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Água para o Icuriã

Agência Acre de Notícias - http://www.agencia.ac.gov.br
Autor: Tatiana Campos
22 de Ago de 2011

Água tratada para as famílias do Icuriã. Seria essa mais uma notícia comum sobre uma ação de saneamento não fosse o Icuriã, esse lugar em que até o nome soa bonito, uma comunidade isolada na floresta, à beira do rio Iaco, dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes, em Assis Brasil. Chegar até lá só no verão, após um trabalho intenso de recuperação do ramal e, por segurança, em carro traçado.

No último sábado, data em que a comunidade comemorou com 27 horas de festa o aniversário de 33 anos da Associação do Icuriã, o Governo do Estado anunciou água tratada em todas as torneiras da comunidade. A primeira boa notícia veio dias antes, quando o Departamento de Pavimentação e Saneamento (Depasa) garantiu água para o evento.

"Nós tínhamos pensado em desistir de fazer o festival, porque era muito difícil atender todas as pessoas que participam, ter água pra fazer a comida. Quando é só a nossa comunidade a gente se vira, mas com mil pessoas nos visitando era uma tarefa muito difícil", disse Inês Batista de Araújo, uma das moradoras que ajuda a preparar as refeições.

Água, luz e ramal são os três elementos que dificultam a vida dos moradores do Icuriã e que aos poucos estão sendo solucionados pela dobradinha Governo do Estado e Governo Federal. O programa Luz para Todos, uma das mais importantes estratégias de inclusão social do Brasil, já chegou até a comunidade Divisão, que representa a metade do caminho até o Icuriã. O ramal de 70 quilômetros que liga a comunidade à Assis Brasil é reaberto todos os anos pelo Departamento de Estradas e Rodagens do Acre (Deracre), e a água tratada agora será abundante nas torneiras.

Investimento será de R$ 700 mil

"O governador Tião Viana tem o Icuriã como uma prioridade de Governo. Esse foi um pedido feito a ele durante a campanha e ele está atendendo aos sete meses de gestão. Há trinta dias nos reunimos com a comunidade e hoje viemos entregar o projeto de saneamento para que eles avaliem e aprovem", explica o diretor do Depasa, Gildo César. O projeto foi entregue a João Batista de Araújo, o Doka, um dos fundadores da Associação do Icuriã.

No próximo dia 17 a equipe do Depasa volta ao Icuriã, acompanhada por engenheiros, para rediscutir o plano. O investimento feito pelo Governo do Estado será de R$ 700 mil. A Estação de Tratamento de Água (ETA), já está licitada.

"Estamos montando um sistema completo de captação, tratamento e distribuição de água, com 3,5 quilômetros de rede, para atender 22 famílias no primeiro momento. O projeto prevê o crescimento da comunidade e a ampliação do atendimento até 100 famílias" disse Gildo César.

O chuveiro e o luxo - Água tratada nas torneiras é um luxo para quem mora na floresta. "É a primeira vez que vamos tomar banho de chuveiro aqui. A água caindo assim é uma benção. Pra gente é uma alegria muito grande, é um conforto. Facilita a vida. Evita carregar água, lavar a louça com a ajuda de um caneco, principalmente no festival, quando atendemos muitas pessoas. A vida agora vai ser uma maravilha aqui" disse a moradora Francisca Elínia de Araújo.

Para atender ao festival o Governo do Estado montou uma estrutura com duas caixas d'água de cinco mil litros cada uma, abastecidas por caminhão pipa que transportava água retirada da ETA de Assis Brasil. Segundo o diretor do Depasa, essa estrutura permanece na comunidade até que a solução definitiva esteja pronta.

Para entender o Icuriã

A comunidade que leva o nome do canto de um pássaro, segundo uma lenda indígena, era um entreposto de borracha. O seringal Icuriã hoje faz parte da Resex Chico Mendes, engloba cinco seringais, abriga 280 famílias e tem mais de 300 colocações, algumas desativadas. A comunidade Icuriã fica a 70 quilômetros do início da reserva, à beira do rio Iaco. Era a sede do seringal de mesmo nome, ao lado do seringal Guanabara.

"Aqui no Icuriã, como em toda essa região de beira de rio, não tem seringa nem castanha. Aqui era a sede, onde ficava o barracão, era aonde os seringueiros do Centro vinha trocar a borracha por mercadoria com o patrão, que era o José Badeco. Quando ele morreu os dois filhos não tinham experiência e não conseguiram dar conta da administração do seringal", explica João Doka.

Nesta época, para piorar a situação, vieram os sulistas se dizendo donos da terra. "Não tínhamos condições de ficar aqui sem um administrador que fosse buscar mercadoria na cidade, geralmente em Manaus, e vir vender aqui pra gente se manter. E ninguém tinha conhecimento de muita coisa, gente muito humilde, simples. Chega um cara do Sul dizendo que é o dono da terra que moramos a gente faz o quê?", conta o seringueiro.

A religião como elemento de unidade

Neste contexto vem a importância das missões de evangelização da igreja católica. As irmãs Silvia, enfermeira, e Inês, assistente social, vieram da Itália como missionárias leigas, voluntárias, dispostas a levar religião e organização social. Chegaram ao Icuriã em boa hora.

