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Verba do Bolsa Pesca aumentará 26% em 2012

O Globo, O País, p. 9
06 de Out de 2011

Verba do Bolsa Pesca aumentará 26% em 2012
Previsão no Orçamento é de R$1,6 bi; número de beneficiados pelo seguro também cresce, indo a 639 mil pessoas

Alessandra Duarte
duarte@oglobo.com.br

Apesar das denúncias de fraude, das centenas de pessoas investigadas pelo Ministério Público Federal (MPF) nos estados e da constatação, pela Controladoria Geral da União (CGU), de 60,7 mil pagamentos irregulares só nos últimos dois anos, o governo federal prevê mais verba para o Bolsa Pesca em 2012. Segundo o Ministério do Trabalho, de onde saem os recursos para o seguro, a previsão para o benefício no Orçamento de 2012 é de R$1,648 bilhão - R$348 milhões a mais do que o R$1,3 bilhão orçado este ano para o seguro, um aumento de 26,7%. O benefício é pago por quatro meses, no período de reprodução de peixes e outras espécies, quando a pesca é proibida, a pescadores artesanais que trabalham de forma individual ou em regime familiar.
Além de já considerar o reajuste no valor do salário mínimo, o aumento previsto no montante pago pelo benefício é devido também à ampliação no número de beneficiados: dos 553.172 que recebem o seguro este ano, o número de beneficiados vai passar para 639.970 no ano que vem, segundo o Ministério do Trabalho.
No Orçamento de 2012, menos transparência
Até este ano, o pagamento do seguro aparecia discriminado no Orçamento da União como sendo a ação "0585 - Pagamento do Seguro-Desemprego ao Pescador Artesanal". No projeto de lei do Orçamento de 2012, porém, essa ação não aparece mais, ficando embutida dentro do valor global do seguro-desemprego. De acordo com a assessoria de comunicação do Ministério do Trabalho, isso ocorreu por uma determinação do Planejamento para o Plano Plurianual (PPA) 2012-2015, no qual ações que incluem mais de uma pasta passaram a ter os valores agrupados.
- Ou seja, em vez de isolar a ação para poder acompanhá-la melhor, que seria o recomendável quando se tem uma área problemática como essa, o governo foi no sentido contrário, diminuindo a transparência - critica o economista Gil Castello Branco, fundador da Associação Contas Abertas, que na última terça-feira, em artigo no GLOBO, apontou o aumento de beneficiados pelo seguro-defeso.
Apesar de, neste ano, o Ministério da Pesca ter suspendido a emissão de novos Registros Gerais de Pesca (documento necessário ao pescador para a obtenção do seguro) devido às denúncias de irregularidades, a pasta não soube explicar por que, em 2012, está previsto um aumento no número de beneficiados pelo seguro. Segundo a assessoria de comunicação da Pesca, o que pode ter ocorrido é que, como o pescador, para poder receber o benefício, precisa ter mínimo de um ano de RGP, teria sido feita uma projeção, no fim do ano passado, com base no número de pescadores que, naquela época, estariam habilitados a requerer o benefício um ano depois.
O Ministério da Pesca disse também ontem que determinou a suspensão do RGP de Antônio Carlos Lima de Mello, após ele ter confessado, em reportagem ontem no GLOBO, que recebia o seguro-defeso irregularmente em Niterói, no Grande Rio.
Ex-presidente de colônia condenado no RN
Em outro exemplo de fraude na concessão do benefício nos estados, no último dia 31 de agosto a Justiça Federal no Rio Grande do Norte condenou por estelionato, em primeira instância, Valquírio Gomes dos Santos. Quando presidente da colônia de pescadores Z-44, na cidade de Santa Cruz, em 2005 e 2006, ele inscreveu irregularmente pessoas que não eram pescadores, e, assim, teria conseguido mais associados para a entidade. Valquírio - que foi condenado a dois anos de prisão convertidos em serviços comunitários e a pagamento de multa, mas ainda pode recorrer da decisão - teria afirmado aos moradores da área que as mulheres de pescadores também teriam direito ao benefício, para as inscrever também.
Reportagem de ontem do GLOBO mostrou que as fraudes incluem, ainda, o uso do seguro como moeda eleitoral. No Pará, o deputado Chico da Pesca foi cassado em agosto por abuso de poder político e econômico, pois, tendo sido superintendente da Secretaria Federal da Pesca no estado, incluiu centenas de pessoas irregularmente em troca de votos.

