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WEF anuncia registro de carbono em Milão

GM, Saneamento & Meio Ambiente, p. A9
10 de Dez de 2003

WEF anuncia registro de carbono em Milão
Nove empresas já aderiram à novidade, entre elas a Lafarge, com filial no Brasil, e a RAO, da Rússia.

O Global GHG

Register - registro global que visa dar maior transparência às ações voluntárias de empresas que emitem gases de efeito estufa e que investem no mercado de seqüestro de carbono - foi anunciado ontem, em Milão, pelo World Economic Forum (WEF). Nove empresas já aderiram ao registro, entre elas a Lafarge (cimentos, da França) e a RAO (companhia que detém 75% da geração e distribuição de energia da Rússia). As empresas RWE, da Alemanha, a Cemex, do México, a Scottish Power e a Anglo American, do Reino Unido, e a Vattenfall, da Suécia, também já teriam aderido ao novo registro.
João Carlos Veríssimo, presidente executivo da BrasilConnects, uma das oito parceiras do WEF no Global GHG Register, disse, ontem, que até março de 2004, o objetivo é atingir 30 empresas globais. As nove que já aderiram representam 800 milhões de toneladas de gás carbônico, ou 5% da previsão de redução anual equivalente às metas previstas no Protocolo de Quioto.
Veríssimo, que participou de um dos painéis relacionados com o GHG Register, durante a 9 conferência das partes da Convenção-Quadro sobre Mudanças do Clima, em Milão, explica que a Lafarge, por exemplo, que planeja investir na substituição de seus atuais equipamentos de produção de cimentos, em sete anos, poderá, enquanto isso, comprar certificados de despoluição da Plantar S.A. (empresa de reflorestamento brasileira) para começar a reduzir suas metas de emissão de carbono.
Plantar e Santa Elisa
Em entrevista a este jornal, Geraldo Bernardo Moura, da Plantar, explica que a empresa está desenvolvendo o Projeto Plantar de Créditos de Carbono, de substituição energética, que tem como objetivo a redução da emissão de gases de efeito estufa utilizando combustível renovável (carvão vegetal) na indústria siderúrgica. O projeto visa reverter a tendência de utilização do combustível fóssil (carvão mineral) no setor siderúrgico nacional. Segundo Moura, é uma parceria entre a Plantar e o Fundo Protótipo de Carbono - Prototype Carbon Fund - PCF - do Banco Mundial.
"Esperamos que o Global GHG Register do WEF contribua para a integração do mercado e a divulgação dos projetos de carbono e seja um canal de ligação entre países e/ou empresas compradoras e proponentes de projetos", comenta Moura. Ele acredita, também, que a BrasilConnects atuará como "entidade aglutinadora de projetos brasileiros que têm potencial comercial no mercado mundial de créditos de carbono".
Para Octavio Quartim, diretor financeiro da Cia. Energética Santa Elisa, "a iniciativa do World Economic Forum, à qual a BrasilConnects é associada, é pioneira e elogiável, pois facilitará a implantação do Mecanismo de Desenvolvi-mento Limpo (MDL, do Protocolo de Quioto)". Quartim lembra que, se a Rússia não ratificar Quioto e o Protocolo não entrar em vigor, "o futuro será desenhado por iniciativas nacionais e/ou regionais, como já fez a Califórnia e estão fazendo alguns países europeus, notadamente escandinavos e holandeses".
Por essas iniciativas, lembra o executivo, "os países resolvem aprovar legislações internas que obrigam a redução das emissões em níveis estabelecidos internamente em cada país. Caso empresas ou Estados emissores de GHG (gases que causam o efeito estufa, na sigla em inglês) não consigam atingir esta meta e seja permitida a aquisição de créditos de emissões de outros locais, cria-se um mecanismo igual ao MDL". Para Quartim, "é imprescindível a criação de uma entidade de registro destes créditos, como é a iniciativa do World Economic Forum".
A Santa Elisa já está operando desde maio deste ano o projeto denominado "Santa Elisa Bagasse Cogeneration", de cogeração de energia a partir do bagaço de cana. O principal investimento foi a construção de uma nova caldeira (a maior do mundo no setor), que foi inaugurada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2 de maio. A caldeira, construída com tecnologia nacional, tem capacidade para produzir 200 toneladas de vapor por hora a 520o C, com 65 quilos de pressão, o que permitiu à Santa Elisa melhorar sua eficiência na queima do bagaço e, com isso, aumentar a cogeração de energia de 5 MWh para 30 MWh. O investimento total foi de US$ 50 milhões, dos quais US$ 35 milhões financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Segundo Quartim, a venda de energia está garantida por um contrato de 10 anos com a CPFL . O projeto de MDL gerará até 850 mil toneladas de carbono equivalente ou créditos de carbono, num primeiro período de sete anos. "Estamos em negociação com investidores europeus (para vender certificados de despoluição). A Santa Elisa foi pioneira, tanto que já recebeu certificado de pré-validação de seu projeto, concedido pela auditoria alemã TÜV, em agosto passado", informa o diretor financeiro.
O que é o registro
"O registro é uma certa chancela porque é feito com base em uma metodologia que foi desenhada pelo World Resources Institute e pelo World Business Council for Sustainable Development. São duas entidades que se juntaram e fizeram uma metodologia, que será usada para filtrar as empresas que vão entrar no registro. Uma metodologia semelhante está sendo desenvolvida para os projetos chamados MDL (mecanismo de desenvolvimento limpo)", lembra Jacques Marcovitch, professor da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em questões ambientais, que participa da conferência em Milão. Essa metodologia criada pelas parceiras do WEF foi apresentada em Milão e, a partir do ano que vem, as empresas como Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), se quiserem entrar no módulo MDL, terão de atravessar o filtro dessa metodologia, observa Marcovitch. "O registro passa a ser uma forma de separar o joio do trigo", acrescenta."Um pouco a montante do registro, existe um enorme universo de empresas, algumas mais ou menos envolvidas na redução de gás de efeito estufa", explica. Segundo Marcovitch, "as coisas continuam a jusante. Na hora em que você tiver as mil empresas do WEF (as que contribuem financeiramente para a entidade), entidades multilaterais e os projetos brasileiros, uma etapa será construída. Existem as empresas com recursos, as empresas que têm demanda, como a Santa Elisa e a Balbo, e as empresas globais que podem chegar à conclusão de que sairá mais barato investir no Brasil do que limpar o seu meio ambiente lá".
Para Marcovitch, "o mercado começa a surgir. Mas não será o registro que fará o acerto entre a oferta e a procura; ele aproximará. Em algum momento, outros mecanismos, como fundos, poderão surgir a jusante e se utilizarão dessa informação crível para poder gerar atração de recursos, no caso, no Brasil".
O papel do registro é, assim, o de dar visibilidade, credibilidade aos projetos . O registro será feito pelo WEF com as entidades parceiras, entre elas a BrasilConnects. As demais são Deloitte Touche Tohmatsu (Reino Unido), International Emissions Trading Association - IETA - (Canadá), World Energy Council (Reino Unido), Pew Center (EUA), World Business Council for Sustainable Development (Suíça), World Resources Institute (EUA) e World Wide Fund - WWF (EUA).

