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Vice de Boulos, Sônia Guajajara explica pauta indígena e candidatura

Jornal GGN https://jornalggn.com.br/
14 de Mai de 2018

O portal Sul21 publicou uma entrevista exclusiva com Sônia Guajajara, a primeira pessoa indígena a entrar numa corrida presidencial. Apesar de fazer história, Sônia, vice de Boulos, conta que não é a primeira vez que um indígena disputa a eleição para um cargo institucional. Ela explica como se deu a articulação de uma frente de indígenas candidatos em todo o País, junto à movimentos de esquerda. Também fala da pauta, das políticias sociais voltadas para o segmento e avalia o impacto do golpe e ascensão do governo Temer sobre órgãos como a Funai.

O GGN selecionou alguns trechos e disponibilizou o link para a entrevista completa, no Sul21, abaixo.

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Sul21: Tu és também uma das articuladoras da frente que pretende eleger ao menos um indígena em cada estado do país. Como nasceu essa ideia?

Sonia: O que mais me influenciou a entrar para essa vida da política partidária foi exatamente a sub-representatividade. A gente não tem ninguém no Congresso Nacional, teve um único parlamentar, que foi o Mário Juruna (PDT), há mais de 30 anos. Não é que estamos começando agora, mas estamos tentando intensificar a participação. Todos os anos temos representantes indígenas na disputa, só que cada um entrava da sua forma, com seus próprios meios. Agora, o movimento indígena resolveu apoiar essas candidaturas, no sentido de dar visibilidade e um sentido para isso. A gente precisa ter uma frente com o mínimo de entendimento sobre as nossas demandas, que tenha compromisso firmado com as causas, qualquer um, independente de onde esteja, de qual estado ou partido. Estamos tentando articular isso, estamos criando uma plataforma para articular essas propostas, para que todos os indígenas e todas as pessoas que atuam com a causa indígena possam contribuir. Vai ser um site, que inicialmente vai se chamar "518 anos depois". A gente sabe que não vai ser fácil, que vai ser um desafio gigante. Primeiro, porque somente o eleitorado indígena não elege em lugar nenhum, em nenhum dos estados consegue alcançar o coeficiente eleitoral. Segundo, esses partidos que a gente está, de esquerda, o coeficiente de eleitores é muito maior e os que estão em partidos que não são de esquerda, não tem espaço e não são prioridade dentro do partido, para ter condições de fazer uma campanha. Terceiro, a gente não quer repetir essa forma de fazer política a partir dos agrados.

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Sul21: O que tu acha da maneira que o Estado se articula em políticas públicas para as populações indígenas?

Sonia: A gente teve várias construções de políticas públicas com a nossa participação. A gente conseguiu ser protagonista, por exemplo, da criação da Sesai - Secretaria de Saúde Indígena. Ela é fruto da articulação do movimento indígena, foi a gente que foi para cima e lutou para tê-la. A PNGATI (Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em terras indígenas), que foi assinada por meio de decreto no dia 12 de junho de 2012, pela presidente Dilma, veio sendo construída desde o mandato do Lula, com a participação dos povos indígenas. O problema é que essas políticas existem, mas é a mesma coisa da Constituição. Elas não conseguem ter as condições, recursos próprios para que consigam chegar de forma satisfatória na ponta. A saúde, por exemplo, tem recursos suficientes, se tiver uma distribuição adequada. Agora, o problema, hoje, é que os próprios parlamentares se apropriam desse recurso, dominam esses órgãos de forma que tiram o benefício. Não é falta de investimento, mas de boa aplicabilidade dos recursos. Depois do golpe, nesses últimos 3 anos, as indicações dos coordenadores de Distritos Especiais Indígenas, que são dos estados, passaram a ser por indicação política. Cada estado tem um deputado que manda naquele cargo. Não é simplesmente considerar o indígena incapaz, mas ignorar a presença e desrespeitar as pessoas.

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Sul21: Além da pauta da demarcação, quais as outras que tu pretende defender nessa campanha?

Sonia: Nós temos uma pauta bem coletiva, não tem uma que é minha, uma que é do Guilherme [Boulos]. Quando a gente fala de demarcação é garantir a questão territorial, tanto a questão indígena quanto ambiental, é enfrentamento a esse modelo de desenvolvimento econômico que a gente tem hoje, que é altamente depredador, que destrói tudo. A gente precisa resgatar uma política ambiental que possa garantir a agrofloresta, a agricultura familiar, e parar esses investimento nas monoculturas e no agronegócio. Não é verdade que é o agronegócio que alimenta o povo brasileiro e que é a única maneira de crescer. Nós temos aí, a biodiversidade rica que pode ser utilizada com todos os seus valores, sem destruir tudo, como é hoje. Esse modelo que está aí, pode até garantir o hoje, mas não garante o futuro. Nós temos que atuar hoje pensando na continuidade das próximas gerações. O combate à desigualdade também é uma coisa forte e o fortalecimento e aprimoramento da democracia. A gente nunca conseguiu ter uma democracia plena.

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Sul21: No final de abril, o governo Temer trocou pela terceira vez o presidente da Funai, em dois anos, nomeando o empresário Wallace Moreira Bastos. Você conhece o trabalho dele? O que achou da troca?

Sonia: Qualquer pessoa que assume a Funai hoje, para nós não é surpresa mais. A gente já teve pastor, general, agora um empresário. Nenhum desses tinha a ver com a questão indígena. Aliás, o primeiro, que era pastor [Antônio Fernandes Toninho Costa] até tinha, porque ele vinha com uma história de trabalhar com povos indígenas a vida inteira. Mas não serviu, exatamente porque tinha essa relação, rapidamente o PSC, que é o partido hoje responsável pela Funai - porque cada órgão foi entregue a um partido, com a distribuição da conta do impeachment - entendeu que o pastor não servia, porque tinha muita aproximação com os índios. O general do Exército [Franklimberg Ribeiro Freitas] chegou todo conivente, indicado por todos eles, de repente saiu porque estava muito lento, para atender os interesses deles. Então, agora, certeza que colocaram um para ser mais acelerado. A Funai está totalmente fora do que sempre foi a sua missão, o seu papel institucional. Agora ficou essa moeda de troca para parlamentares, para partido. O que a gente precisa mesmo é resgatar a função dela, o papel enquanto órgão indigenista oficial, que hoje não está servindo para os indígenas, mas para os interesses do próprio estado e como moeda de troca entre eles.

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