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40 novas espécies por dia

Veja, Ciência, p.106-107
01 de Jun de 2005

40 novas espécies por dia
O estudo da biodiversidade vive uma revolução - as descobertas de espécies se sucedem num ritmo vertiginoso

José Eduardo Barella

A biodiversidade do planeta está sendo desbravada a uma velocidade nunca vista. Os pesquisadores identificam e catalogam em média 15.000 novas espécies por ano. É o dobro do que se descobria no fim da década passada. O esforço dos cientistas para ampliar o conhecimento sobre os animais, os vegetais e os microrganismos que habitam a biosfera é uma corrida contra o tempo. Estima-se que a ação predatória do homem sobre o meio ambiente provoque a extinção de 10.000 espécies por ano. O preço a ser pago por essa perda de biodiversidade é alto: as plantas que desaparecem antes de ser estudadas, por exemplo, podem conter substâncias com utilidades farmacêuticas. E a extinção de certas bactérias prejudica a purificação natural da água ou a fixação de nutrientes no solo. "Para não desperdiçar o serviço que a natureza nos presta, é importante saber o que ela tem a nos oferecer, identificando e estudando o maior número possível de espécies", diz o zoólogo mineiro Gustavo Fonseca, diretor da ONG Conservação Internacional, um centro de estudos da biodiversidade com sede nos Estados Unidos. Ainda há muito a ser feito. Estima-se que falte identificar entre 80% e 90% de todas as espécies existentes.
Quanto menor o tamanho dos seres vivos, maior a ignorância da ciência sobre eles. Desde que o botânico sueco Carlos Lineu criou o atual sistema de classificação das espécies, foram identificados apenas 0,4% das bactérias, 1% dos vírus, 5% dos fungos e 10% dos insetos da Terra. E é justamente nessas categorias que se concentram as maiores esperanças para descobrir a cura de doenças e combater pragas na agricultura. A grande maioria das novas espécies descobertas a cada ano é composta de insetos e microrganismos, justamente por representarem um mundo praticamente desconhecido para o homem. Já a identificação de novas espécies de mamíferos é mais rara. Quando isso ocorre, em média uma vez a cada três anos, o feito é comemorado com estardalhaço pela comunidade científica internacional. Foi o que aconteceu na semana passada, quando duas equipes de cientistas americanos publicaram na revista científica Science a descoberta, na Tanzânia, na África, de uma espécie de macaco. O surgimento de novos tipos de pássaros também é uma raridade. Por ano, são identificadas quinze novas espécies. No início do mês, o biólogo Luís Fábio Silveira, da Universidade de São Paulo, divulgou a identificação de um novo pássaro, batizado de bicudinho-do-brejo-paulista, perto de uma represa da Grande São Paulo.
O trabalho dos biólogos foi facilitado nos últimos anos pelo avanço de tecnologias como a internet e o estudo do genoma, a identidade genética dos seres vivos. Trata-se de uma revolução na taxonomia, o ramo da ciência que cuida da classificação das espécies. Até a metade da década de 90, o pesquisador se enfiava no mato, no mar ou em qualquer outro ambiente natural para fazer a coleta de material de estudo - bichos, plantas ou microrganismos. Esse trabalho de explorador ainda é necessário. A diferença está no que acontece depois. O cientista de dez anos atrás tinha de passar vários meses, às vezes anos, enfurnado em um laboratório. Era preciso estudar em detalhes as características e a forma da espécie encontrada e compará-las com as de exemplares que, muitas vezes, só existiam nas prateleiras de museus ou universidades estrangeiras. Os pesquisadores tinham de pedir informações por correio ou viajavam até onde estavam as coleções para fazer a comparação. Hoje, o processo é mais rápido, barato e eficiente. Museus e instituições científicas estão fotografando seus acervos com equipamentos que fazem imagens em três dimensões e divulgando tudo na internet. Em qualquer parte do mundo, um taxonomista pode vasculhar os bancos de dados de espécies on-line e compará-las com o exemplar que está estudando. "Em breve, teremos o equivalente a uma lista telefônica on-line de todas as espécies já catalogadas no mundo", diz o microbiologista paulista Vanderlei Perez Canhos, diretor do Catálogo da Vida, um projeto formado por instituições de cinqüenta países para a criação de um inventário completo da biodiversidade mundial. Ao lado da tecnologia de imagens digitais, a genética deverá permitir aos cientistas quadruplicar em dois anos o número de espécies identificadas anualmente. Um teste de DNA - uma ferramenta científica cada vez mais barata - da amostra pesquisada é capaz de confirmar, com precisão, a descoberta ou não de uma nova espécie. O biólogo americano Edward Wilson, da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, acredita que, com o auxílio da tecnologia digital e da genética, todos os seres vivos existentes na Terra serão classificados até 2030. Todos.

Veja, 01/06/2005, Ciência, p. 106-107

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