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Transposição do São Francisco ganha novo edital

OESP, Nacional, p. A10
07 de Nov de 2006

Transposição do São Francisco ganha novo edital
Governo quer adiantar parte técnica enquanto espera decisão do Supremo sobre as 12 ações contra a obra

Ribamar Oliveira

Para tentar ganhar tempo, o governo decidiu fazer um edital de licitação apenas para a elaboração dos projetos executivos da primeira etapa de implementação da transposição do Rio São Francisco. O novo texto será encaminhado ainda esta semana pelo ministro da Integração Nacional, Pedro Brito, ao Tribunal de Contas da União (TCU) para que seja avaliado. Brito acredita que até a segunda quinzena de dezembro o edital será publicado no Diário Oficial da União.

O ministro avaliou que poderá dar prosseguimento aos trabalhos com a licitação dos projetos executivos, enquanto espera a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as 12 ações que ingressaram na Justiça contra a transposição do rio. Os projetos executivos detalham os aspectos técnicos e de engenharia. O governo tenta derrubar, no Supremo, as liminares que foram concedidas contra a obra.

Até a decisão final do STF, as obras estarão suspensas, confirmou ontem o Ministério da Integração Nacional. Ainda não há data para o julgamento das ações. A pasta já respondeu a uma série de pedidos de informações feitos pelo Supremo sobre a questão.

Inicialmente, a estratégia do governo era licitar toda a primeira etapa das obras de transposição do São Francisco. Assim, o ministério publicou edital no Diário Oficial, em maio de 2005, que previa processo de concorrência pública para execução das obras civis, instalação, montagem, testes e comissionamento de equipamentos elétricos e elaboração dos projetos executivos.

Esse edital será agora cancelado, segundo confirmou o titular da Integração Nacional. Outro será publicado para licitar apenas a elaboração dos projetos executivos. Na prática, o governo apenas desmembrou uma parte do primeiro edital. A decisão de Brito mostra que o início das obras da transposição ficará mesmo para o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

CONFLITOS

A transposição das águas do São Francisco para perenizar alguns rios do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco tinha sido definida como o principal investimento do primeiro mandato de Lula. Mas os conflitos entre os Estados doadores de água (aqueles cujas terras são cortadas pelo São Francisco) e os que seriam beneficiados impediram que o projeto fosse implementado.

A transposição prevê gastos de R$ 4 bilhões na primeira fase, cujo objetivo é levar 26 metros cúbicos de água por segundo para perenizar rios de quatro Estados do Nordeste Setentrional. O projeto prevê dois eixos - Norte e Leste - e recebeu parecer favorável da Agência Nacional de Águas (ANA).

Ao menos em termos políticos, o governo deverá ter menos problemas. Nos dois Estados em que há mais resistência à transposição - Sergipe e Bahia -, o PT saiu vitorioso, derrotando o PFL. Com isso, o presidente Lula poderá negociar diretamente com os governadores.

No Orçamento da União do próximo ano, o Ministério da Integração Nacional reservou R$ 100 milhões para revitalizar o São Francisco e aumentar a malha de distribuição de água nos Estados receptores. Os defensores da obra alegam que ela permitirá levar água a uma extensão maior de áreas agrícolas. Além disso, deve gerar cerca 5 mil postos de trabalho enquanto durar a transposição.

Entidades de defesa do rio vão contestar medida
Roldão Arruda
Ao mesmo tempo em que o governo procura alternativas para levar adiante o projeto de transposição do Rio São Francisco, as organizações contrárias à iniciativa se articulam para barrá-lo. Na sexta-feira, os integrantes do Fórum de Defesa do São Francisco se reunirão em Salvador para analisar a mudança que o governo pretende fazer no processo de licitação da obra e definir sua reação.

Também em Salvador, a promotora Luciana Khoury, da Coordenadoria Interestadual das Promotorias do São Francisco, se prepara para contestar a mudança na licitação. Ela lembrou ontem que, entre outros processos, a transposição foi barrada na Justiça Federal por força de liminar concedida a uma ação civil pública, segundo a qual o Ibama agiu ilegalmente ao conceder a autorização ambiental para a obra.

'Com o caso sob julgamento, o governo não pode fazer licitação nem para contratação do projeto executivo', argumentou a promotora. 'E se a obra for embargada? Quem repõe o dinheiro gasto?'

Segundo os críticos da transposição, o governo deveria em primeiro lugar cuidar da recuperação do São Francisco. 'O rio está poluído e passa por um processo de assoreamento, devido ao desmatamento das margens', disse Luís Carlos Mandela, integrante da Cáritas do Brasil e assessor do Programa de Convivência com o Semi-Árido.

A Cáritas, vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), faz parte de um conjunto de quase 800 organizações contrárias à obra. De acordo com Mandela, existem estudos demonstrando que é possível resolver o problema de abastecimento de água no semi-árido com projetos mais baratos e mais eficientes.

'O governo não está preocupado com a falta de água para o povo nem com a pequena agricultura', afirmou Mandela. 'Ele quer atender aos grandes empresários do agronegócio, que precisam da água para produzir camarões e frutas de exportação, e às construtoras.'

OESP, 07/11/2006, Nacional, p. A10

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