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20 anos de Eco92: Demarcações de terras indígenas avançam com acordos internacionais

Eco Agência - http://www.ecoagencia.com.br
Autor: Viviane Monteiro
12 de Jun de 2012

Avanço no reconhecimento de reservas indígenas garante preservação da Amazônia.

Decisivas na preservação e conservação da biodiversidade, as homologações de terras indígenas avançaram nos últimos 20 anos no Brasil em meio à competição com as áreas destinadas à agricultura nacional. Foram homologadas e ratificadas 51, 246 milhões de hectares de terras indígenas de 1995 a 2001, o equivalente a 12,5% do território nacional ou algo em torno de 22% da superfície da Amazônia, revela a Fundação Nacional do Índio (Funai). A maioria desse processo ocorreu na década de 1990 sob os efeitos dos acordos de cooperação fechados durante a Eco-92 e pelas legislações assinadas em anos anteriores.

Os dados serão apresentados pela Funai no ciclo de conferência Rio +20, entre 13 e 22 de junho, no Rio de Janeiro. "Vamos mostrar que a conquista da posse e da plena gestão das terras pelos índios, 20 anos depois da Eco-92, é um fato novo e está intimamente ligado a conservação ambiental. Graças a isso a Amazônia está sendo preservada", disse a diretora de Proteção Territorial da Funai, Maria Auxiliadora de Sá Leão, em entrevista ao Jornal da Ciência.

Pacote de bondades - Às vésperas da Conferência Rio+20, a presidente Dilma Rousseff assinou a homologação de quase 1 milhão de hectares em terras indígenas, que integra um pacote de "bondades" que marcou o Dia Mundial do Meio Ambiente, no dia 5 de junho. Foram sete terras indígenas, das quais cinco no Amazonas, uma no Pará e uma no Acre. Delimitadas pela Funai, as terras são declaradas pelo Ministro da Justiça e ratificadas pela Presidência da República.

Dilma assinou também o Decreto 7.747/2012 que instituiu a Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (PNGATI) e criou o Comitê de Gestão Integrada das Ações de Atenção à Saúde e de Segurança Alimentar para a População Indígena. Sob a coordenação da Casa Civil, o Comitê tem a participação da Defesa Nacional, Funai, Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) e Ministério do Desenvolvimento Social.

População indígena - A diretora da Funai também considera positivo o aumento da população indígena que quase triplicou nas últimas duas décadas - eram 294,130 mil índios no Brasil em 1991, número que atingiu 817,963 mil em 2010, o equivalente a 0,42% da população nacional. A diretora-executiva do Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual (Inbrapi), Fernanda Kaingáng, atribui o crescimento da população indígena à mudança de medição dos pesquisadores do IBGE que, segundo ela avalia, passaram a incluir na metodologia também os índios que não moram em aldeias.

Ponto de partida - O auge das demarcações dessas terras ocorreu na década de 1990 refletindo os acordos de cooperação fechados durante a Eco-92 entre os governos do Brasil e da Alemanha e o Banco Mundial, no âmbito do Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL), criado para melhorar a qualidade de vida das populações indígenas e promover a conservação de seus recursos naturais.

No decorrer da Eco-92, afirma Maria Auxiliadora, a Funai apresentou ao governo alemão um cadastro com o registro de 144 terras indígenas estudadas há anos por antropólogos, as quais precisavam de recursos financeiros para serem reconhecidas. Na ocasião, o governo alemão considerou a iniciativa pertinente à proteção das florestas, principalmente da Amazônia. Os estudos das terras indígenas são embasados no Decreto 76.999 de janeiro de 1976 - a primeira legislação criada para normatizar o procedimento administrativo para o reconhecimento das terras indígenas -, na Constituição de 1988 e no Estatuto do Índio de 19 de dezembro de 1973.

Investimentos - Segundo dados da Funai, o governo alemão investiu ao longo de 11 anos (1996 a 2007) US$ 16,6 milhões no PPTAL, o equivalente a 76% dos US$ 21 milhões aplicados no projeto. Pelo acordo, o Banco Mundial entrou com uma parcela de US$ 2,1 milhões e o Brasil, como contrapartida, com US$ 2,2 milhões. Com o apoio financeiro, foram homologadas e ratificadas 139 terras indígenas que correspondem a 12,5% do território nacional.

