CMI-Centro de Mídia Independente
Autor: Francisco Andrade de Lima
28 de Set de 2007
O município de Tefé, situado no coração da Amazônia, à margem esquerda do Rio Solimões, com sede na margem esquerda do Lago de Tefé, uma população estimada em 71.975 (setenta e um mil novecentos e setenta e cinco) habitantes (estimativa do IBGE em 01/07/2006), ocupa uma área de 23.704 Km2 (vinte e três mil setecentos e quatro quilômetros quadrados).
Pela resolução n.o 44 de 15 de junho de 1855, Tefé é elevada a categoria de cidade. Desde esta data, o Município de Tefé vem lutando pelo seu desenvolvimento e progresso. Muitas coisas aconteceram durante esses quase 152 (cento e cinqüenta e dois) anos de história. A população já vivenciou muitas conquistas e decepções.
Nos últimos anos, tem se intensificado a discussão acerca do crescimento e do desenvolvimento de Tefé, muito tem se falado, inclusive uma possível divisão do Estado do Amazonas, e a criação do Estado do Solimões, onde Tefé seria a Capital, mas por enquanto são apenas falácias.
O principal meio de transporte utilizado pela população tefeense é o barco, ou seja, é o fluvial. Há muito tempo vem se reivindicando a construção de um porto para este município, pois como disse, o principal meio de transporte utilizado para transportar pessoas e produtos é o transporte fluvial, podemos dizer que nossas estradas são os rios.
Em função desta vontade de crescer e desenvolver-se, foi aprovado pelo Ministério dos Transportes ainda no primeiro mandato do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na Gestão do Ministro Alfredo Nascimento, a liberação de verba para a construção deste tão sonhado porto. No dia 06 de fevereiro de 2006, foi lançada a concorrência n.o 067/2005 - CGL: Contratação de Pessoa Jurídica Especializada em Obras e Serviços de Engenharia para a construção do Porto de Tefé - AM - Secretaria de Estado de Infra-estrutura - SEINF.
O Porto de Tefé já está incluído na Relação descritiva dos Portos Marítimos, Fluviais e Lacustres do Plano Nacional de Viação.
São vários os argumentos para a construção deste porto:
? Dispor de um local adequado para embarque e desembarque de passageiros;
? Escoamento da produção local;
? Recebimento de produtos para serem vendidos pelo comércio local;
? Geração de empregos para a população.
Esses são os principais argumentos para construir um porto em Tefé, o local escolhido foi o antigo porto da EMADE (Empresa Amazonense de Dendê). Para a construção deste porto, se faz necessário o asfaltamento da Estrada da EMADE.
Para a escolha da localização do porto, não foi feita uma consulta popular, aliás, não se sabe ao certo a forma que foi feita. O que se sabe são apenas alguns argumentos para a escolha deste local.
O argumento principal é que no período da seca o lago de Tefé fica raso, ou seja, seco, a ponto de não dar passagem para os recreios (barcos que transportam passageiros e pequenas cargas). Neste local escolhido qualquer recreio ou barco de grande porte poderá atracar, até navios conseguirão chegar.
Um outro problema que não está se levando em conta é que na região escolhida para a construção do porto, existem 4 (quatro) Comunidades indígenas das etnias Tikuna, Kokama e Kambeba, com uma população estimada em 754 (setecentos e cinqüenta e quatro) habitantes (dados da ACPIMSA - Associação Cultural dos Povos Indígenas do Médio Solimões e afluentes).
A ACPIMSA salienta a preocupação com o impacto que a construção deste porto trará a esta população que ficam no entorno. A coordenação teme a invasão da terra, o aumento do consumo do álcool, a prostituição dos adolescentes e jovens, o aumento da violência. Esta preocupação é partilhada também pelo CIMI - Conselho Indigenista Missionário da Prelazia de Tefé e pela FUNAI - Fundação Nacional do Índio que também tem atuação junto aos povos indígenas desta região.
Segundo a ACPIMSA, a construção do porto de Tefé no antigo Porto da EMADE, não era do conhecimento das comunidades, pois os mesmos nem sabiam de tal fato. Hoje há uma preocupação acerca deste fato.
A ACPIMSA, em parceria com outras instituições, UEA, IDAM, FUNAI, IBAMA, UNI-TEFÉ e MARINHA, fizeram um movimento organizado para discutir e esclarecer sobre os possíveis problemas que serão enfrentados pelas comunidades como o alcoolismo, drogas, prostituição, invasão das terras na extrema da estrada da EMADE. Falou-se inclusive da construção de um muro de proteção para evitar invasões.
