VOLTAR

Aldeias indígenas enfrentam invasões no Pará

O Liberal-Belém-PA
19 de Jan de 2004

Conflitos em terras indígenas provocam insegurança não apenas aos índios mas também aos agricultores, madeireiros, caçadores de animais e outros. Os conflitos se arrastam há décadas. Nos últimos dias do ano passado, por exemplo, foram registradas novas invasões em terras indígenas. Os conflitos durante as ocupações terminaram com dois indígenas assassinados.

Uma discussão entre um peão e um índio, ambos alcoolizados, resultou na morte de um índio Amanaé, degolado com uma faca. Os índios Assurini, da aldeia Trocará, preparam-se para uma atividade coletiva, na cidade de Tucuruí, com a finalidade de chamar a atenção de autoridades sobre o assassinato de um índio da etnia Assurini, ocorrido no último dia 26.

No ano de 2003, os conflitos resultaram na morte de 24 lideranças indígenas pelo Brasil. A falta de sintonia entre os interesses econômicos facilita as relações conflitantes dos índios com madeireiros, garimpeiros e colonos. No Pará, ameaças de morte e de seqüestro vêm acontecendo com freqüência, a exemplo das ameças feitas ao líder Ednaldo Tembé e seus filhos. Outro caso conflituoso foi o de Novo Progres

Missionários do Conselho Indigenista (Cimi) também estão sofrendo atentados. Povos indígenas estão recorrendo ao Ministério Público Federal, através da Funai, para que suas reivindicações sejam aceitas. No Ministério Público tramitam vários processos envolvendo questões fundiárias, agressões à índios e questões trabalhistas. Entre os processos, um deles trata-se da denúncia de invasões na reserva indígena Trocará. A denúncia solicita abertura de inquérito federal.

Além de uma solução para a questão fundiária, população indígena solicita à construção de escolas, atendimento à saúde, postos de fiscalização para impedir a entrada ilegal de pescadores, madeireiros, caçadores e até empresas de turismo.

A questão fundiária é a maior geradora de conflitos em áreas indígenas. Na região em que as terras indígenas estão sob a administração regional da Funai de Marabá, as situações de risco vêm aumentando. Na região existem onze terras indígenas, com aproximadamente quatro mil índios de diferentes etnias. Destas, seis estão homologadas na jurisdição de Marabá; outras são terras do Incra que foram disponibilizadas para o aldeamento de índios que perambulavam pelo Estado.

Há mais de dez anos que não existe homologação de terras indígenas na região por parte do governo federal. O último reconhecimento de terra foi direcionada para a tribo Amanaés, em 1999. A área está em fase de identificação. Elimar Araújo, coordenador da regional de Marabá, espera que as terras sejam homologadas neste ano.

A administração regional da Funai, em Marabá, integra as etnias indígenas dos municípios de Marabá, Bom Jesus, Rondon do Pará, São Geraldo do Araguaia, Parauapebas, Parogominas, Ipixuna do Pará, Mojú, São Félix do Xingu, Ourilândia do Norte, Itupiranga, Tucumã e Tucuruí.

Altamira terá 4 áreas demarcadas

A administração regional da Funai, em Altamira, é responsável por nove áreas indígenas que compreedem, juntas, seis milhões de hectares de terras, uma delas, em processo de identificação. Destas, apenas cinco estão homologadas. Benigno Pessoa, coordenador regional da Funai de Altamira, disse que este ano será feita a demarcação de áreas limitadas pelo departamento fundiário.

A população indígena, em torno de 1,7 mil habitantes, está distribuída pelas terras indígenas situadas nos municípios de Altamira, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio, Vitória do Xingu, Uruará, Medicilândia, Brasil Novo e Anapu. Entre as etnias estão os Kuruaya, Xipaia, Juruna, Parakanã, Araweté, Arara, Xicrim, Kararaú e a nação Assurini.

Benigno Pessoa confirma a tendência das demais regionais da Funai: "O maior problema enfrentado por nós é a invasão de terras". Nas áreas de conflito, o grupo que apresenta ânimos mais exaltados é o da área indígena Apyterewa. Os 773 hectares de terras pertencem a tribo Parakanã. A Portaria no 1.192 de 31 de dezembro de 2001, expedida pelo Ministério da Justiça, autorizou a retirada dos invasores, porém, a falta de policiais militares e federais já retardou em dois anos a determinação judicial. Com os invasores no local, grupos de trabalho não estão conseguindo demarcar a terra e os índios estão cada vez mais impacientes.

Governo federal é alvo de críticas

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) tem autonomia para fazer análises críticas. O Cimi apóia e assessora comunidades indígenas; alerta a opinião pública e denuncia políticas governamentais desajustadas. É uma missão que contribui com a resistência e com a organização dos povos indígenas. O coordenador regional do Cimi, Claudemir Monteiro, disse que o atual governo federal, já foi uma esperança para a população indígena, mas hoje deixa dúvidas. "Em vez de garantir políticas públicas que contribuam com a melhoria da qualidade de vida dos índios, o governo vem atuando no sentido contrário", ressaltou o coordenador. Para ele, a redução de terras indígenas foi o que de fato aconteceu, a exemplo das terras de Cachoeira Seca, do povo Arara, próxima a Altamira. As terras indígenas do Baú, do povo Kaiapó, em Novo Progresso também foram reduzidas em 350 mil hectares. Segundo Claudemir, o processo surge como um mecanismo para acabar com os conflitos.

