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Soluções simples. E não se perde água

OESP, Cidades, p. C3
08 de Fev de 2004

Soluções simples. E não se perde água
Reduzir os solos impermeáveis e reter a chuva ajudam a diminuir o impacto das cheias

Eduardo Nunomura

Graças ao Plano Diretor de Macrodrenagem Urbana da Bacia do Alto Tietê, aumentou a consciência dos políticos de que as soluções precisam ser discutidas sem limitações geográficas e mesmo as pequenas medidas não devem ser ignoradas. São Bernardo do Campo dá o exemplo. Dez mil casas em área de manancial - lá fica a Represa Billings - já possuem calçadas ecológicas. Em vez de cimentar até o último centímetro de terra, o calçamento precisa ter quase metade de sua área coberta por grama. Na mesma região, 40 quilômetros de asfalto poroso permitem a absorção imediata das águas das chuvas, que penetram no lençol freático e abastecem a represa.
Em São Paulo, a proposta para a nova Lei de Zoneamento pretende aumentar os índices de permeabilidade do solo. Num terreno de mil metros quadrados em zona residencial, 300 teriam de ser de terra ou grama, ante os atuais 150. É um rigor maior à cultura desenfreada de pavimentação. Das 45 mil ruas da capital, 30 mil são pavimentadas. Elas vão sendo asfaltadas a uma velocidade de 14 quilômetros por mês.
A verticalização da cidade também deveria merecer um tratamento mais sério dos planejadores urbanos. A cada prédio erguido, construtoras acabam empurrando alguns metros para baixo os níveis do lençol d'água. Tudo para construir garagens sequinhas. O problema é que esse processo de bombeamento acaba por diminuir ainda mais a capacidade de absorver água no solo.
Desperdício - Já outra regulamentação municipal, a Lei das Piscininhas, exige que novas construções em área superior a 500 metros quadrados devem conter um reservatório de no mínimo 4.500 litros. É o suficiente para reter uma hora de chuva de verão. "Seria uma lei plena, se ela previsse também o reuso da água. Mas isso ainda não é permitido por causa de outra legislação", explicou Adriano Diogo, da Secretaria do Verde e Meio Ambiente e autor do projeto.
A Lei das Piscininhas ajudaria a responder em parte a questão da falta de água, cujo rodízio é praticamente certo nos verões. Se dependesse da vontade do secretário, cada paulistano seria um potencial poupador de água. Com técnicas adequadas de armazenamento, para evitar a proliferação de doenças como a dengue, ele poderia acumular água das chuvas que caem nos telhados e a reutilizaria para regar jardins, lavar carros e garagens - jamais para beber.
Em termos práticos, significa deixar fechada a mangueira que jorra água potável e faz tanta falta para uma região com 19 milhões de habitantes. "Fiz a lei para lançarmos o debate na sociedade. É uma vergonha nacional que o País não possa reaproveitar sua água", afirmou Diogo.
Sem isso, alguns são obrigados a conviver com racionamento e outros podem se dar ao luxo de esbanjar consumindo diariamente 600 litros de água. "O uso racional e o reaproveitamento bem-feito contribuiriam para evitarmos a escassez do produto", disse o superintendente da unidade de produção da Sabesp, Paulo Massato. Por ter problemas hercúleos, São Paulo acaba ignorando soluções pequenas que, juntas, geram resultados surpreendentes.
Limpeza - Uma delas é a conservação de córregos, galerias e bocas-de-lobo. Um papel de bala atirado pela janela do carro é desprezível, mas como milhares de paulistanos cultivam o mesmo péssimo hábito a soma deles entope bueiros e mais bueiros. No ano passado, a Prefeitura gastou R$ 42 milhões só para essa tarefa. Quantia que poderia ser menor ou mais bem aproveitada. "No período chuvoso, dividimos equipes para atender emergências e continuar no preventivo, senão teríamos ainda mais socorros", disse o assessor da Secretaria das Subprefeituras Sergio Aparecido Rodrigues Pereira.
Resta, no fim, o doloroso trabalho de remoção de entulho e auxílio financeiro às vítimas das enchentes. São Paulo tem 192 áreas de risco e nelas há 522 setores críticos. São 27.500 moradias em locais potencialmente perigosos. "Toda obra tem um limite. A solução definitiva? Só se essas famílias fossem removidas", resumiu Agostinho Ogura, geólogo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas. (Colaborou Iuri Pitta)

OESP, 08/02/2004, Cidades, p. C3

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