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Amazônia apela para fator econômico

JB, País, p. A3
29 de Jul de 2004

Amazônia apela para fator econômico

Cientes de que o apelo ecológico nem sempre sensibiliza as autoridades, especialistas começam a agregar um argumento fundamental na defesa da preservação da Amazônia: os prejuízos econômicos que a devastação pode causar. Segundo o pesquisador Roni Avissar, da Duke University (EUA), o desmatamento amazônico e o africano não só afetam os índices locais de precipitação, mas também diminuem consideravelmente as chuvas no Meio-Oeste americano - área de alta produtividade agrícola - na primavera e no verão. O estudo será apresentado hoje, durante a 3ª Conferência Científica do LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia), em Brasília.

Berço da soja, o Meio-Oeste dos Estados Unidos já sofre com a falta de umidade que, dependendo do ano, causa estresse nas lavouras exatamente nos meses de enchimento de grãos, quando a demanda por água é grande. O resultado, segundo a pesquisa, é um enorme prejuízo aos agricultores, que ficam reféns do comportamento das chuvas, e uma interferência nos preços internacionais, o que afeta o mercado mundial de commodities.

O mesmo raciocínio foi utilizado ontem pelos pesquisadores Antônio Nobre (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) e Michael Keller (Forest Servic University of New Hampshire). Segundo eles, os desmatamentos e as queimadas na Amazônia começam a alterar o ciclo de carbono do ecossistema. Isso faz com que a região deixe de ser um dos principais responsáveis pela absorção de dióxido de carbono da atmosfera. A mudança pode afetar o ciclo das águas e reduzir a quantidade de chuvas em diversos Estados brasileiros.

- No dia em que isso acontecer será tarde para reverter o processo, e as conseqüências serão drásticas para o Centro-Oeste, o Sul e o Sudeste do país, responsáveis por 80% do Produto Interno Bruto Brasileiro - alerta Nobre.

Segundo o especialista, ''o gado e soja que estão chegando na Amazônia vão custar muito caro para o país''. E este custo não está sendo computado porque as ligações entre meio ambiente e produção ainda são muito tênues.

- O projeto LBA começa a mostrar isso - completa Nobre.

De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), só no ano passado foram desmatados 23,7 mil quilômetros, sendo 80% deste total destinados para a agropecuária. Nas duas últimas semanas, segundo Nobre, os satélites de monitoramento constataram a destruição de 2 mil quilômetros de florestas no chamado arco do desmatamento.

- A ciência não tem como competir com o desmatamento de um quilômetro quadrado por semana. Precisamos de políticas efetivas capazes de conter este quadro e de incentivar processos sustentáveis de desenvolvimento - cobra o pesquisador do Inpa.

Nobre defende a industrialização da Amazônia como única alternativa de desenvolvimento com preservação ambiental.

- O desenvolvimento da floresta é a única saída. Mas não o desenvolvimento com gado, madeira e soja. É preciso agregar valor, gerar emprego e isso se faz com indústria, não com aumento da área plantada - ensina, acrescentando que as principais economias do planeta seguem nesta direção.

O especialista destaca que não é preciso ir tão longe para defender esta diretriz.

- A Zona Franca de Manaus é hoje responsável por 6% dos 7% da participação da Amazônia no PIB nacional e as imagens de satélite mostram que a floresta em volta do lugar está intacta. Que tipo de associação é esta que se faz no Brasil de que desenvolvimento e riqueza saem do desmatamento das florestas? - questiona.

Para Antonio Nobre, essa é uma visão vendida pela classe ruralista, ''que quer fazer acreditar que a atividade deles é a mais importante'' e referendada por parte do governo e da sociedade, que querem aumentar as exportações às custas do agronegócio. Nobre não discorda da necessidade da agricultura e da pecuária, mas defende que estas sejam vistas dentro de um contexto global do que se quer para o país.

JB, 29/07/2004, País, p. A3

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