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Ambientalista conquista igrejas

FSP, Ciência, p. A15
Autor: McKIBBEN, Bill
14 de Dez de 2009

Ambientalista conquista igrejas
McKibben ajudou a coordenar protestos em centenas de cidades pedindo ousadia em acordo do clima
Propostas apresentadas em Copenhague até agora são fracas porque negociadores usam ciência desatualizada, diz criador de campanha

Claudio Angelo
Enviado especial a Copenhague

Bill McKibben está indo à igreja. Mas não é que o ambientalista americano conte com intervenção divina para salvar o acordo de Copenhague: ele sabe que não sairá daqui o acordo capaz de deter o aquecimento global. O que o fundador da campanha 350 planeja é envolver fiéis do mundo todo em manifestações pedindo ação no clima, como a que aconteceu anteontem em centenas de cidades ao redor do planeta.
Um dos organizadores dos protestos do domingo, McKibben fundou em 2008 uma campanha para pedir aos políticos que a concentração de gás carbônico na atmosfera seja estabilizada em 350 ppm (partes por milhão), não em 450, como se negocia em Copenhague (hoje o mundo está em 385). Numa caminhada rumo à igreja de Nossa Senhora, em Copenhague, o ativista disse à Folha que está longe de seu objetivo. "Se você somar todas as metas postas sobre a mesa, em 2100 teremos 760 ppm", disse.
Em apoio à campanha, o sino da igreja soou ontem 350 badaladas. Leia a entrevista.

Folha - Que impacto o sr. espera que os protestos tenham sobre a negociação em Copenhague?

Bill McKibben - É uma boa pergunta. Por um lado, Copenhague me parece muito diferente do Protocolo de Kyoto, precisamente porque há um grande movimento global pedindo ação. Agora, se isso está acontecendo a tempo de ter algum efeito sobre a discussão que se dá daqui até o fim da semana eu não sei. Porque os EUA e a China são os obstáculos e têm políticos difíceis de pressionar. Claramente o resultado o desta semana não vai ser o que esperávamos; neste momento, se você somar todas as metas postas sobre a mesa, em 2100 teremos 760 partes por milhão de CO2 na atmosfera. E isso é ruim! Por outro lado, sabemos que este não será o fim da história. Ninguém vai produzir um tratado vinculante ou algo assim aqui, então vamos manter esse movimento crescendo dramaticamente. As pessoas vão olhar para o que estão fazendo e vão ficar com raiva.

Folha - Eu ouvi isso ontem de pessoas na rua.

McKibben - As pessoas na rua sabem muito mais ciência do que as pessoas na sala de conferências. Todo mundo na sala ainda trabalha com ciência de quatro ou cinco anos atrás. Isso é antes de o Ártico ter derretido [em 2007]. Eles estão fazendo o fácil, não o necessário. Não estamos nem perto de onde precisamos. O que precisa acontecer é muito difícil e governo nenhum quer fazê-lo, exceto as Maldivas. Não é surpresa que não vamos conseguir, mas continuaremos tentando.

Folha - Nesse sentido, é de certa forma bom que Copenhague falhe, porque ninguém ficaria preso a um tratado que o fácil e não o preciso.

McKibben - Não sou analista político, não sei o que é bom ou ruim. Só sei que continuaremos em frente, não importa o que aconteça aqui.

Folha - Não há um risco no adiamento? O risco de a resistência dos EUA a um tratado crescer depois.

McKibben - O maior risco é que o planeta está aquecendo muito depressa e a cada ano que passa sem que façamos algo o dano aumenta. Mas os riscos políticos são reais também. Os EUA podem ir de 60 senadores democratas para 55. E nunca teremos 67 votos [mínimo necessário para aprovar um tratado internacional], e é por isso que as pessoas estão se pegando a essas formulações absurdamente complicadas como "politicamente vinculante".

Folha - Quando o sr. decidiu a convocar esses protestos?

McKibben - A ideia surgiu alguns anos atrás, e em 2007 nós tentamos com sucesso fazer com que Barack Obama tivesse ao menos uma posição forte sobre clima, mas depois que o Ártico derreteu resolvemos que teria de ser algo global.

Folha - O que Obama vai trazer a Copenhague?

McKibben - Tenho certeza de que ele fará um bom discurso (risos). Mas não sei se trará muita coisa além disso.

Folha - O caso dos e-mails roubados terá algum impacto sobre a posição dos EUA nesta negociação?

McKibben - Há muitos interesses envolvidos nisso. Acho difícil acreditar como alguém possa levar isso a sério. Porque o tipo de conspiração que eles [negadores do aquecimento global] alegam existir envolve não só cientistas, mas também convencer as geleiras a derreter.

FSP, 14/12/2009, Ciência, p. A15

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