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Amazônia, ONGs e desinformações

OESP, Notas & Informações, p. A3
25 de Abr de 2004

Amazônia, ONGs e desinformações

Bem fez o ex-ministro da Agricultura Marcus Vinicius Pratini de Moraes em não esperar a reação do governo brasileiro para enviar à revista inglesa The Economist um pedido de retratação, por ter veiculado a informação de que o gado e a soja estariam "comendo" a floresta amazônica, pelo que sugeria que os países ricos evitassem importar esses dois produtos brasileiros. "Há um desconhecimento absurdo entre a Amazônia Legal, que engloba Estados produtores de carne e soja, como o Mato Grosso, e a floresta amazônica, onde não há possibilidade de produção e escoamento de soja e gado" - argumentou o ex-ministro, que hoje é presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Exportação de Carnes, aduzindo: "O agronegócio brasileiro, hoje, cultiva uma área de 200 milhões de hectares e dispõe de outros 100 milhões de hectares para uso, sem que seja necessário tocar um dedo na Amazônia."
E Pratini tocou na ferida, ao dizer que as informações erradas "muitas vezes repetidas pelas organizações não-governamentais (ONGs) ligadas ao meio ambiente estão a serviço de países concorrentes do Brasil nas exportações de carnes e ocorrem, coincidentemente, no momento em que o País, por meio do Mercosul, iniciará o debate em torno da corrente de comércio com a União Européia". É que - complementa o ex-ministro - os países ricos gastam hoje US$ 1 bilhão por dia em subsídios com a sua agricultura: "Dinheiro que é pago por exportadores como o Brasil, que apresentam níveis de produtividade elevado, resultado de melhoria genética e melhoria dos processos no campo" - concluiu Pratini, exemplificando que o custo de produção de 1 quilo de carne bovina no Brasil é de US$ 1, enquanto nos Estados Unidos fica em US$ 1,90.
Bom seria se o governo brasileiro tivesse condições de dar respostas imediatas como essa - ou, pelo menos, estivesse mais atento à leitura de importantes publicações estrangeiras que veiculassem matérias desinformadas, em certo sentido difamatórias e prejudiciais ao nosso comércio exterior.
Importa mais, no entanto, refletir sobre a questão levantada pelo ex-ministro, no que diz respeito à ampla capacidade de reprodução de desinformações das inumeráveis ONGs ambientalistas estrangeiras instaladas na Amazônia. Aliás, a elas têm se referido políticos de respeitabilidade incontestável, como é o caso do senador pedetista Jefferson Perez (no programa de seu partido que foi ao ar quinta-feira, na televisão) quando disse que essas organizações já parecem realizar, de fato, a decantada "internacionalização" da Amazônia.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrou-se sensível à necessidade de compatibilizar a preservação da riqueza da biodiversidade amazônica com o desenvolvimento sustentado de uma região habitada por quase 20 milhões de seres humanos, que precisam trabalhar e dar sustento a suas famílias. E, na base da Petrobrás em Coari (AM), ao inaugurar uma unidade de processamento de gás natural de Urucu e anunciar a construção do Gasoduto Urucu-Manaus, de 420 quilômetros - que não tem como deixar de cortar um pedaço de selva amazônica -, o presidente Lula mandou um claro recado a essas ONGs ambientalistas, ao dizer que "a Amazônia não é apenas um santuário da humanidade".
É curioso como essas ONGs, como se fossem portadoras de um legítimo mandato de representação popular, se dispõem a cobrar, a exigir explicações de planos de governo, a "passar" todo o tipo de informações - que derivam de suas próprias interpretações - à imprensa internacional, sobre o que possa afetar ou não o meio ambiente, a biodiversidade amazônica, a integridade dos ecossistemas, as reservas indígenas e tudo o mais, o que não deixa de interferir nos interesses, na imagem e no comércio exterior do País, e, no entanto, não se submetem a qualquer controle cadastral, isentando-se de quaisquer responsabilidades formais perante a sociedade brasileira. Não que se critique a interferência direta de organizações sociais em um sem-número de assuntos de interesse da sociedade, ou que se imagine que o Estado deva cercear ou censurar suas atividades. De forma alguma, pois as ONGs são parte constitutiva importante das democracias contemporâneas. O que não se pode admitir, no entanto, é a total inversão de funções, como se a tais ONGs - inclusive estrangeiras - se atribuíssem poder público maior do que o do próprio Poder Público, ou se lhes concedesse o pleno e incontestável direito de desinformar.

OESP, 25/04/2004, Notas & Informações, p. A3

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