhação e massacre, tudo para submetê-los aos seus projetos, com apoio das polícias e políticos locais.

A carta da COPICE está dirigida à Ministra Marina Silva, solicitando a edição de uma Portaria Ministerial impedindo a implantação de viveiros de camarão em terras indígenas (já constam pedidos referentes às áreas de proteção permanente, conforme informação recebida através da REDManglar).

Por favor, reiterem e reforcem os pedidos dos Tremembé junto aos poderes públicos, em todas as esferas, para que essa situação seja resolvida de forma a garantir o direito constitucional dos Povos Indígenas às suas terras tradicionais.

Um abraço e muita força na luta de vocês todos,

Sociedade Tremembé São José/Buriti

Comunidade Indígena Tremembé São José/Buriti, em Itapipoca, reunida no Salão Comunitário da aldeia Buriti, perante o chefe do Núcleo de Apoio da FUNAI no Ceará, relatamos o seguinte:

1. No dia 29 de setembro de 2004, cerca de 10 índios dessa comunidade se encontravam em um local chamado Beco do Manuel Macário, quando dois policiais de nomes Baldor e Lucas, passaram em direção à casa do gerente do empreendimento que se propõe a ser construído nestas terras, lembrando que, apesar de serem policiais militares, estavam numa viatura da firma responsável pelo empreendimento. Logo após, retornaram em direção à praia da Baleia de onde, em pouco tempo, estavam de volta com mais dois policiais, em companhia de aproximadamente 30 pessoas para retirar os cocos que sempre foram retirados pela comunidade.

Quando os quatro policias, arbitrariamente, de forma agressiva, sob o comando do chamado Baldor, mandaram os índios se afastarem bramindo o cassetete e dizendo que iriam, de um jeito ou de outro, retirar os cocos, apesar de nossa comunidade ficar no local. Dois policiais ficaram nos vigiando, enquanto os cocos eram retirados. Foi quando a comunidade se dirigiu ao portão para impedir a saída dos cocos. Os policiais, de forma violenta, começaram a empurrar pessoas da comunidade, inclusive mulheres. Diante disso, a comunidade decidiu se retirar do local, pois não teriam como enfrentar os policiais. Quando já estavam dispersos, a polícia, em duas viaturas de propriedade da empresa, abordaram o índio Júlio César em companhia de mais quatro índios, quando deram voz de prisão ao citado índio pelo mesmo estar com uma foice, seu material de trabalho na roça, em sua mão. Vendo o que estava acontecendo, os outros índios que estavam retornando para as suas casas, foram ao local saber o porquê da prisão. Alguns índios decidiram acompanhar até a delegacia para prestar apoio ao índio preso. Foi quando, sob o comando de Baldor, os policiais, em posse de cassetetes, começaram a agredir indiscriminadamente a comunidade e não permitiram que ninguém acompanhasse o preso e não prestaram esclarecimento do porquê da prisão.

2. Na delegacia, o índio Júlio César foi acusado pelo Baldor de ser o responsável pela queima de uma barraca e ameaçado de ser processado. Foi quando esse mesmo policial, no intuito de intimidar, disse que, quando trabalhava em Fortaleza, havia "colocado quatro para viajar".

Sendo o índio liberado após suposto comunicado do major comandante geral da polícia militar em Itapipoca, mas a sua foice, com a qual trabalha na roça, ficou detida. Em nenhum momento, a comunidade ameaçou enfrentar ou agredir os policiais

3. Todo o conflito que tem ocorrido nos últimos tempos em nossa comunidade deve-se à presença do advogado Felipe que tem dividido a comunidade e incentivado uma parte dela com promessas de cestas básicas, em enfrentar a outra parte. Como toda comunidade, convivemos com os nossos problemas que geralmente eram resolvidos aqui mesmo, mas, após a chegada desse advogado, os conflitos começaram a se tornar mais sérios, inclusive com a polícia apoiando as decisões da emprega, desconsiderando a presença da comunidade indígena.

4. Essas ações têm gerado inclusive várias ameaças no intuito de desarticular o movimento indígena no local. Sendo que algumas lideranças já não se sentem seguras em caminhar tranqüilas pelo local.

Diante do exposto e do abandono de apoio policial que os índios Tremembé São José/Buriti tem passado, solicitamos da FUNAI no Ceará, da FUNAI-Brasília, Procuradoria da República, Procuradoria Federal, Polícia Federal e demais entidades que apóiam a causa indígena, bem como as comunidades indígenas do Ceará, apoio para solucionar nosso problema, pois a tendência é que ocorram mortes ocasionadas por uma ação inescrupulosa de empresários que, sem nenhum respeito às pessoas que aqui vivem, têm levado inclusive as nossas crianças a serem discriminadas na escola que freqüentam e revoltado o nosso povo ao ponto de, se não tivermos apoio, teremos de revidar essas agressões para nos defender.

