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Sustentabilidade do manejo florestal está na escala da produção

Página 20-Rio Branco-AC
18 de Out de 2004

Engenheiro agrônomo, o acreano Herbert Cavalcante de Lima ocupa hoje a Diretoria Executiva da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa) nacional, sendo o coordenador-geral das pesquisas que se realizam em toda a Amazônia com especial atenção sobre os resultados que vêm sendo obtidos nos projetos de manejo florestal.

Alguns poderiam destacar apenas o salto qualitativo de comunidades como as dos ramais Granada e Nabor Júnior, que até o fim do ano passado vendiam o metro cúbico de madeira serrada a, no máximo, R$ 200, e ao conquistar a certificação, em dezembro, venderam toda a produção deste ano a R$ 900 o metro cúbico para uma empresa paulista.

No entanto, ele não esconde as dificuldades que essa atividade, relativamente nova, vem enfrentando dificuldades na organização de comunidades, para a orientação e o acompanhamento técnico destas, transporte e beneficiamento adequado da matéria-prima, desenvolvimento de design e a conquista de certificações que agreguem valor aos produtos florestais e garantam renda mais justa para o produtor.

A soma desses diversos fatores tem como principal objetivo a manutenção da atividade madeireira de um modo econômico, social e ambientalmente sustentável, ao qual devem ser agregadas a qualidade e a regularidade de fornecimento para um mercado cada vez mais sofisticado e exigente.

Defendendo o direito dos seringueiros sobre a floresta, Chico Mendes propôs a criação de Reservas Extrativistas, modelo copiado por muitos países de todo o mundo. Qual é a experiência acreana em destaque neste momento?

O manejo florestal comunitário. Ele tem como característica principal a valorização do homem que vive na floresta. Isso porque os projetos empresariais vão muito bem, mas o produtor da madeira pouco ou nada tem lucrado com isso e o desafio que estamos vencendo aqui é o de garantir a melhoria da qualidade de vida a essas pessoas.

Como chegar a isso?

Tirando o manejo do papel para a prática e encarando nossas limitações e vantagens. Vivemos numa região em que tudo é distante, as condições de transporte são precárias e muitas espécies ainda não foram suficientemente estudadas. Mas contamos com um povo que decidiu viver em harmonia com esta floresta rica em espécies, um clima que nos transforma numa estufa natural para a produção de plantas tropicais desejadas em todo o mundo e um governo baseado na florestania. A soma disso tudo tem produzido os resultados práticos mais animadores do Brasil.

Teria algum exemplo específico?

Vários. Entre eles destacaria o mais recente: o manejo florestal que está sendo realizado pelas famílias do projeto de colonização Peixoto nos ramais Granada e Nabor Júnior, que já estão com toda a sua produção de madeira certificada, deste ano, vendida por antecipação para uma empresa de São Paulo.

Qual a receita do sucesso?

É uma mistura de vários ingredientes que começam pela vontade política do governo e disposição dos órgãos responsáveis pelo setor. Mas é essencial o nível de interesse, conscientização e de organização das comunidades que propõem realizar essa atividade. Tudo pesa na balança.

Por falar em balança, vemos muitos projetos com uma bela proposta teórica, mas que não se sustentariam sozinhos de forma prática. Como atingir o ponto de equilíbrio entre a preservação ambiental, a necessidade de obter lucro e a justiça social ao produtor?

O segredo é juntar os requisitos que já citamos acima à produção em escala. O mérito desse projeto do Peixoto está em provar que é possível fazer manejo florestal utilizando apenas a reserva legal das pequenas propriedades e com isso melhorar as condições de vida do produtor.

Mas onde fica o ponto de equilíbrio?

Como em qualquer atividade, o equilíbrio está no momento em que o faturamento líquido consegue superar as despesas oferecendo lucro efetivo ao produtor e depois de anos de pesquisa é isso que conseguimos no Peixoto. Ali, 17 famílias estão manejando quatro hectares por ano com uma produção média de 30 metros cúbicos por ano em cada talião desses.

Isso convertido em dinheiro, quanto significaria?

O ponto forte desse trabalho é a união da comunidade e sua crença em que daria certo. A segunda é otimizar resultados. A serraria móvel fica à disposição de cada família por dez dias, quem tirar oito metros cúbicos lucra R$ 480, se forem 12 metros cúbicos darão R$ 1.328 e no caso de serem quinze metros cúbicos, ganha R$ 3.090. Esses valores são o que resta depois de retiradas as despesas. Note que o lucro cresce rapidamente à medida que a produção vai atingindo uma escala cada vez maior. Isso acontece porque a despesa para trabalhar pouca ou muita madeira é praticamente a mesma, o lucro está em produzir mais em menos tempo e com menor esforço.

Há mercado garantido?

Há países que só estão aceitando a entrada de madeira certificada como forma de ajudar a combater o desmatamento desenfreado das florestas tropicais, mas reconheço que o mercado ainda não tem dado a resposta que desejamos com relação ao preço e à aceitação das variedades.

O mercado ainda segue o modelo tradicional...

É isso. Querem madeira manejada que seja cedro, cerejeira e outras espécies bastante conhecidas. Nesse momento é necessário fazer exposições e uma ampla campanha de divulgação das demais espécies madeireiras que temos, as quais são tão boas ou melhores que as conhecidas pelo mercado. A valorização dessas novas variedades é que viabiliza a sustentabilidade do manejo, do contrário continuaríamos praticando a derrubada seletiva de espécies de maior interesse econômico. O que sempre combatemos.

Qual seria a solução ideal para esse impasse?

Temos montado uma rede de colaboração que funciona mais ou menos assim: a Embrapa realiza pesquisas e orienta os produtores, os quais, por sua vez, se organizam em sistemas de associação ou cooperativas que comercializam a produção sob a orientação de técnicos do Sebrae. O sucesso disso depende do comprometimento de cada um fazendo a sua parte.

Onde a atividade está estrangulada?

A comercialização continuará sendo o nó principal até que as novas variedades sejam conhecidas da população. A exemplo do que existe com outros produtos como a soja ou o milho, que são defendidos pelo setor de agronegócios, necessitamos criar nosso espaço para os Produtos Florestais na Câmara Setorial do Comérciom, que assim passariam a ser disputados na Bolsa de Valores.

Algo mais a corrigir?

Também é necessário corrigir algumas coisas na proposta inicial. O produtor não tem que ser madeireiro, muito menos marceneiro ou comerciante, cada um tem sua vocação. Então é necessário, a exemplo do que fazem as grandes empresas, terceirizar serviços, repassando-os a quem se preparou para isso. O processo de produção e comercialização exige mudanças constantes de comportamento para adaptar-se às necessidades e preferências do mercado.

A venda de madeira garantirá a manutenção dessas pequenas propriedades?

O manejo em pequenas propriedades tem como objetivo dar aproveitamento à matéria-prima, tornando as áreas de reserva legal produtivas, o que estimulará o proprietário a preservá-las. Do ponto de vista dos resultados, ela dá lucro, mas funcionará como mais um complemento da renda familiar numa propriedade que deve sobreviver da diversificação de atividades que vão da fruticultura, agricultura e criação de pequenos animais, atividades que estão sendo incentivadas pelos técnicos da Seater.

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