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Tubarão vira bicho-papão em PE

OESP, Cidades/Metrópole, p. C8
27 de Ago de 2007

Tubarão vira bicho-papão em PE
Os predadores já causaram 19 mortes no litoral da região metropolitana de Recife desde 1992

Angela Lacerda

Mãe e filho curtem o sol na Praia de Boa Viagem, cartão-postal do Recife, até que a criança sai atrás de uma bola em direção ao mar. A mãe reage: "Não entre na água que o tubarão vai te pegar". O tubarão, que desde 1992 protagonizou 50 ataques a surfistas e banhistas no litoral da região metropolitana de Pernambuco, com 19 mortes, tornou-se uma espécie de versão moderna do "bicho-papão".

Desde o começo do mês, há placas de advertência em Olinda e Recife, alertando especialmente para pontos de mar aberto, sem proteção de arrecifes. Na semana passada, um corpo foi encontrado na costa pernambucana com suspeita de que tenha sido vítima de novo ataque.

O trecho interditado para nado e esportes aquáticos vai da Praia do Paiva, no Cabo de Santo Agostinho, à Praia Zé Pequeno, em Olinda, incluindo as Praias de Jaboatão dos Guararapes e as da capital. São 20 quilômetros - pouco mais de 10% da orla pernambucana. Olinda foi incluída na área de risco após a morte do surfista Humberto Pessoa Batista, de 27 anos, em 18 de junho, na Praia Del Chifre.

Para o coordenador do Instituto Praia Segura, Sérgio Murilo, a concentração de incidentes na costa pernambucana aponta desequilíbrio ambiental. "O tubarão é porta-voz desse desequilíbrio", diz. As causas, relacionadas em estudos da Universidade Federal Rural de Pernambuco, passam pela construção do Porto de Suape, em Ipojuca, que mexeu no ecossistema; a existência de matadouros, como o de Jaboatão, que jogava mais de 300 mil litros de sangue no rio e está fechado há um ano; o lixão da Muribeca, que despeja chorume na água; esgotos domésticos lançados nos rios e a destruição de matas ciliares que provocam assoreamento dos leitos, e o encaminhamento de areia para o mar, cobrindo os corais que servem de alimento. "Sem os corais não há reprodução de peixes e, na cadeia, não tem comida para os tubarões", resume Murilo, ao explicar o desvio da rota feita às águas rasas das praias metropolitanas.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, José Otávio Meira Lins, discorda. Para ele, esse tipo de desequilíbrio não acontece apenas em Pernambuco.

O barco Sinuelo, que fazia expedições financiadas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, capturando tubarões de espécies agressivas, teve o trabalho interrompido por falta de recursos. Convênio do governo do Estado e a Prefeitura garantiram a retomada das expedições e a captura de um tubarão tigre de 1,5 metro e um galha preta, de 2,4 m, em duas viagens. Mas ambientalistas consideram isso como matança dos animais.

Pesca Seletiva

O Comitê Estadual de Monitoramento dos Incidentes com Tubarões (Cemit) defende a pesca seletiva de espécies agressivas para estudos. "O tubarão é importante como topo da cadeia marinha", diz Sérgio Murilo, que defende educação ambiental. Supõe-se que existam 400 espécies de tubarão no mundo. No Brasil, este número chega a 100, das quais quatro consideradas agressivas: o cabeça-chata, o tigre, o galha preta e o tubarão-martelo. Três estão presentes na orla pernambucana.

Charles Heitor Barbosa Pires, de 28 anos, é um sobrevivente que traz no corpo marcas profundas. Ele surfava em Boa Viagem, há sete anos, quando foi atacado por um cabeça-chata, com cerca de 2,5 metros e teve as mãos amputadas. Hoje, trabalha, voltou a surfar e é capaz de dirigir. Guarda-vidas dos 13 postos na orla usam "shark shields" (equipamento que repele tubarões) para entrar na água. A expectativa é de que seja instalada tela de proteção com 150 metros de profundidade na Praia de Boa Viagem, em uma faixa de 200 m de mar aberto, onde esportes náuticos são proibidos desde 1995.

Ataques não afetam turismo

Pesquisa encomendada pela Prefeitura do Recife em 2005, com 500 turistas, apontou que o tubarão não afeta o turismo. Nove entre dez entrevistados sabiam do perigo. Mesmo assim, 95% pretendiam voltar à cidade, 73% tinham ido à Praia de Boa Viagem, onde ocorreram 48% dos ataques, e 55% entraram no mar. Para 30% dos que não caíram na água, o tubarão foi o segundo motivo - o primeiro, a sujeira. "O tubarão não é problema grave", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, José Otávio Lins. O Comitê Estadual de Monitoramento dos Incidentes com Tubarões, criado em 2004 com representantes de esportistas, defende informação e fiscalização nas áreas sujeitas a ataques, além de socorro rápido.

OESP, 27/08/2007, Cidades/Metrópole, p. C8

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