PPS quer que TCU apure denúncias
PSDB entra com requerimentos para convocar Luiz Sérgio e Lupi na Câmara

BRASÍLIA e RIO. O deputado federal Arnaldo Jordy (PPS-PA), vice-líder da minoria na Câmara, quer que o Tribunal de Contas da União (TCU) investigue irregularidades constatadas no Bolsa Pesca. Jordy anunciou que pedirá à Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara que acione o TCU para apurar a expansão do benefício. Também ontem, o PSDB entrou com dois requerimentos pedindo a convocação dos ministros Luiz Sérgio (Pesca) e Carlos Lupi (Trabalho), para prestarem esclarecimentos na Comissão de Agricultura da Câmara.
Como mostrou ontem O GLOBO, a Controladoria-Geral da União (CGU), órgão vinculado à Presidência da República, identificou 60,7 mil pagamentos irregulares nos últimos dois anos. De 2003 a 2011, o número de favorecidos pelo Bolsa Pesca saltou de 113.783 para 553.172, um aumento de 386%. Os gastos anuais também subiram de R$81,5 milhões para R$1,3 bilhão, no mesmo período.
- Os indícios de desvio de dinheiro público são aberrantes em todas as unidades da Federação, o que exige do TCU fiscalização imediata e rigorosa - declarou Jordy, conforme nota divulgada pelo PPS.
Para que o TCU dê início à investigação, o pedido do deputado precisará ser aprovado pela comissão. Jordy estranhou o fato de que a quantidade de beneficiários é maior do que o total de inscritos nas associações de pescadores.
O deputado também apresentou à Mesa da Câmara pedidos de informação aos ministérios do Trabalho e da Pesca. O objetivo é saber detalhes sobre o mecanismo de concessão e fiscalização do Bolsa Pesca. Outra solicitação é dirigida ao Ministério da Justiça. O parlamentar quer saber se a Polícia Federal está atuando no caso.
O PSDB também protocolou ontem, na Câmara, requerimentos pedindo convocação dos ministros Luiz Sérgio (Pesca) e Carlos Lupi (Trabalho) na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, "com vista a prestar esclarecimentos sobre as irregularidades de pagamento do auxílio-desemprego a falsos pescadores tidos como beneficiários do seguro-defeso", além de também sobre aumento de gasto com o seguro para R$1,3 bilhão.
Assinados pelo líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP), e pelo deputado Reinaldo Azambuja (MS), os requerimentos (de números 119, convocando Luiz Sérgio, e 120, convocando Lupi) utilizaram as reportagens publicadas no GLOBO como justificativa. Segundo a assessoria da liderança do PSDB na Casa, os requerimentos devem entrar na pauta de votação da Comissão de Agricultura na semana que vem.

Governo vai criar 'cartão-pescador'

Fábio Fabrini
fabio.fabrini@bsb.oglobo.com.br

BRASÍLIA. Pressionado por inquéritos país afora e pela constatação de milhares de fraudes no pagamento do seguro-defeso, o Ministério da Pesca anunciou ontem a criação de um "cartão-pescador", a ser distribuído pela Caixa Econômica Federal, para coibir os desvios. O objetivo é lançá-lo ano que vem, com um sistema de controle de dados que dificulte o registro de pessoas que não vivem da pesca e a concessão irregular do benefício.
O secretário nacional de Monitoramento e Controle da Pesca, Américo Ribeiro Tunes, diz que o cartão será magnético. Para ter direito a ele, o pescador terá de se recadastrar nas agências da Caixa, comprovando o exercício da profissão. Segundo Tunes, o novo banco de dados permitirá o cruzamento com cadastros da Receita e dos ministérios do Trabalho e da Previdência.
O ministério promete colocar em campo, até o início de 2012, 80 fiscais para inspeções nas colônias de pesca do país.
Por conta das fraudes, desde janeiro está proibido o cadastramento de novos pescadores. A vulnerabilidade é tanta que o secretário reconhece não ser possível atestar, com certeza, o número de pescadores artesanais no país:
- Se eu falar para você que o registro é confiável, estaria mentindo. Você tem um bom número de pescadores que, de fato, pescam. Agora, no bojo disso aí, vêm os oportunistas. O sistema de registro era muito rudimentar e está sendo aperfeiçoado.

O Globo, 06/10/2011, O País, p. 9

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