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Vendas de camisas com desenho da etnia Tukano ajudam no estudo de indígenas

Amazônia Real- http://amazoniareal.com.br
Autor: Elaíze Farias
04 de Nov de 2016

Os jovens indígenas Cloves Torres e Ivan Barreto, da etnia Tukano, inspiram-se nos grafismos rupestres encontrados nas pedras localizadas à margem do rio Tiquié, no Alto Rio Negro (AM), nos animais encantados e nos instrumentos musicais para desenvolver um empreendimento que está ajudando na sustentabilidade deles e de suas famílias. Nascidos em aldeias do município de São Gabriel da Cachoeira, extremo norte do Amazonas, Cloves Torres, 23 anos, e Ivan Barreto, 26 anos, inauguraram há dois meses uma loja virtual de vendas de camisas com estampas que resgatam a origem cosmológica e retratam a cultura do povo Tukano.

Ambos moram Manaus e fazem faculdade. A ideia de confeccionar as camisas para comercialização surgiu por uma necessidade provisória de sobrevivência enquanto não encontravam uma vaga no mercado de trabalho. O projeto vem conquistando boa aceitação e eles já pensam em expandir o negócio para a confecção de outros produtos.

"Essa iniciativa se deu pela falta de oportunidade no mercado de trabalho. Sabemos que em Manaus é difícil conseguir [emprego]. O Ivan e eu conversamos sobre arrumar uma renda extra. A gente já fazia grafismos no rosto e no corpo e então pensamos em fazer isso em camisas", explica Cloves Torres.

Os dois artistas transportam para as camisas elementos que simbolizam a cultura Tukano, com imagens de bichos e de flauta indígena (de nome Kariçú). Um desses desenhos estilizados é o pé de gafanhoto, cuja pintura nos corpos dos indígenas é comum antes da preparação em dias de festa, como é o caso do ritual Dabucuri, o mais conhecido no Alto Rio Negro. Outro animal é a borboleta, cujo desenho é exclusivo para os corpos das mulheres.

Ivan Barreto diz que muitos dos desenhos transportados para as camisas são inspirados nas explicações do avô, Ovídio Barreto, que é Kumu (especialista em conhecimento Tukano).

"A gente desenha com orientação do seu Ovídio. Ele vai explicando como é, do que se trata, e a gente desenha. Tem, por exemplo, o pé do gafanhoto. Nós pegamos o papel e ele vai nos orientando o que significa. A gente também desenha outros animais, pessoas e outros seres que não sabemos identificar", conta Ivan Barreto.

Alguns dos desenhos rupestres são copiados de fotografias encontradas em publicações do Instituto Socioambiental (ISA), organização não-governamental que há mais de 20 anos atua na região do Alto Rio Negro.

"São fotografias dos desenhos dos nossos ancestrais. Figuras encontradas no rio Tiquié. Então, a gente pega a fotografia e pergunta ao nosso avô o que significa. Um dos desenhos é uma pedra central, que o nosso avô disse que é a morada dos macacos", explica Barreto.

Cloves Torres e Ivan Barreto são também músicos. Eles integram o grupo Kariçú, com sede em Manaus, formado há mais de um ano. O grupo faz apresentações frequentes em espaços da capital amazonense e em eventos.

Inspirados nos sons da floresta e nas flautas, eles também resgataram imagens dos instrumentos da música Tukano nas camisas. "As flautas são típicas da dança Kariçú, que também é o nome do grupo", diz Cloves.

Os dois jovens planejam agora diversificar os produtos. Por enquanto, eles pensam apenas em produzir chaveiros e copos. Os chaveiros deverão ser miniaturas de flautas usadas nas festas Tukano. Também querem expandir os modelos de grafismos. Eles pretendem, ainda, profissionalizar o projeto com a formalização do negócio criando uma empresa com CNPJ e inscrição nos órgãos competentes.

As camisas nas cores branca, preta e rosa (tamanhos M e G) podem ser adquiridas através da página Tuca.Artes no Facebook e em uma banca na feira de artesanato no calçadão da Ponta Negra, em Manaus, a R$ 30. Na página do Facebook, cada camisa tem uma explicação sobre o desenho estampado.

"Estamos vendendo e comprando mais camisas para fazer as estampas. Conseguimos mais solicitações. Futuramente, queremos criar uma lojinha de varejo para atender todo o Brasil pela internet. A gente também leva as camisas para vender nas nossas apresentações do grupo. Está dando certo", comemoram eles.

A técnica de impressão adotada nas camisas é a sublimação [impresso em papel com tinta especial e prensado com calor sobre o tecido]. Eles dizem que, ao terminar o atual estoque, dependendo dos custos, vão adotar a técnica da serigrafia [impressa em tela].

O povo Tukano é um dos 23 que habitam a região do Alto Rio Negro, no extremo norte da Amazônia, fronteira com Colômbia e Venezuela. Segundo o censo 2010 do IBGE, a população Tukano é de seis mil pessoas. Em 2002, a língua tukano foi considerada co-oficial naquela região, junto com outras duas línguas indígenas, baniwa e nheengatu, além do português. Os Tukano se identificam com sua própria denominação, Yepá-Mahsã, que tem diferentes significados. Entre eles, "seres vindo da terra".

Em busca de formação

Ivan Barreto nasceu em Pari Cachoeira, em São Gabriel da Cachoeira. Mora em Manaus desde 2007, onde chegou para prosseguir seus estudos. Atualmente faz graduação em Ciências da Computação na Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

"Eu vim para estudar. Meu objetivo era vir para a capital e voltar formado. Voltar para a comunidade. Decidi fazer esse curso porque sentia necessidade de termos alguém na área de tecnologia", conta Ivan Barreto, que ainda não sabe como vai conciliar a atividade da produção de camisas com a profissão que escolheu. "Quem sabe podemos desenvolver um aplicativo", diz.

Nascido em Yauaretê, Cloves Torres conta que foi durante uma conversa motivacional com um professor do ensino médio, quando ainda morava na sua comunidade, que o levou a prosseguir os estudos. "Eu queria fazer engenharia civil ou administração. Ganhei uma bolsa do Prouni para uma faculdade particular e fiz administração", diz. Hoje, Torres cursa mestrado em Engenharia de Processos Industriais em um núcleo instalado em Manaus da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Parte da família dos dois rapazes mora em Manaus e outra ficou em São Gabriel da Cachoeira. "Moro com minha avó e dois irmãos em Manaus. Por enquanto, essa ideia da venda das camisas é uma oportunidade. A ideia é boa, pode ir pra frente, vai nos ajudar de alguma forma e há muitas pessoas nos apoiando", diz.

No grupo Kariçú, liderado pelo indígena Jaime Diakara, da etnia Dessana e mestrando em Antropologia, os dois tocam e cantam. Eles dizem que antes de entrar no grupo não sabiam nem uma coisa nem outra, mas aceitaram entrar para conhecer e resgatar a cultura do Alto Rio Negro.

"No nosso ambiente, na comunidade, quando é festa, os velhos sentam e tocam. Se você se interessar, aprende. Morando em Manaus, eu sabia um pouco sobre os cantos e as flautas tocadas nos rituais. O Jaime fez uma movimentação e nos juntou. Assim, começamos a aprender a dançar, a tocar e a cantar", diz Cloves.

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