Organizar o mercado
Com o WEF, a parceria da BrasilConnects é no sentido de organizar o mercado das empresas que já têm hoje o certificado de carbono ou têm a possibilidade de emiti-lo, diz João Carlos Veríssimo. O WEF organizará os registros dos emissores de poluição e a BrasilConnects organizará os registros dos certificados limpos.
De acordo com Marcovitch, há várias empresas brasileiras engajadas em projetos potencialmente elegíveis para o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, entre elas: Usina Piratini, que vendeu experimentalmente certificados ao governo do Canadá; Companhia Açucareira Vale do Rosário, de Morro Agudo, que está realizando um projeto que deve gerar mais de 645 mil toneladas de CO2 em sete anos; Nova Gerar joint-venture com a Ecosecurities, que negociou com o governo da Holanda 5 milhões de toneladas de CO2; Balbo, de Ribeirão Preto; e Orsa Florestal/Jari Celulose, que está na fase inicial de um projeto que pretende absorver 5,59 milhões de toneladas de CO2 em dez anos.
No ano que vem, grandes empresas, como a Cia. Vale do Rio Doce, CST e Petrobras, deverão começar a pensar no assunto do MDL e mercado de carbono, na opinião de Marcovitch.
Papel da BM&F
Para João Carlos Veríssimo, a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), que fez um estudo para avaliar a viabilidade de um mercado secundário de créditos de carbono, "deu um excelente passo". O ponto deles é muito mais formal em termos de mercado financeiro. A BM&F tem que ter uma regulamentação da CVM, do Banco Central, para poder transformar os certificados (de crédito de carbono), que hoje são papéis fora do mercado financeiro, em papéis que possam ser transacionados por meio do mercado financeiro. A grande vantagem é que você dá liquidez para o papel, transforma-o em um papel de investimento e, com isso, você acaba tendo uma rede de distribuição mundial".
Do ponto de vista dos investimentos que vierem para cá, como serão canalizados para os projetos? Segundo Veríssimo, "é como se fosse uma ação; na medida em que você emite uma ação da sua empresa e ela vai para a bolsa, quem compra pagou para você, que emitiu a ação".
Esse mecanismo que a BM&F pretende criar - ainda falta a regulamentação governamental - tem como grande vantagem a distribuição dos papéis para o mundo inteiro, diz o presidente executivo da BrasilConnects.

GM, 10/12/2003, Saneamento & Meio Ambiente, p. 9

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