Além da questão fundiária e de problemas com a educação, a saúde índígena é outro problema que vem se agravando em terras amazônidas. De um lado a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) tentando garantir recursos financeiros para a descentralização e implementação de ações emergenciais, de outro, uma proposta alternativa para minimizar os problemas da saúde. O Cimi vem colaborando com o resgate e o aprimoramento da saúde alternativa buscando recuperar a medicina tradicional com a colaboração dos pajés locais, respeitando os métodos de cura usados nas comunidades.

A Funasa, por sua vez, é responsável pelo atendimento à saúde das comunidades indígenas e de municípios com até 30 mil habitantes na área urbana, o que significa garantir atendimento a 88 dos 143 municípios do Pará. Este ano o órgão garantiu R$ 1,2 milhão para a construção de postos de saúde no Pará. Em 2004, um orçamento de R$ 1,3 milhão permitirá avançar com o saneamento básico através da construção de sanitários domiciliares e construção de microsistemas de abastecimento de água. Tais medidas acrescidas ao trabalho informativo e de vigilância epidemiológia visam diminuir a proliferação de doenças entre os índios.

Em 2003, recursos foram disponibilizados para a construção de dez postos de saúde e a reforma de outros três para que serviços médico, odontológico e ginecológico possam estar disponibilizados. Os postos das aldeias de Kikategê, Pykararanke, Kriketum e Gorotire foram inaugurados com a presença de técnicos da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e da coordenação regional do órgão no Pará. O restante está em fase de inauguração em pólos de maior concentração indígena.

Entre as doenças de maior incidência na comunidade indígena destacam-se a malária, dengue e outras sexualmente transmissíveis. As doenças acometem às populações devido a falta de saneamento básico e de água tratada e ao alto índice da influência branca.

Na contramão das informações da Funasa, o coordenador Elimar Araújo, da Funai, regional de Marabá, disse que recursos disponibilizados para a saúde dos povos indígenas não estão chegando na região. Para ele, os convênios não estão dando resultado. "Estão gastando muito com a contratação de profissionais terceirizados e não está sobrando recurso financeiro para garantir o fornecimento de medicamentos e para garantir a construção de postos de saúde", declarou Elimar.

Dados do IBGE apontam para a existência de 756 terras indígenas no Brasil

No Pará, existem 67 terras indígenas, destas, 17 são registradas, seis são homologadas, sete são declaradas, quatro são identificadas, três são reservadas, 20 terras estão sem providências e dez aguardam identificação. Nos Estados do Acre, Amazonas, Amapá, Goiás, Mato Grosso, Roraima, Rondônia, Tocantins e Pará existem 794 áreas indígenas, destas, 268 são registradas, 83, homologadas, 54 declaradas, 43 identificadas, 26 reservadas, 146 estão em fase de identificação e 174 encontram-se sem providências.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE, no Brasil possuem 756 terras indígenas identificadas. No Pará, na região de Santarém, ainda existem populações indígenas resistentes que estão emergindo e as terras estão em processo de reconhecimento. A lentidão em garantir políticas públicas voltadas para os povos indígenas está facilitando o avanço do processo de aculturação. Etnias correm sério risco de extinção.

Funai tenta convencer os invasores sobre a ilegalidade de ocupar aldeias

A Funai de Belém, responsável pelas áreas do Alto Rio Guamá, com 279.892 mil hectares; Nhamundá-Mapuera, com 1.049.520 milhão de hectares; Tembé, com 1.075 mil hectares; e a área Turé-Mariquita, com 334 hectares, se empenha na resolução dos problemas fundiários. Célia Valois, coordenadora da regional Belém da Funai, explicou que os posseiros são orientados sobre a impossibilidade da permanência em áreas que estão homologadas. "Eles têm ciência de que o decreto não será revertido. Nossa meta é garantir que as terras indígenas não sejam motivo de conflito", comentou.

Entre os conflitos que ocorreram no ano de 2003, destacaram-se as invasões das terras indígenas no Alto Rio Guamá, que compreendem as regiões dos municípios de Piriá e Capitão Poço. As terras pertencem as etnias dos Tembé, Guajajara e Kaapó. Os invasores foram os responsáveis pela devastação da área em função da retirada ilegal de madeira. O sistema ecológico ficou comprometido. Araras e outros pássaros desapareceram da região. O impasse em relação ao Alto Rio Guamá se arrastou desde a década de 70 e resultou no remanejamento de 230 famílias, que foram indenizadas pela Funai. Nas áreas que estão sob a jurisdição da Funai Belém habitam as etnias dos Tembés, Kaapós, Mapuera, Wai-Wai, Tirió, Watpxanã, Xeréu, Katuena, Kaxuwanã, Manawanã, Hixkaiana e os Timbiras.

Célia Valois afirmou que em 2004 continuará priorizando a desocupação de áreas pertencente aos povos indígenas. "Espero que neste ano, o governo federal avance no trato com a reforma agrária", ressaltou a coordenadora da regional Belém.

Christina Hayne

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.