VOLTAR

Ainda sem solução

CB, Brasil, p. 10
13 de Fev de 2008

Ainda sem solução
Três anos depois do assassinato da missionária Dorothy Stang, no Pará, um dos homens apontados como mandante do crime ainda não foi julgado. Manifestações pedindo justiça ocorreram ontem no estado

Hércules Barros

A impunidade é o principal catalisador da violência no campo. A avaliação é de religiosos, agricultores e membros de entidades de direitos humanos reunidos ontem no Pará em manifestações para lembrar os três anos da morte de Dorothy Stang, freira assassinada a tiros por defender o meio ambiente e os direitos dos trabalhadores rurais na região. Atos ecumênicos foram realizados em Belém e no município de Anapu, onde a missionária foi morta. Os manifestantes usaram a data para cobrar justiça e mais agilidade nos processos de reforma agrária.

Em Belém, pelo menos 600 pessoas se reuniram em frente ao Tribunal de Justiça e pediram o julgamento do fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, suspeito de ser um dos mandantes do crime. Ele ainda não foi julgado, pois seus advogados de defesa ingressaram com uma série de recursos na Justiça. "Três anos se passaram e a punição dos culpados está sendo empurrada com a barriga", afirma dom Erwin Krautler, bispo do Xingu, com sede em Altamira, a 140km de Anapu. Krautler lembra que a sensação de impunidade motiva a manutenção da violência. "Outras pessoas ameaçadas morreram depois da irmã Dorothy, mas os casos foram considerados acidentes. Quem vai saber?", questiona.

Dom Krautler presidiu a celebração em Anapu, onde cerca de 500 pessoas participaram de um encontro com representantes do Ministério Público e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A homenagem terminou em São Rafael, sítio onde Stang se reunia com os agricultores e local em que pediu para ser sepultada.

Segundo o frei dominicano Henri Burin des Roziers, assessor jurídico da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Xinguara, no sul do estado, o governo ignora os conflitos. Ele teme que a solução só venha depois de mais crimes. Levantamento da CPT mostra que há 207 pessoas marcadas para morrer no Brasil. Dessas, 143 encontram-se no Norte, sendo que a maioria dos casos (118) localiza-se no Pará. "A solução não é dar proteção, mas combater a impunidade. Espero que o Estado não deixe novas mortes acontecerem", diz.

Outro problema, segundo o religioso, é a falta de proteção a quem está ameaçado. Com a cabeça a prêmio, cotada a R$ 55 mil entre os pistoleiros, frei Henri conta com escolta policial 24 horas por dia desde o fim de 2007. Mas ele é uma exceção. "A situação é muito grave", reconhece Fernando Matos, coordenador do Programa Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. Na próxima semana, ele viaja para Belém para discutir a ampliação da rede protetora no estado. "Hoje, nosso parceiro é a Defensoria Pública. Porém, é necessária participação mais efetiva do Estado. Há 90 defensores solicitando proteção", conta.

Morte anunciada

Na década de 1980, a freira Dorothy Mae Stang saiu dos Estados Unidos para ser missionária no Pará. Destemida, dizia que seu trabalho era proteger o meio ambiente e os sem-terra de Anapu. A freira morreu no dia 12 de fevereiro de 2005, aos 74 anos, com seis tiros. No dia anterior, havia se reunido com os agricultores do assentamento Esperança para discutir as ameaças de morte que estavam recebendo.

Em junho de 2004, a missionária veio a Brasília denunciar irregularidades em Anapu a assessores do Ministério da Justiça. Dorothy também mandava cartas para as autoridades do estado, mas o governo só instalou a força-tarefa na região depois de sua morte.

Vitalmiro Bastos de Moura, o "Bida", foi condenado como mandante do crime a 30 anos de prisão e, com isso, ganhou direito a novo julgamento, ainda não marcado. Já o fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, o "Taradão", apontado também como mandante, ainda não foi julgado. Em dezembro do ano passado, o Tribunal de Justiça do Pará anulou o júri de Rayfran das Neves Sales, que havia sido condenado a 27 anos de prisão. Ele tem direito a novo julgamento. Os executores, Clodoaldo Carlos Batista e Amair Feijoli da Cunha, e Amair Cunha, acusado de ter intermediado o assassinato, foram todos julgados e condenados.

CB, 13/02/2008, Brasil, p. 10

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.