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Transgênico verde-amarelo

OESP, Espaço Aberto, p. A2
Autor: GRAZIANO, Xico
16 de Mar de 2004

Transgênico verde-amarelo

Xico Graziano

Transgênicos são de esquerda ou de direita? Esqueça a resposta. Esse debate ideológico sobre a biotecnologia está, felizmente, superado. Acabou liquidado pelo relatório Aldo Rebelo, deputado do PC do B, a extrema-esquerda da política. Que boa surpresa!
Quando se divulgou, na Câmara dos Deputados, a nova proposta da Lei de Biossegurança, a comunidade acadêmica pôde respirar em paz. Afinal, os argumentos técnicos e científicos haviam sobrepujado as condicionantes políticas e ideológicas. O saber prevalecera.
O deputado-relator da matéria havia entendido, claramente, que a pesquisa exigia autonomia. Seu texto manifestava firme convicção na capacidade dos cientistas brasileiros de enfrentar o desafio da engenharia genética: pesquisar com precaução, calcular os riscos ambientais, zelar.pela saúde humana, praticar a ética. Mas avançar no conhecimento.
Menos importa que, ungido ministro, tenha visto seu relatório desfigurado por quem, sem tamanho próprio, cedera ao jogo retrógrado. A lição abrira uma fenda irreversível no dogmatismo ideológico. A lei continua em discussão, agora no Senado. A idéia acerca da biotecnologia, porém, evoluiu. A ciência tomou um gol, mas fortaleceu seu ataque.
Quando, há cinco anos, esquentou o debate sobre os produtos transgênicos, ao temor inicial que as revoluções científicas sempre causam se adicionou o veto ideológico. Isso é coisa dos imperialistas, pensaram velhos comunas. Imposição do FMI ou alguma sacanagem dos neoliberais, acreditaram os novos esquerdistas. E, xingando os transgênicos, judiaram do governo Fernando Henrique.
Mudou radicalmente a situação. A ideologia baixou a bola. Quem imaginava que os produtos transgênicos são armas do capital contra o trabalho, na clássica formulação marxista, precisou rever seus conceitos. E aqueles que enxergavam os organismos geneticamente modificados (OGMs) como forma de domínio das multinacionais contra os agricultores familiares se acalmaram.
Abrindo-se o debate, avistou-se que é a China comunista que mais investe em biotecnologia. índia e Cuba são outros países que remam velozmente para a frente. Claro, para não falar dos Estados Unidos, do Canadá e da Argentina, que puxaram o carro dessa corrida tecnológica. Vejam só: a engenharia genética serve tanto ao capitalismo como ao socialismo.
Graças a Deus, e graças à competência dos cientistas, o medo do desconhecido acabou superado pela tranqüila realidade dos fatos. Cultivam-se 70 milhões de hectares de plantas transgênicas, em 18 países, envolvendo 5 milhões de agricultores, sem nenhum problema além daqueles já conhecidos pela agronomia clássica. Ou pela saúde tradicional.
Para felicidade do País, o ambiente de discussão está desanuviado. Esse ganho de consistência no debate das idéias não ocorre apenas com o tema da engenharia genética. Depois que o PT assumiu o poder, o raciocínio político da esquerda começou a se livrar dos bichospapões que o maniqueísmo lhe grudou na testa. Percebese, claramente, que o dever da responsabilidade já ultrapassa a demagogia da crítica fácil, espantando os vícios do passado. Ainda bem.
Quando se deram ouvidos aos pesquisadores nacionais, descobriu-se também que a Embrapa, as universidades públicas e institutos de pesquisa haviam obtido competência equiparada aos maiores laboratórios do mundo. Suas pesquisas, todavia, amargavam o crivo do patrulhamento, aguardando licenças esdrúxulas para prosperarem.
Defensores da sustentabilidade e até mesmo produtores orgânicos perceberam que a burrice da polêmica sobre a soja RR, da Monsanto, impediu de enxergar as tremendas vantagens de outras transgenias, cujos efeitos promovem drástica redução no uso de agrotóxicos. É o caso das variedades de feijão e mamão resistentes a doenças viróticas, ou das culturas de milho e algodão resistentes às lagartas.
Ecólogos idealistas já entenderam que a biotecnologia, bem utilizada, será uma arma utilíssima a favor biodiversidade. Somente Argentina, calcula-se em 500 milhões a economia uso de agrotóxicos, graças ao plantio dos transgênico.
Acabou a polêmica? Não absolutamente. Clareou, entretanto, a última vertente do obscurantismo: o lobby ambientalista. Sim, lobby mesmo, no sentido mais conhecido do termo. São profissionais da defesa ambiental que lutam com unhas e dentes contra transgênicos. Eles vivem disso!
Esses ambientalistas oficiais, de carteirinha, trabalham em entidades que dependem de convênios para arrecadar recursos, de onde fazem seu modo de vida. A maioria, salvo aquelas exceções honrosas, nem de ecólogos é. Defendem os interesses de seus patrocinadores normalmente estrangeiros.
Muitas vezes, multinacionais se disfarçam de benfeitores da natureza para esconder a disputa contra seus competidores comerciais. Afinal, quem financia o Greenpeace?
Por isso, para defender seu pão, os ecologistas profissionais não assumem nenhum compromisso com a verdade. Predizem as maiores barbaridades, mentem deslavadamente, divulgam coisas absurdas, enganam a população, assustam os consumidores, sem nenhuma base científica. Pior, inventam até cientistas falsos, pés-de-chinelo, daqui ou de fora, reconhecidos na academia como verdadeiros zés-ninguéns!
Quando a esquerda assumiu a biotecnologia, caiu véu ideológico que limita a ciência. Liberta desse manto, seu valor se afirmará na sociedade. Estará assim, naturalmente, aberto o caminho para os transgênicos verde-amarelos, verdadeiro fogo de encontro à dominação tecnológica. Especialmente daquela disfarçada de verde.

Xico Graziano, agrônomo, foi pr dente do lacra (1995) e secretário Agricultura de São Paulo (1996-98) E-mail: xicograziano@terra.com.br

OESP, 16/03/204, Espaço Aberto, p. A2

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