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Wai Wai deve R$ 3 milhões

Lúcio Flavio Pinto - http://www.lucioflaviopinto.wordpress.com
Autor: Lúcio Flavio Pinto
18 de Mar de 2015

Timoteo Tayatasi Wai Wai está sendo executado pela justiça por uma dívida de quase três milhões de reais junto ao Ibama. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis autuou Timoteo quando ele transportava artesanato "confeccionado com sub-produto da fauna silvestre". No caso, eram penas de arara e papagaio.

São aves da família dos "psitasidios", proclama a certidão da dívida ativa da Procuradoria Geral da União, no valor originário de 75 mil reais. Por não ter autorização para a comercialização das peças, Timoteo cometeu infração ambiental e foi autuado.

A dívida venceu em 15 de outubro de 2013. Como não foi quitada, aos 75 mil reais foram acrescentados R$ 1,5 milhão de majoração, agravamento e amortização; R$ 706 mil de taxa Selic; R$ 297 mil de multa moratória, e R$ 497 mil de encargo legal. O valor consolidado da dívida ficou em R$ 2.985.517,18. Mas ainda pode crescer até o fim do processo.

Na execução fiscal, o Ibama tratou logo de pedir o arresto prévio de valores existentes em contas bancárias de Timóteo ou seus responsáveis, "a fim de evitar possível desfazimento de bens ou valores em depósito de instituições financeiras após a citação", o que caracterizaria fraude ao credor.

Acolhendo o requerimento, em novembro do ano passado, o juiz da vara única de Oriximiná, Daniel Ribeiro Dacier Lobato, instruiu o oficial de justiça a fazer penhora dos bens do devedor, "procedendo desde logo à avaliação, devendo o valor constar do termo ou auto de penhora".

Três semanas depois do despacho do juiz, o oficial de justiça Humberto de Sousa Sarubi Júnior cumpriu o mandado, intimando pessoalmente Timoteo. Mas deixou de proceder à penhora dos seus bens porque o executado só tinha um, a casa em que mora com a família, toda de índios como ele, construção que o oficial de justiça avaliou em 15 mil reais.

Os "bens de maior monta que guarneciam a casa" eram um aparelho de televisão, uma geladeira pequena, um fogão, uma mesa pequena com cadeiras de madeira, duas camas, um micro sistem e uma cômoda de modulado. O oficial de justiça não encontrou no imóvel "automóveis, motocicletas ou bicicletas".

Timoteo é índio da tribo dos wai wai (não confundir com a escola de samba de São Paulo, do mesmo nome, mas de muito mais posses). Ele mora com sua família, todos eles também indígenas, na travessa Piquiá, "ao lado do no 55, bairro de São José", na cidade de Oriximiná, no oeste do Pará, conforme a meticulosa certidão de Sarubi Júnior.

A milionária ação de execução fiscal contra o índio, de um grupo que só estabeleceu contato definitivo com a sociedade nacional há meio século, se baseou numa sumária certidão da dívida. O documento deu o valor original à infração ambiental, sem sequer mencionar quantas peças de artesanato Timoteo Taytasi carregava, que o agente do Ibama avaliou em nada menos do que 75 mil reais.

Além de não ter bens de significação para dar em garantia aos quase R$ 3 milhões da dívida que lhe foi atribuída, nem contas bancárias, dentro ou fora do país (ao contrário dos corruptos e corruptores do "petrolão"), Timoteo, por ser índio, tem um tutor. É a Funai, a Fundação Nacional do Índio, que não foi citada nenhuma vez nas peças do processo.

Esses autos certamente entrarão para a história contemporânea da combinação de burocracia oficial com os povos mais antigos do Brasil, costumando resultar em casos escabrosos ou inacreditáveis.

https://lucioflaviopinto.wordpress.com/2015/03/18/wai-wai-deve-r-3-milh…

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