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Velado em Brasilia, Apoena sera sepultado no Rio

OESP, Nacional, p.A7
12 de Out de 2004

Velado em Brasília, Apoena será sepultado no Rio
Sertanista morto em Porto Velho planejava ir a Brasília para obter porte de arma
Mariângela GAllucci
O corpo do sertanista Apoena Meireles, que chegou ao Rio no fim da tarde de ontem, foi velado na Capela D do cemitério do Caju, zona portuária do Rio, onde deve ser sepultado às 10 horas de hoje. Morto a tiros em Porto Velho, capital de Rondônia, na noite do sábado, o sertanista - que, aos 55 anos, era um dos mais respeitados defensores da causa indígena, principalmente pelo trabalho feito junto aos índios cintas-largas, durante os anos 60 - foi velado inicialmente em Porto Velho, depois na sede da Funai, em Brasília, e trasladado finalmente para o Rio, onde o aguardavam a viúva e os filhos Francisco e Tainá - esta chegada às pressas da Suíça.
O plano de Apoena, durante a semana passada, era ir até Brasília para submeter-se a testes psicotécnicos com o objetivo de obter autorização para porte de arma.
Em Porto Velho, onde estava para conversar com índios cintas-largas sobre as áreas de exploração de diamantes, ele foi a um banco sacar dinheiro. Com ele estava a também funcionária do órgão, Clenice Alves Mansur, que entregou aos assaltantes R$ 50, cartões de crédito, documentos e um celular. Mas Apoena atracou-se com um deles, que ao fugir disparou os tiros que o mataram.
Latrocínio - Segundo o vice-presidente da Funai, Roberto Lustosa, todas as hipóteses para o crime estão sendo investigadas.
Outro funcionário comentou que ele estava mexendo com o crime organizado, envolvido em contrabando de diamantes. A Polícia Federal também está acompanhando as apurações. "Em princípio, os indícios apontam para latrocínio, mas nada está sendo descartado", afirmou o secretário-executivo da PF, Luiz Paulo Barreto. O secretário observou que o trabalho junto aos cintas-largas era muito importante e o fechamento de uma área de garimpo no Estado contrariou interesses. Ele acha difícil achar um substituto para Meireles.
Em Brasília, amigos do sertanista disseram que ele estava sendo perseguido.
Mas um dos seus filhos, o estudante de direito Francisco Meireles, disse que o pai não fez nenhuma menção a ameaças. "Ele era reservado", afirmou. Irmã de Francisco, Tainá Meireles mora na Suíça e veio para o Brasil assim que soube da morte do pai. "Estou revoltada com a forma pela qual meu pai morreu", disse Tainá.

Cacique não acredita em assalto
Almir Suruí, líder dos índios da área Norte, crê em vingança por causa dos diamantes
Nilton Salina
Especial para o Estado
O presidente da Coordenação da União dos Povos Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas (Cunpir), cacique Almir Suruí, de 30 anos, disse ontem que os índios não acreditam que o sertanista Apoena Meireles tenha sido morte em um simples assalto, por alguém interessado em roubar-lhe dinheiro.
Para Almir Suruí, o crime está relacionado aos recentes conflitos na jazida de diamantes da reserva Roosevelt, no Mato Grosso, onde vivem os índios cintas-largas, a cerca de 500 quilômetros de Porto Velho.
"Com a morte de Apoena, o garimpo de diamantes deverá ser reaberto. Ele era contra a garimpagem ilegal e isso contrariava interesses de grupo poderosos.
Não posso dar nomes, porque também tenho medo de morrer", afirmou o presidente da Cunpir, ONG que congrega cerca de 10 mil índios.
Na opinião de Suruí, a Funai precisa designar com urgência alguém que tenha a confiança dos cintas-largas para atuar na reserva. "No Apoena dava para confiar. Em muitos outros, é difícil. Haviam prometido que o garimpo seria regularizado, e depois voltaram atrás. Como acreditar no pessoal do governo?", indagou.
Na manhã de domingo, o corpo de Apoena foi velado por indígenas em Porto Velhno, antes de ser levado para Brasília. Na ocasião, os caciques disseram que o sertanista teria demonstrado descontentamento com a força tarefa da Polícia Federal e da Funai na reserva.
Durante o velório, disse ele, caciques cintas-largas ligaram "para dizer que, há alguns dias, Apoena garantiu que faria mudanças na estrutura da Funai, e isso fere interesses de envolvidos".
Latrocínio - O diretor geral de Polícia Civil, delegado Carlos Eduardo Ferreira, investiga o caso como latrocínio. Segundo ele, se o crime tivesse acontecido por causa dos diamantes, teria sido melhor planejado. "O assaltante agiu em frente de uma câmera de vídeo e fugiu em uma bicicleta. Se houvesse alguma relação com o garimpo, acredito que a estrutura utilizada no crime teria sido muito maior", disse Ferreira.

Presidente lamenta morte prematura
Leonencio Nossa
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem, por meio de nota, que "lamenta muito" a morte "violenta e prematura" do sertanista Apoena Meireles. "Apoena foi uma importante referência para o indigenismo brasileiro. A melhor homenagem a ele é seguir na luta pela continuidade dos povos indígenas no Brasil, compromisso inequívoco deste governo", diz o texto da nota divulgada pela Secretaria de Imprensa do Palácio do Planalto.
A política indigenista do governo está sendo criticada pelas entidades envolvidas na questão indígena. Atualmente, essas entidades reclamam da demora de Lula para homologar a reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, onde plantadores de arroz disputam o território com 15 mil índios.
A homologação da reserva foi discutida ontem pelo presidente numa reunião com seis ministros e o presidente da Fundação Nacional do índio (Funai), Mércio Pereira Gomes.

OESP, 12/10/2004, p. A7

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