Tal iniciativa foi considerada uma oportunidade singular para a população indígena brasileira, já que a Funai não tinha recursos orçamentários suficientes para demarcar as terras estudadas, embora houvesse uma luta interna e um corpo de profissionais lutando pelos direitos indígenas. "Tudo só foi possível porque as terras já estavam estudadas", lembra Maria Auxiliadora. Do total das terras estudadas no passado, restou apenas para os anos seguintes o reconhecimento de terras menores e aquelas "que ninguém quis mexer", como as demarcadas no período de 1910 e de 1920 pelo Marechal Rondon, quando a territorialidade e a cultura indígena ainda não eram reconhecidas.

Áreas da Amazônia - Na ocasião, segundo a diretora da Funai, foram demarcadas e homologadas grandes extensões de terras, dentre as quais as de Alto Rio Negro, o equivalente a 8 milhões de hectares pertencentes aos índios Arapáso, Barasána, Baré, Karapanã, Suriána e Wanana. A região é considerada uma das maiores bacias de águas pretas do mundo e uma das mais importantes da Amazônia. Foram reconhecidos também 8,544 milhões de hectares no Vale do Javari, de grupos como Kanamari, Kulina, Matís e Mayoruna, região que detém uma das maiores concentrações de grupos isolados da Amazônia e do mundo de diferentes etnias. Modelo internacional - Com o acordo, o PPTAL passou a integrar o chamado PPG7 (Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais do Brasil), originado em 1990, durante uma reunião em Houston, pelo chamado Grupo dos Sete, integrado pela Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.

Processos ativos - Hoje estão em andamento mais de 100 novos processos que englobam terras estudadas ou em processo de estudo, sob a análise antropológica ou contestação pós-delimitação, que devem refletir no aumento de homologações nos próximos cinco anos. Existem também quase 400 novas reivindicações em andamento. "Ainda temos muitas terras invadidas e ocupadas por terceiros. Precisamos cada vez mais desocupar essas terras, com o trabalho da Funai, para que os índios tenham plena posse de seus territórios", disse Maria Auxiliadora.

Apenas em São Paulo, existem pelo menos 15,969 mil hectares em processo de estudo; além de 29 mil hectares demarcados recentemente no Araguaia - de povos que foram praticamente extintos no governo militar por um fazendeiro que ficou com essas terras. "Estamos retomando e reconhecendo. Para esse povo que perdeu parte significativa de seu território, 29 mil hectares são importantes para eles", defende a dirigente da Funai.

Novo acordo com Alemanha - Em um reconhecimento ao sucesso obtido na conservação da Amazônia no programa anterior, o governo alemão, mesmo diante da crise econômica na Europa, negocia um novo acordo com o Brasil. Em andamento, ele se insere na gestão ambiental e territorial dos povos indígenas. Para Maria Auxiliadora, a prioridade dos índios é tornar-se um povo independente. "Estamos trabalhando no âmbito da gestão territorial e ambiental dos índios. Acho que isso é um norte para esses povos. Se há condições de ter o domínio, a plena posse e plena ocupação, eles têm condições de ser uma população com autonomia, que se complementa ao conhecimento e à cultura própria", afirma a dirigente da Funai.

Sem detalhar o novo acordo, ela declarou que o acordo integra o programa de demarcação de terras indígenas da Funai previsto no PPA (Plano Plurianual), intitulado Proteção e Promoção aos Direitos dos Povos Indígenas.

Sucateamento - Apesar de ser responsável por quase 13% do território nacional, a Funai permanece carente de recursos orçamentários para manter a política de proteção aos direitos indígenas, iniciativa que vem sendo atendida pelos projetos de cooperação internacionais. A partir do início da década de 2000, depois do auge das demarcações de terras indígenas, houve uma acomodação decorrente do fim de estoque de terras estudadas, dos impactos do Decreto 1.775 que mudou as regras e aumentou o prazo do processo de análises de demarcação e ratificação, além da redução do quadro de funcionários da Funai, como pesquisadores e antropólogos. "Os estudos foram reduzidos, até pelo sucateamento da própria instituição, mas o importante é mostrar que no governo Lula houve reconhecimento dos Direitos Indígenas", disse.

Até agora o órgão não conseguiu recompor o quadro de funcionários existente desde a década de 1980, quando o órgão possuía cerca de 6 mil funcionários. Hoje o número gira em torno de 3 mil. Em meados de 2007, por exemplo, a Funai possuía apenas quatro antropólogos para identificar as terras, o que interferiu no processo de delimitação, no número de terras declaradas e, igualmente, ratificadas. "A Funai ficou sem fazer concurso público por mais de dez anos. Houve um em 2004, basicamente para Brasília, insuficiente para repor o quadro de funcionários. Por isso, diminuímos o ritmo", afirmou.

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