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Agricultura orgânica

FSP, Dinheiro, p. B2
Autor: RODRIGUES, Roberto
08 de Dez de 2007

Agricultura orgânica

Roberto Rodrigues

Qualidade do alimento é hoje um assunto mais relevante do que foi a própria questão da segurança alimentar, grande desafio imposto à agricultura do século passado. A resposta dada pela ciência àquele desafio foi espetacular, e a oferta quantitativa de comida cresceu mais do que a demanda.
Hoje, temas ligados à saúde, à demografia, ao ambiente e às mudanças climáticas, às novas tecnologias e ao comércio mundial ensejam longas e pertinentes discussões sobre a segurança do alimento.
Nessas conversas, insere-se a disputa entre os alimentos produzidos pelo sistema tradicional, os transgênicos e os produtos orgânicos.
Às vezes, a paixão domina as discussões, tirando-lhes a lógica que sinaliza a coexistência pacífica dos três tipos de agricultura. Mas essa é a realidade: há espaço para tudo, e o consumidor bem informado, o grande vetor do mercado, determinará o crescimento desse ou daquele modelo.
De qualquer forma, o Brasil precisa olhar com mais atenção um importante segmento em evolução planetária: a agricultura orgânica. Em 2000, o mercado mundial desse setor mal superava a casa dos US$ 20 bilhões, o que já era um número impressionante. Mas, em 2010, a indústria internacional dos orgânicos deverá chegar bem perto de US$ 60 bilhões, um aumento espetacular em dez anos. Cerca de 5% do mercado de alimentos dos países desenvolvidos é de orgânicos e, tratando-se apenas dos hortifrutigrangeiros, chega a quatro vezes mais, em vários países.
Atualmente, a Europa move US$ 17 bilhões de orgânicos, e os EUA, 15.
Segundo a Ifoam, 31 milhões de hectares já foram convertidos para orgânicos em todo o mundo e 62 milhões são reconhecidos como extrativismo vegetal. No Brasil, ainda é relativamente pequeno o setor: calcula-se que tenhamos 800 mil hectares cultivados com orgânicos, em geral por pequenos produtos (seriam 15 mil!), e 5 milhões de hectares de extrativismo.
O que nos falta é uma clara regulamentação sobre a matéria, especialmente no que diz respeito à certificação dos orgânicos, para que haja seriedade no seu comércio. Em 23 de dezembro de 2003, o presidente da República sancionou a lei 10.831, dispondo sobre a agricultura orgânica. Nesse instrumento legal, as bases gerais foram estabelecidas; caracterizaram claramente a agricultura orgânica e seus objetivos.
A própria lei estabeleceu a necessidade de um regulamento. Para fazê-lo, foi criada em 2004 a Câmara Setorial da Agricultura Orgânica, composta por representantes da área e do governo, no âmbito do Ministério da Agricultura. Na reforma estrutural da pasta, no mesmo ano, foi criado um setor específico, a Coordenação de Agroecologia, que montou um vigoroso Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica, com linhas prioritárias bem definidas: manejo da biomassa verde e sistemas agroflorestais; manejo e controle sanitário alternativo; boas práticas de produção, colheita e industrialização; sistemas reguladores do comércio; planejamento, manejo e adequação ambiental de propriedade orgânica; e produção de material de propagação vegetal, reprodução animal orgânicos.
Depois de dois anos de discussões, a Câmara Setorial preparou um decreto, negociado entre as partes todas (inclusive os diferentes órgãos do governo), que, já assinado pelo ministro da Agricultura, aguarda assinatura de outros ministros para publicação. É essencial que isso ocorra logo. O Brasil não pode ficar na retaguarda de um mercado tão promissor e que, ademais, representa excelente alternativa ao pequeno produtor rural, tão carente de renda e de políticas adequadas.

Roberto Rodrigues, 65, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.

FSP, 08/12/2007, Dinheiro, p. B2

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