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A tecnologia social

CB, Brasil, p. 12
09 de Jul de 2005

A tecnologia social
Exército promove cursos e ensina técnicas revolucionárias de baixo custo para a construção de casas, galpões e cisternas. Conhecimento será transmitido às populações que vivem nos confins da Amazônia brasileira

Erika Klingl

Imagine levantar uma casa de dois quartos com apenas R$ 4,5 mil. Ou um galpão de mais de cem metros quadrados por R$ 7,5 mil. Parece impossível. Agora imagine fazer isso no município de Pacaraima, na fronteira de Roraima com a Venezuela. A cidade está encravada num imenso vale cercado por montanhas e serras, dentro da reserva indígena São Marcos. Não é fácil levar material de construção ou suprimentos para o lugar. O cabo Antônio Alves da Silva, de 34 anos, é testemunha da dificuldade.
"Não temos acesso a tecnologias e tudo é mais difícil que nas cidades grandes", afirma.
Com a ajuda de técnicas trazidas de fora do Brasil, ou desenvolvidas pelo Exército Brasileiro, parte dos desafios geográficos e financeiros podem ser vencidos.
Para o tenente Antônio Márcio dos Santos Valente, de 25 anos, a dificuldade em se conseguir material é agravada pelas chuvas. Ele mora em Clevelândia do Norte, divisa do Amapá com a Guiana. "Em algumas épocas do ano, a estrada fica fechada
e a gente passa o tempo isolado do Brasil", conta o morador do Oiapoque - ponto mais ao norte do Brasil.
A tecnologia que possibilita a construção de moradias tão baratas em locais desabastecidos veio de longe. De um local mais distante que o Oiapoque ou Pacaraima.
A técnica é iraniana e foi adaptada pelo Exército ao Brasil. "Construímos paredes decasas e galpões com terra úmida em sacos empilhados. Depois é só colocar cobertura e cimentar o piso", explica o coronel Marcelo Augusto de Felippes, comandante do 11o Depósito de Suprimentos do Exército. Segundo o capitão Nilo Edson, uma das poucas diferenças entre a casa construída com superabobe no Brasil e a do Irã é o formato. "No Irã, a casa é arredondada e não precisa de um telhado trabalhado como aqui", explica. O problema é que nas fronteiras ao Norte do Brasil o clima é muito úmido, por isso é necessário um telhado reforçado para manter a construção seca.
"Desenvolvemos aqui a tecnologia de casa de sacos terra úmida retangular e com telhado.
Ela é muito resistente e com o mesmo baixo custo."
Futuro
A técnica é ensinada aos cabos, soldados e militares graduados que participam do programa Soldado Cidadão. "Ensina um futuro aos jovens que deixam o Exército depois de um ano", afirma Files. Mas também serve à população que vive em pequenas cidades de fronteira no Brasil.
Além de casas, o cabo Alves e o tenente Valente também aprenderam a construir em três dias uma cisterna de R$ 700, quase metade da que o governo federal constrói no semi-árido, e com capacidade de 25 mil litros.
"Isso vai ser muito precioso na fronteira. Tanto para o Exército quanto para a população que vive lá. Estou louco para voltar e ensinar a técnica a meus companheiros", comemora o cabo Alves.
"Os soldados podem sair doExército com uma chance de crescer honestamente fora das Forças Armadas", garante Felippes.
Por enquanto, a escola só funciona em Brasília. Mas, no ano que vem, a região do Amazonas e o Nordeste ganharão campus como o localizado atrás do Setor Militar Urbano. De acordo com o capitão Rocha Júnior, o projeto funciona há sete meses e começou com cursos rápidos aos militares que foram ao Haiti e para Timor Leste no ano passado. Mas, engana-se quem pensa que os soldados se animam apenas com a tecnologia de construção de casas ou cisternas.
"Em Clevelândia do Norte não existe emprego para todas as mulheres de militares. Não vejo a hora de passar adiante o que aprendi com a secagem de frutas ou a defumação de carnes", afirma o tenente Valente. "Isso pode ajudar a complementar a renda dos militares."

Boas idéias dos militares
Casa - com 52 metros quadrados, a casa custa R$ 4,5 mil. A construção é feita em sacos de terra empilhados e socados com uma umidade de 20%. A casa tem dois quartos, um banheiro e uma cozinha.
Galpão - por R$ 7,5 mil, os soldados constroem um galpão de mais de 100 metros quadrados que servem para depósito, enfermaria ou escola. O projeto do galpão, com as mesmas características da casa, foi desenvolvido no Exército.
Cisterna - com apenas três dias de trabalho, os com capacidade de armazenar 25 mil litros de água da chuva, captada pelas calhas do telhado. O projeto, feito com concreto e uma tela semelhante à usada em galinheiros, não sai por mais de R$ 700.
Piscina - A mesma combinação de concreto com tela de galinheiro serve para construir uma piscina com 180 mil litros de água. São necessários sete dias e R$ 6 mil. A técnica também serve para construção de tanques para criar peixes.
Defumador de alimentos - A idéia é aumentar o orçamento doméstico. E com apenas R$ 85, cem tijolos e um homem, é possível construir um forno para fazer carne seca ou lingüiça defumada.
Aquecedor de água -
O preço do aquecedor solar varia com o número de placas de PVC que serão usadas, mas não chega nem a 30% do que os que estão à venda no mercado. O aquecedor demora duas horas para colocar cem litros
de água em 56oC.

CB, 09/07/2005, Brasil, p. 12

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