Em 2006 a ACPIMSA, UNI-TEFÉ e FUNAI organizaram um movimento para embargar a construção da estrada de acesso ao porto através de um abaixo-assinado, que chegou nas mãos do Governador do estado, o mesmo enviou um representante para negociar com as comunidades e as instituições. Depois de fazer um acordo com as lideranças das comunidades se comprometendo a melhorar o desenvolvimento social, incluir as comunidades no programa luz para todos do Governo Federal, pavimentar as ruas, e ajudar no escoamento da produção, puderam continuar a obra.
Já houve uma experiência anterior de um porto próximo a essas comunidades, quando funcionou a plantação e escoamento do Dendê pela EMADE - Empresa Amazonense de Dendê, em 1982 esta empresa chegou com o objetivo de criar fontes de energia com a extração do óleo de dendê, conseguiram plantar cerca de 2000 (duas mil) hectares, com mais de 20000 (vinte mil) árvores. Segundo algumas lideranças foi um total desrespeito com os moradores, uma vez que a estrada simplesmente saía dentro das aldeias cortando o quintal das pessoas. Depois de muita pressão a estrada foi desviada para fora da terra e até hoje a EMADE responde a um processo. A empresa faliu, por desvios de verbas e nunca pagou o prejuízo causado.
É claro que dentro das comunidades existem pessoas que acham que a construção do porto na EMADE trará benefícios, pois facilitará o escoamento da produção, do transporte via estrada, principalmente para os alunos. A negociação do Governo do Estado também ajudou a alguns comunitários a concordarem com a construção deste porto.
Também no entorno das comunidades indígenas, moram agricultores que vêem na construção do porto e no asfaltamento da estrada uma vida melhor, pois, segundo eles conseguirão escoar suas produções, e com isso melhorarão as condições de trabalho, podendo assim ter uma vida melhor.
É unânime a necessidade do município de Tefé ter um porto adequado, pois um porto não vem resolver somente o problema do transporte de pessoas e de cargas, mais também ajudar na diminuição do desemprego, sem duvida trará desenvolvimento e progresso para este município. Mas não pode ser feito de qualquer jeito, se faz necessária uma reflexão séria, quanto ao local de instalação do mesmo. Não se pode ir pelo "lado mais fácil", mas devemos sim nos preocupar com as conseqüências que uma obra desta poderá trazer para um povo.
Faz-se necessário que a população seja consultada acerca do local de tal obra, um porto depois de instalado em um determinado local, não se pode mais retirá-lo, ou não se conseguirá retirá-lo com a mesma facilidade que foi construído.
Por isso, há a necessidade de analisar bem todos os impactos que trará, medir bem as conseqüências, sociais, ambientais, culturais, econômicas, para que não afete tanto aqueles e aquelas que residem no entorno ou nas proximidades do porto.
O CIMI nos diz que todos nós devemos assumir uma postura de observação e de denúncia a fim de amenizar o máximo possível os impactos negativos produzidos pelo porto ou qualquer outra obra. Também a FUNAI nos convida a uma atitude de observação, "devemos ficar atentos aos acontecimentos". A ACPIMSA declara uma preocupação muito intensa no que diz respeito à cultura dos povos que ali vivem.
E nós que resposta vamos dar a esta situação? Em primeiro lugar devemos procurar nos colocar no lugar de quem está vivenciando o problema não podemos simplesmente achar que o porto será uma "maravilha", antes temos que medir as conseqüências que trará. Por outro lado, não podemos desistir e nem perder as esperanças de melhorar as condições de vida, tanto nossa quanto da população de um modo geral.
O Município de Tefé precisa ter um porto, isto não se faz necessário discutir, mas o local da construção do mesmo deve sim ser discutido, não se deve simplesmente alguém dizer onde, mais sim a população, quem sabe até, uma audiência pública para definir onde construir o porto não seria a forma mais democrática de definir e dar uma solução ao problema.
O "sonho não pode virar pesadelo", o progresso não pode ser construído em cima da "desgraça" de ninguém, a história nos mostra o quanto essa prática foi utilizada, não podemos aceitar tal situação. Também não podemos perder as esperanças em um futuro melhor, com uma vida mais digna, com qualidade.
Devemos continuar sonhando com uma cidade melhor, e o porto vem ajudar a melhorar a vida de muita gente, portanto, vamos continuar atentos às decisões, sabemos que o Governo federal já disponibilizou os recursos necessários para a construção do Porto de Tefé.
Se somos seres sociais, e de fato o somos, devemos nos preocupar com o progresso e o desenvolvimento do outro. Cabe agora fiscalizarmos a execução da obra, se não há mais jeito de mudarmos a localização do porto, vamos fazer o que o CIMI, a FUNAI e a ACPIMSA nos convidam a fazer, ficar atentos, em uma atitude de denúncia quando vermos que trará prejuízos para os povos que ali vivem a séculos, procurando ajudá-los a também eles terem uma vida melhor.
As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.