COPICE-COORDENAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES DOS POVOS INDÍGENAS NO CEARÁ

À Exma. Senhora

Maria Osmarina Marina da Silva Vaz de Lima

Ministra do Meio Ambiente

Esplanada dos Ministérios, Bloco "B" 5o. Andar

70068-900 Brasília-DF

Senhora Ministra :

Nós, Povos Indígenas no Ceará, estamos muito preocupados com o que vem acontecendo em nossas terras tradicionais. Muitas delas estão localizadas no litoral cearense e são áreas de muito risco por conta dos carcinocultores que vêm desmatando os manguezais e também nossos carnaubais, mangueirais e coqueirais. E muitas outras plantas nativas que ficam próximas às margens do litoral. Vêm desabrigando também os nativos que vivem da pesca artesanal, causando até crimes, prisões, espancamentos, apavorando as famílias e até às crianças que não querem ir para a escola de tão assustadas que vivem atualmente.

Isto acontece quando não concordamos com a posição dos empresários que, além de acabarem com tudo que ainda temos, não deixam nem que os pescadores tenham acesso à praia, para pescarem e tirarem do mar e dos rios, a sua sobrevivência e de suas famílias.

Ficam cercando todos os caminhos de acesso ao mar e aos rios, córregos e colocam pistoleiros dentro e fora do local onde estão construindo esses viveiros - impedindo a passagem dos pescadores que se deslocam para a pesca, como sempre foi e é seu costume.

Estamos impedidos também de qualquer reforma e até construção de casas para as famílias que vivem há anos aí, inclusive várias gerações de Tremembé. Quando as pessoas se aproximam desses caminhos são recebidas com agressões, espancamentos e até tiros dados por seus vigilantes que são, também, pistoleiros conhecidos na região.

No início deste mês de setembro os moradores do Curral Velho, Acarau, sofreram agressões, espancamentos e até prisões por parte dos empregados e policiais ligados ao empresário que explora dois viveiros de camarão nessa localidade. Eles tentaram impedir o desmatamento, numa conversa amigável, mesmo assim já era com trator o serviço.

Num dos viveiros em nossa terra indígena - Barra da Tijuca - deu já uma doença no camarão criado em cativeiro e foram perdidas, segundo soubemos, toneladas desse produto - uma mancha preta que faz o camarão apodrecer

Os remédios utilizados para defender o viveiro dessas doenças são muito tóxicos. E, para completar, depois de lavados, essa mesma água é jogada dentro do rio. O resultado é matar todos os seres vivos criados no manguezal e no rio. E mata até o próprio mangue. Sem falar no solo, nas águas que utilizamos no dia a dia, na saúde das crianças e dos adultos também. O cheiro desse veneno é muito forte e o local mais próximo fica todo contaminado. Nossas crianças estão pálidas, esmorecidas, sem ânimo para nada.

Na nossa terra Tremembé de Almofala, em Itarema, já estão sendo construídos três viveiros de camarão em cativeiro: aldeia Camondongo, na Mata; Aldeia Passagem Rasa e na Barra da Tijuca, região da Praia.

Em Itapipoca, em duas aldeias Tremembé: São José e Buriti, tem outro viveiro de camarão também sendo construído. E outro problema sério tem lá: a construção de uma cidade turística internacional, de interesse de um grupo espanhol. Dentro da terra indígena. Está sendo um sofrimento muito grande.

Só não está pior a situação nessas terras porque no inverno deste ano as chuvas foram muito pesadas e atrapalharam a construção, quase levou tudo que já estava em andamento. Agora começam a ser retomados os trabalhos, inclusive com desmatamento dentro e fora dos manguezais.

Nós conseguimos dois estudos muito importantes nas nossas terras: um "Diagnóstico Ambiental e da Qualidade de Vida dos Tremembé de Almofala", com apoio do FUNAMA; e, agora recente, um Parecer Técnico da situação dos manguezais, feito pelo Dr. Jeovah Meireles, do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará.

Por isso estamos escrevendo e contando essa história da nossa situação e pedindo a Vossa Excelência que faça tudo que for possível para criar uma lei impedindo que nas nossas terras indígenas sejam construídos viveiros de camarão em cativeiro. E que esses invasores sejam impedidos de entrar em nossas terras tradicionais, que são, também, terras da União Federal.

Nós agradecemos muito toda a atenção que Vossa Excelência der a este nosso pedido. Nós contamos com o apoio desse Ministério que defende a vida das nossas terras e das riquezas da natureza, que é também nossa mãe.

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