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Aldeias abrigam plantação de maconha

Folha de S. Paulo-São Paulo-SP
Autor: Kamila Fernandes
15 de Mai de 2005

De acordo com a Polícia Federal, reservas de pelo menos quatro Estados cultivam e vendem a droga

Protegidas pela União, reservas indígenas de pelo menos quatro Estados -Maranhão, Pernambuco, Bahia e Pará- abrigam parte do plantio de maconha no Brasil, segundo a Polícia Federal. Ao visitar aldeias da região central do Maranhão, uma das regiões com maior incidência da droga no país segundo o órgão, a reportagem da Folha constatou que índios da etnia guajajara plantam e vendem a droga. Eles também a utilizam como entorpecente.

Para a Polícia Federal, o combate ao tráfico nessas regiões é mais difícil, pela própria condição especial do indígena, protegido pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e por organizações não-governamentais.

"A preocupação é ainda maior porque o não-índio procura as reservas por saber que ali ele tem uma segurança maior. Então, há um assédio para o índio plantar e vender, muitas vezes ao próprio traficante. Esse assédio nos preocupa e pode gerar violência", disse o delegado Ronaldo Urbano, coordenador-geral de Prevenção e Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal.

Para o cientista político Adriano Oliveira, da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), que estuda o tráfico de drogas na região do Polígono da Maconha, em Pernambuco, é "hipocrisia social" imaginar que o índio "é usado" por não-índios para plantar a maconha.

"É a mesma relação do não-índio, econômica. O índio sabe que a droga é muito mais lucrativa do que qualquer outra coisa e planta por isso", disse.

Lucro e miséria

Na região do Polígono, índios da etnia truká são acusados de plantar maconha em sua reserva, na ilha da Assunção, no rio São Francisco. Segundo a PF, a cada quilo de cebola, os índios ganham R$ 0,20. Com a mesma quantidade de maconha, chega a R$ 100.

Apesar dessa relação de lucro, nas aldeias da reserva Araribóia, em Arame (a 469 km de São Luís), há muita miséria. Mesmo onde a reportagem comprovou que há a comercialização da maconha, as casas são de taipa, cobertas de palha. Em outras, os índios admitiram apenas plantar para fumar. "Aqui a gente não vende para maluco, não. Só planta um pouco para fumar mesmo", disse o cacique Caetano Guajajara, 35, da aldeia Lago Branco. Próximo a ele, um outro índio, mais velho, fumava um cigarro de maconha. Na aldeia, uma escola está inacabada e não há energia elétrica.

Em outras aldeias dos guajajaras onde a Folha esteve, o assunto "maconha" é tido como um tabu. Quando perguntados sobre a existência da droga, mesmo que para uso medicinal, os índios começavam a falar entre si no dialeto local, incompreensível para a reportagem. "Tem lugar que até tem, mas aqui a gente não sabe de nada, não", diziam em seguida.

Estimativa

Além de Maranhão e Pernambuco, Urbano afirma que há maconha em reservas indígenas na Bahia e no Pará. A PF tem um mapa com esses locais, mas não faz uma estimativa de quantos hectares estão com a erva plantada. "Os índios misturam a maconha com outras culturas, para dificultar a visibilidade por helicóptero", disse o delegado Marcos Roberto dos Santos, da PF do Maranhão.

Em cada hectare de terra (um ha tem 10 mil m2), é possível plantar de 30 mil a 50 mil pés da planta, segundo ele. A última grande operação da PF nas aldeias indígenas do Estado foi em 2003, quando foram apreendidos 500 kg de maconha pronta e uma tonelada de maconha colhida. "Não pegamos mais porque fomos depois da colheita. Foi um problema de calendário", disse. A época da colheita, segundo ele, é entre o final de março e o início de abril.

No ano passado, em Arame, outros 700 mil pés de maconha e outros 500 kg da droga pronta foram encontrados em aldeias dos guajajaras, na região. Na ocasião, apenas um traficante, não-índio, foi preso. No Maranhão, Estado tido pela PF como o terceiro maior produtor de maconha no país (está atrás apenas de Pernambuco e Bahia), estima-se que 70% da droga esteja em terras indígenas.

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