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Transgenicos - mitos e verdades

CB, Opiniao, p.17
Autor: PATERNIANI, Ernesto
27 de Jan de 2004

Transgênicos — mitos e verdades
Ernesto PaternianiProfessor titular de genética da USP e membro titular da Academia Brasileira de Ciências

O cultivo das plantas transgênicas vem crescendo anualmente, chegando em 2003 a 67,7 milhões de hectares em 18 países. Os europeus estão gradativamente diminuindo as restrições a essa tecnologia. Na China comunista, onde todos os agricultores são pequenos, com menos de meio hectare, o cultivo do algodão Bt, resistente a insetos, aumenta continuamente. Os chineses contam ainda com dezenas de espécies transgênicas em experimentação.   Os benefícios dos transgênicos em uso até o presente são evidentes e bem documentados e se relacionam à redução no uso de agrotóxicos e menor custo de produção. Riscos hipotéticos freqüentemente anunciados não produziram dano nem à saúde nem ao meio ambiente. Nenhum cientista afirma que os transgênicos não têm riscos, pois nada tem risco igual a zero. Mesmo o princípio da precaução, freqüentemente defendido como meio de se evitar riscos, tem o próprio risco, pois a permanente espera da certeza, nunca atingida, vai impedir a sociedade de se beneficiar com qualquer inovação tecnológica.   Na Índia, o algodão Bt foi proibido em função do princípio da precaução, mas uma intensa infestação da lagarta rosada causou enormes danos na safra de 2002, mesmo com os inseticidas aplicados, induzindo muitos agricultores ao suicídio. Isso levou o presidente Kalam a aprovar os transgênicos no dia 26 de janeiro de 2003, por ocasião do 54o aniversário da independência do país. A segurança alimentar é garantida pelo maior rigor nas avaliações dos produtos transgênicos, o que, associado ao menor uso de agroquímicos, faz com que sejam considerados tão ou mais seguros do que os alimentos convencionais, sendo isso tudo amplamente confirmado nestes quase dez anos de consumo.   Outra preocupação é quanto à possibilidade de os genes transgênicos passarem para o meio ambiente, resultando numa poluição genética. Esse tema passou a ser intensamente debatido a partir dos transgênicos, dando a impressão de que a genética começou com essa tecnologia e que fluxo gênico nunca tinha ocorrido no passado.   Na verdade, existe uma grande experiência sobre o assunto desde o início da Genética de Populações em 1905. O importante é o destino dos genes transferidos, transgênicos ou não. O fluxo gênico vertical, entre plantas e variedades da mesma espécie ou entre espécies aparentadas, vem ocorrendo há milhares de anos, com efeitos no geral benéficos. Uma grande parte das plantas cultivadas superiores tiveram origem em cruzamentos tanto intra como interespecíficos. O trigo, por exemplo, é o produto da combinação de três espécies diferentes.   A transmissão ou fluxo gênico horizontal, que corresponde à transferência de genes entre espécies diferentes, tem também merecido certa preocupação. Entretanto, não existem registros de problemas sérios resultantes da transferência horizontal na natureza. Existem relatos de genes transgênicos encontrados em bactérias e leveduras vivendo no interior de animais alimentados com produtos transgênicos, porém que não persistem nas gerações subseqüentes.   Desde 1930, por meio de irradiações ionizantes, vêm sendo produzidos genes artificiais, existindo mais de 2 mil desses genes em 154 espécies agrícolas oficialmente liberados. Tais genes são muito mais exóticos do que os transgênicos existentes na natureza há milhões de anos. É de se acreditar que muitos desses genes passaram para outras variedades, inclusive para espécies silvestres aparentadas. De tudo o que tem sido discutido, os fatos demonstram uma série de benefícios em especial ao agricultor e ao meio ambiente, sendo que os riscos, bastante salientados e esperados pelos críticos, nunca aconteceram, não passando de meras especulações hipotéticas.   Em nenhum país a campanha contra os transgênicos foi tão intensa, chegando a paralisar as pesquisas científicas como está ocorrendo no Brasil, o que já representa um atraso de pelo menos três anos. Felizmente, o projeto da Lei de Biossegurança em discussão no Legislativo conta com o cuidadoso parecer do deputado Aldo Rebelo (agora ministro). Em especial, o parecer resgata a autonomia científica da CTNBio, que deverá merecer a devida apreciação, com a expectativa dos pesquisadores brasileiros que esperam poder se dedicar às suas pesquisas em benefício da sociedade e do meio ambiente.

CB, 27/01/2004, p. 17

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