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Terra arrasada

O Globo, Sociedade, p. 27
29 de Jun de 2018

Terra arrasada

POR RENATO GRANDELLE / SÉRGIO MATSUURA

A proteção de áreas florestais é uma das frentes de combate às mudanças climáticas, mas dados do projeto Global Forest Watch (GFW), coordenado pela ONG World Resources Institute com a Universidade de Maryland, nos EUA, mostram que os últimos dois anos registraram as maiores perdas de cobertura vegetal desde o início das medições, em 2001. Apenas em 2017, foram perdidos 294 mil km² de áreas verdes no planeta, o equivalente ao território da Itália. Nos últimos 16 anos, foram 3,4 milhões de km², área maior que o território da Índia.

A Rússia liderou o ranking global de perda de áreas verdes em 2017, com 52.900 km², seguida pelo Brasil, com 45.200 km², o equivalente ao estado do Rio de Janeiro. A lista segue com Canadá (25.600 km²), EUA (23.100 km²) e República Democrática do Congo (14.700 km²). Mikaela Weisse, analista da World Resources Institute, destaca que o ano passado perde apenas para 2016 (297 mil km²) em termos de redução da cobertura arbórea do planeta, apontando para uma tendência que pode minar os esforços globais de redução da emissão de gases estufa.
- Esses números expressam preocupação com a tendência de aumento na perda de cobertura arbórea no planeta, principalmente com os compromissos firmados no Acordo de Paris - alerta Mikaela. - É importante não olharmos apenas para a proteção das florestas primárias, mas também para incêndios em florestas secundárias e as emissões de carbono que eles provocam.
O GFW usa imagens de satélite com resolução de 30 metros para mensurar alterações na cobertura vegetal do planeta. Por esse motivo, o sistema detecta não apenas o desmatamento provocado intencionalmente pelo homem, como também perdas de matas provocadas por fenômenos naturais e incêndios florestais, que tendem a se recuperar com o tempo.
Nas regiões de altas latitudes, os incêndios são dominantes, respondendo por cerca de dois terços das perdas na Rússia e no Canadá, por exemplo. Nos trópicos, porém, a maior parte da destruição é provocada pelo homem - é o caso do Brasil, onde a Amazônia é arrasada por atividades econômicas como o cultivo de soja, a carne bovina e outras commodities.
Pesquisas anteriores do GFW indicaram que a preservação de áreas verdes podem contribuir para 30% da solução de problemas relacionados às mudanças climáticas, mas atualmente recebem apenas 2% de todo o financiamento associado ao tema.
Em 2017, as florestas tropicais perderam 158 mil km², sendo o Brasil o maior contribuidor. Desde o fim da década passada, o país vinha reduzindo a perda de cobertura florestal, mas, segundo os dados do GFW, os últimos dois anos apontam uma reversão dessa tendência. Mikaela explica que os números diferem das medições oficiais realizadas pelo governo brasileiro, com o projeto Prodes, que calcula apenas o desmatamento de florestas primárias de grandes áreas, e em um intervalo diferente do ano.
- Os dados do Prodes mostram resultados impressionantes no combate ao desmatamento de florestas primárias na Amazônia desde meados dos anos 2000, mas outros sistemas de monitoramento, além do GFW, indicam aumento da degradação em outras áreas de floresta, indicando que novas batalhas terão que ser travadas para manter a integridade ecológica da região - aponta Mikaela. - A alta nos últimos dois anos é explicada, em parte, pelo aumento no número de incêndios florestais provocados pelo El Niño e pela seca no Sul da Amazônia. E esses fenômenos tendem a se intensificar com as mudanças climáticas.
A agenda política também prejudica a preservação da áreas verdes, diz Mikaela.
- O Brasil passa por momento de incertezas políticas e econômicas - comenta. - Os cortes no orçamento das agências ambientais promovidos pelo presidente Michel Temer enviam sinais de reabertura da Amazônia para a exploração. Isso definitivamente tem impacto nesses números.
Coordenador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Jean Ometto assinala que a legislação brasileira ainda tem vácuos que permitem o desmatamento parcial de algumas áreas. Além disso, também falta um planejamento sobre os territórios cuja conservação deve ser prioritária.
- Há uma enorme pressão global por ações contundentes contra o desmatamento. Regiões como a Amazônia e o semiárido registram mudanças no padrão de chuvas e, em alguns casos, secas prolongadas - destaca. - Existem agravantes que mostram a importância em evitar o corte de áreas verdes, como a biodiversidade da floresta e as comunidades que dependem de seus recursos. É, portanto, um problema social e ambiental.

O Globo, 29/06/2018, Sociedade, p. 27

https://oglobo.globo.com/sociedade/em-apenas-um-ano-planeta-perde-uma-i…

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