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Vidas secas

Planeta Sustentável - http://planetasustentavel.abril.com.br
01 de Mai de 2015

Vidas secas
Se a água acabar, tudo vai mudar no dia a dia de São Paulo. Inclusive coisas que não têm nada a ver com banho

Ricardo Lacerda, Andreas Müller e Robson Pandolfi - Superinteressante - 05/2015

Entre fevereiro e dezembro de 2014, a simpática Itu, a 100 km de São Paulo, ficou um pouco menos simpática. Durante esse tempo, a cidade viveu um racionamento forte: a água era liberada à população dia sim, dia não. Itu virou de pernas pro ar. Houve brigas, assaltos, protestos violentos e até sequestro de caminhões-pipa.

A seca assombra boa parte do país. Já rondou o Rio e Minas Gerais, mas é São Paulo que está na pior situação. Um estudo do banco Itaú estima a probabilidade de um racionamento de água, que deverá durar pelo menos seis meses, em 75%. "Se houver, vai ter que ser grande", diz Marussia Whately, diretora do projeto Água São Paulo, do Instituto Socioambiental (ISA). A possibilidade mais dura, admitida pela diretoria da própria Sabesp, é o temível rodízio 5x2: a cada semana, cinco dias sem água e apenas dois com. Não é difícil imaginar como isso transformaria (e transtornaria) o dia a dia das pessoas. Mas as consequências iriam bem além.

CHOQUE NA ROTINA
Se as torneiras secarem, os primeiros afetados serão os trabalhadores. Não só porque ficarão sem água; também podem perder o emprego. Segundo o estudo do Itaú, o racionamento de água e de energia (pois as represas que abastecem nossas hidrelétricas estão com níveis baixos) previsto para o ano deve fazer o PIB brasileiro cair 0,6% - além do 0,5% negativo previsto devido a outros problemas na economia. Ou seja: recessão de 1,1%. Menos atividade econômica significa menos empregos. Um levantamento feito pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) em 438 empresas mostra que 42% delas pretendem demitir caso a situação não melhore. Segundo a Fiesp, mais da metade da indústria paulista não tem nenhuma fonte alternativa de água. Havendo um racionamento 5x2 durante seis meses, a produção da indústria paulista - que foi de R$ 288,6 bilhões no ano passado - cairia quase 20%.

Logo no início do racionamento, também haverá uma corrida aos caminhões-pipa. Itu que o diga: na fase mais aguda da crise, a cidade tinha 56 veículos circulando diariamente, e cada um carregava em média 20 mil litros de água por viagem. Se cada caminhão conseguir fazer três entregas diárias, dá 3,3 milhões de litros. Só que Itu tem 160 mil habitantes, enquanto São Paulo soma quase 12 milhões. Ou seja: para gerar o mínimo de alívio, precisaríamos de pelo menos 4.200 caminhões-pipa. É muito mais do que a frota atual da cidade, que conta com cerca de 650 desses veículos. Com tantos caminhões na rua, o trânsito ficaria ainda mais caótico. "Seria necessário um plano enorme de logística, com o fechamento de avenidas para o comboio passar", observa Marussia. A Prefeitura de São Paulo já está tentando facilitar a distribuição de água: recentemente, os caminhões-pipa foram autorizados a entrar no centro da cidade a qualquer hora do dia - antes, só podiam circular depois das 10 da noite. Mesmo se houver caminhões suficientes, e eles conseguirem chegar aonde forem chamados, a solução vai custar caro.

Em São Paulo, o preço de um caminhão-pipa já subiu de R$ 500 para R$ 1.200. Mas pode ir bem mais alto. No Rio de Janeiro, onde alguns bairros da zona oeste ficaram sem abastecimento, devido a obras na tubulação de água, o preço de um caminhão chegou a R$ 3.500 - e com fila de espera de 24 horas. Suponha que você more num prédio com 60 apartamentos, onde moram 150 pessoas ao todo. Nesse cenário, a carga de um caminhão-pipa duraria apenas um dia. Se o condomínio chamar dez caminhões por mês, só para dar uma aliviada, estamos falando de R$ 35 mil - quase R$ 600 a mais no condomínio de cada apartamento.

Desde fevereiro, a Sabesp já está cobrando mais caro pela água, com multas que podem até dobrar a conta mensal. Mas, no efeito dominó da crise hídrica, os preços de outras coisas também devem subir de modo generalizado. A começar pelos alimentos. De acordo com a Associação Paulista de Supermercados (Apas), em janeiro o preço da batata subiu 60%. Frutas, legumes e verduras estão, em média, 16% mais caros. Na Ceagesp, o quilo do chuchu saltou de R$ 1, em novembro, para R$ 4, em janeiro. A explicação é simples: como está chovendo bem menos, a produtividade da hortaliça despencou, caindo de 20 para 5 toneladas por hectare por mês.
Na Califórnia, em 2013, choveu muito pouco.

Planeta Sustentável, Maio, 2015

http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/ambiente/vidas-secas-sup…

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