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Valor para floresta em pé

OESP, Vida, Especial, p. H6
05 de Dez de 2008

Valor para floresta em pé
Mecanismo que propõe pagamento pelo desmatamento evitado deve avançar na COP

Giovana Girardi

Um dos setores com maior expectativa de avançar na reunião de Poznan é o de florestas, em torno do mecanismo conhecido como RED (redução das emissões por desmatamento).

Há um consenso entre os especialistas em negociação climática internacional de que a redução do desmatamento será a principal contribuição de países em desenvolvimento, que ainda têm florestas, para a redução das emissões de gases-estufa. A atividade é responsável por cerca de 20% do carbono liberado na atmosfera em todo o mundo. No Brasil, essa cifra era de 75% no único inventário realizado no País, em 1994.

Após o assunto ter sido incluído no mapa de ação de Bali, na COP do ano passado, ele ganhou um grupo de trabalho próprio em uma das três reuniões realizadas neste ano pelos negociadores internacionais. Em agosto, em Acra (Gana), o líder do grupo, o diplomata brasileiro Luiz Alberto Figueiredo Machado, buscou intensificar as discussões e acredita ter obtido alguns avanços. O tema que ficou de fora do Protocolo de Kyoto deve aparecer no acordo que valerá depois de 2012, suportado muito provavelmente por algum mecanismo financeiro. A dúvida que permanece é se será dentro de um mercado de crédito de carbono ou de um fundo global com doações voluntárias que financiariam estratégias para a redução do desmatamento.

Desde Bali o Brasil defende essa segunda opção, por acreditar que a primeira pode gerar uma espécie de permissão para mais emissões. E já se antecipou às negociações globais e criou um fundo próprio, o Amazônia, que conta com doações de países estrangeiros para ajudar a cortar o desmate. Noruega foi o primeiro a aceitar a proposta e doou US$ 1 bilhão dividido em parcelas até 2015. O Brasil só poderá usar esse dinheiro se mantiver o desmatamento abaixo da média ocorrida entre 1996 e 2005, que foi de 19.500 km2.

"Acreditamos que mercado é uma coisa complicada, pois pressupõe troca. Com o crédito, ao não desmatar aqui, dá direito de alguém emitir mais em outro lugar. E não garante que alguma floresta não vai acabar sendo desmatada em outro país", afirma Suzana Kahn Ribeiro, secretária de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente. Segundo ela, o Brasil continuará defendendo essa idéia para os demais países com floresta agora em Poznan.

Só que uma das críticas que esse tipo de financiamento recebe é justamente por não pressupor alguma troca. Quem investir no fundo ganha, claro, um planeta melhor, mas em momentos de crise, o retorno financeiro pode ser priorizado. "As doações podem apresentar um limite no longo prazo. E não dá para se pautar pela Noruega, não sabemos se outros países compartilham essa visão. Acredito que um mercado com créditos florestais é a única maneira de conseguir um processo de financiamento com sustentabilidade, porque dá algo em troca", afirma Paulo Moutinho, coordenador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.

Suzana discorda. Para ela, os países que vierem a investir no Fundo Amazônia tomarão essa atitude porque " têm muito a perder com as mudanças climáticas", diz. "A contenção do desmatamento ajuda a evitar um mal maior. Os países sabem que um problema que traga sérias catástrofes não é bom pra ninguém. As mudanças climáticas vão trazer empobrecimento, acentuar as desigualdades, e isso pode representar perda de mercados."

Segundo a secretária, a idéia não é só contar com o financiamento externo. "Estudamos outras soluções econômicas para a manutenção da floresta, como o pagamento por serviços ambientais, a valorização dos produtos extrativistas, além do aumento da fiscalização."

Para completar, críticos do mercado apontam o temor de que a negociação de créditos de carbono florestal acabe inundando o mercado de carbono com um crédito muito barato - acredita-se que é mais caro tornar uma matriz energética limpa (ação que hoje rende créditos de carbono dentro do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, previsto pelo Protocolo de Kyoto) do que manter a floresta em pé. E a presença desses créditos poderia desestimular ações de descarbonização. Moutinho defende que uma solução é atrelar a entrada dos créditos ao aumento das metas de redução. Assim, se um país resolvesse comprar créditos de carbono florestal para compensar suas emissões, teria de assumir um compromisso maior.

Figueiredo acredita que o incentivo à proteção de florestas acabará sendo mais amplo. "Provavelmente teremos vários mecanismos de financiamento."

OESP, 05/12/2008, Vida, Especial, p. H6

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