"Elas nos falaram sobre a associação e nos ajudaram a organizar o grupo. Na Itália as cooperativas são muito fortes, elas nos ensinaram isso. Foi como conseguimos comprar mercadoria na cidade, trazer pra vender aos seringueiros e produtores daqui. Não existia compra e venda, era na base da troca. Trocávamos a borracha por comida e outros produtos, estocávamos a borracha aqui até o fim do ano e levávamos pra vender em Sena Madureira", narra Doka.

A irmã Maria Poffo, da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas explica que até hoje a comunidade é católica. "Foi o que ajudou na organização da associação. As irmãs Inês e Silvia atenderam a comunidade por 24 anos e hoje moram na Itália".

A união que deu certo

Esse foi o início da Associação de Produtores e Extrativistas do Icuriã, há 33 anos. "No dia 19 de novembro chegaram as primeiras mercadorias, trazidas pelo padre Heitor, em um avião. Foi quando começou a nossa associação. Hoje a gente faz a festa em agosto porque vem muita gente da cidade, dos outros municípios e no inverno só chega aqui de barco. A gente aproveitou o ramal aberto pra festejar", explicou Francisca Elínia, moradora.

A Festa do Icuriã foi uma ideia do então prefeito de Assis Brasil, Manoel Batista de Araújo, o Manoelzinho, que julgou importante comemorar o aniversário da associação para manter viva a importância do associativismo para a comunidade. "São 27 horas de festa porque um dia já ficou pouco pra tanta programação. Ao invés de um festival de praia, onde só tem biquíni e cerveja, propus coisas mais culturais, como a cavalhada, futebol, culinária regional, corrida. E o melhor é que isso tudo ajuda a gerar renda", disse.

"Nós temos um carinho especial pelo Icuriã, esse lugar que mora nos nossos corações. A água é importante pra comunidade, assim como é o Luz para Todos, que a cada dia chega mais perto e a mais casas, como o ramal, que é melhorado, mas, o mais importante é essa relação de amizade, de família que temos aqui, e, acima de tudo, de respeito entre moradores, prefeitura, Governo do Estado", afirmou a prefeita de Assis Brasil, Eliane Gadelha.

A festa do Icuriã acontece há seis anos. "No governo do Jorge Viana tudo o que era velho foi renovado. Centro cultural, cozinha, escola, sala de som. Isso nos deu empolgação e estrutura pra comemorar. Agora vem o Tião Viana e se compromete a continuar nos ajudando, a reformar as estruturas. Nossa relação com eles é companheirismo. Quando o Jorge chegou aqui a cavalo, depois de três dias no ramal, ele foi recebido pela comunidade cantando Amigo de Fé, do Roberto Carlos", disse Manoelzinho.

Felicidade simples

O Icuriã é um desses lugares que parecem mágicos no Acre. Isolado no inverno, de difícil acesso no verão, plantado à beira do rio Iaco, cercado de verde, e que transpira paz.

"Aqui é um lugar abençoado. Você percebeu que as pessoas vivem isoladas da cidade, não tem tráfego no inverno, a luz ainda não chegou. Vivem apenas do que têm aqui na natureza e são extremamente felizes? O que faz esse povo feliz?" Foram essas as perguntas que a irmã Maria Poffo fez.

Se você chegar ao Icuriã e se sentir em casa, sem pressa de voltar, não estranhe. A beleza e a paz desse lugar no meio da Amazônia encantam mesmo quem o visita. A primeira imagem que se tem é vista do alto, quando o ramal deixa a floresta fechada e se abre entre o relevo do local para observar a comunidade ao fundo, lá embaixo.

Neiry Ferreira da Cunha tem 16 anos. Nasceu na cidade e mudou para a reserva extrativista aos 14. No começo ela não nega, sentiu falta da vida urbana. Mas hoje ela não troca o Icuriã por Assis Brasil ou outra cidade. "Eu sou mais feliz aqui!", afirma. Para a jovem o segredo da felicidade são os banhos de rio no Iaco, a atmosfera da floresta e os animais selvagens. Você pode ter a sorte de encontrar preguiças, tamanduás...

"Aqui eu tomo banho no rio a hora que eu quero e sentiria muita falta disso se saísse daqui. Eu descobri várias coisas boas que tem aqui e na cidade tem muitas dificuldades. Gosto de andar a cavalo, de sentir o vento. Eu sou mais feliz aqui", contou Neiry.

Ensino médio na floresta

Em 1999 o Acre ocupa o vergonhoso último lugar no ranking nacional da educação. Hoje está entre os dez primeiros. Há doze anos as sedes de municípios mais distantes como Marechal Taumaturgo, Porto Walter, Santa Rosa, Jordão e Assis Brasil, não oferecia ensino médio. Parece absurdo, mas os jovens repetiam várias vezes a 4 do ensino fundamental por falta de opção. A realidade mudou e hoje mesmo em meio a floresta, em áreas rurais isoladas e de difícil acesso, jovens e adultos podem continuar os estudos através de um programa de vanguarda: o Asas da Florestania. O ensino é feito por meio de módulos, ministrados por um único professor, com capacidade e treinamento para atuar em todas as disciplinas. O programa foi desenhado pelo ex-governador Binho Marques e atende milhares de jovens em todo o Estado.

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