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Sol ganha força como fonte de energia

OESP, Vida, p. A27
11 de Mar de 2007

Sol ganha força como fonte de energia
Brasil tem um dos maiores potenciais do mundo, mas usa sistema apenas para aquecer água de piscina e ducha

O ex-ministro Jarbas Passarinho, de 87 anos, foi um pioneiro. Há cerca de 20 anos, quando quase ninguém se preocupava com energias limpas, Passarinho mandou instalar um sistema de energia solar na casa onde mora até hoje, no Lago Norte, em Brasília. Hoje, quando até o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, propõe uma parceria com o Brasil para a produção de energia alternativa como forma de combate ao aquecimento global, Passarinho sente-se recompensado.

Não só pela economia que fez ao optar pelo aquecimento da água dos chuveiros e das torneiras com energia solar, mas porque seus vizinhos também aderiram em massa a essa fonte energética. 'Sou um adepto de energia alternativa. Aqui em Brasília há sol à vontade. O resultado tem sido espetacular', afirma. 'Neste ano está chovendo como nunca. Mas, quando o sol aparece um pouquinho, logo a água está quente. Outro dia, ao abrir a torneira, quase queimei a mão.'

Há quatro anos, quem sobrevoava os bairros mais ricos de Brasília, como Lago Norte, Lago Sul e Park Way, via uma imensidade de pontos azuis espalhados. Eram as milhares de piscinas instaladas em residências, numa região marcada por uma longa estação quente e seca.

Hoje, o passageiro de avião continua a ver os pontos azuis, mas ao lado de grandes espelhos instalados sobre os telhados das casas. São as placas de captação de energia solar. Calcula-se que 90% das residências dos três setores nobres da capital já contem com energia solar para aquecimento de banheiros e piscinas. Dos projetos de novas edificações, 100% já vêm com energia solar.

Não é para menos. O Planalto Central, onde se localiza Brasília, é um dos locais mais privilegiados do País em luz solar. O sol é constante de maio a agosto, período da seca. E, mesmo de setembro a maio, época em que as chuvas são abundantes, raramente há um dia em que o sol não apareça pelo menos durante algumas horas.

SISTEMA CARO

A instalação do sistema de aquecimento de chuveiros para casas que têm até cinco quartos e igual número de banheiros fica entre R$ 4 mil e R$ 6 mil; o de piscinas, chega a R$ 8 mil. 'É um sistema ainda caro, que leva cerca de dois anos para ser pago. A vantagem é que depois praticamente não tem manutenção. E a economia de energia elétrica é para sempre', diz Lúcia Bicalho, gerente de uma das 25 lojas especializadas em instalação e manutenção de energia solar de Brasília. Ao todo, só essa loja atende 550 novos clientes em média por ano, cerca de dois por dia útil.

Há algum tempo, lembra Lúcia, a procura por energia solar era só de moradores de maior poder aquisitivo. Hoje isso mudou. Além do interesse pela energia solar dos cerca de 400 mil moradores de classe média-alta das centenas de condomínios que surgiram às margens do Lago Paranoá, pessoas de menor poder aquisitivo de cidades-satélites como Ceilândia, Taguatinga, Gama e Brazlândia também estão aderindo à nova moda para o consumo de energia. 'Hoje nós vendemos mais para lá do que para os Lagos e Park Way', diz José Lourenço Neto, gerente de uma empresa especializada em aquecimento de piscinas.

O Palácio da Alvorada, onde mora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem a piscina, os chuveiros e a água das torneiras aquecidas por energia solar. Os espelhos de captação foram instalados por ordem do então presidente Fernando Henrique Cardoso, que adorava mergulhar pela manhã e à noite na piscina aquecida do quintal palaciano. Lula, ao que se sabe, não é um apreciador dos mergulhos noturnos. Prefere as caminhadas. Mas, se quiser nadar, não importa a hora, vai encontrar a água da piscina sempre quentinha. Quando seus filhos e parentes viajam para Brasília, esbaldam-se com as águas quentes da piscina. E até divulgam as fotos em comunidades da internet.

INCENTIVO OFICIAL

Apesar da previsão de que se o Produto Interno Bruto (PIB) do País crescer acima de 5% ao ano haverá risco de apagão de energia elétrica em 2009, não há ainda no governo federal nenhum programa de incentivo ao uso da energia solar. Mas haverá um até o fim do ano.

'Estamos preparando um projeto que deverá ser lançado até o fim do ano para estender o uso da energia solar para o aquecimento de chuveiros para todas as camadas sociais', conta Paulo de Tarso de Alexandria Cruz, coordenador-geral de Eficiência de Energia do Ministério de Minas e Energia.

Segundo ele, um dos grandes problemas para as distribuidoras de energia é justamente o chuveiro. 'Hoje, no fim do dia, as distribuidoras são obrigadas a direcionar a energia para as residências porque vai começar um pico violentíssimo de gasto de energia quando os chuveiros começam a ser ligados', diz. 'A energia elétrica é muito cara e muito nobre para ser usada no aquecimento de água de chuveiro, além de gerar uma sobrecarga muito perigosa.' Hoje, diz Paulo de Tarso, a Caixa Econômica Federal tem um projeto de financiamento de energia solar com juros abaixo dos do mercado.

O Brasil tem um dos maiores potenciais para a energia solar, afirma Ricardo Ruther, professor da Universidade Federal de Santa Catarina. 'Só para se ter uma idéia, uma área do tamanho do lago de Itaipu com placas coletoras de energia solar é suficiente para gerar o mesmo número de megawatts que Itaipu gera. Como há perda de energia elétrica na geração e na distribuição, os coletores de energia solar postos sobre os telhados de casas e edifícios são mais eficientes, porque nada é perdido.'

Ele lembra que Brasília tem um dos maiores potenciais de captação de energia solar do País, 50% acima de Florianópolis e muito superior à da Alemanha, o país que mais usa energia solar no mundo. Por ano, segundo Ruther, a Alemanha consegue instalar em energia solar o equivalente a mil megawatts - metade da produção de Angras 1 e 2.

BA, PE e PI têm maior potencial de captação
Bahia, Pernambuco, Piauí, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Tocantins e as regiões Sudeste e Sul são, nessa ordem, as áreas mais apropriadas para a captação de energia solar, de acordo com dados do Projeto Swera (Solar and Wind Energy Resource Assessment), financiado pelo Programa do Meio Ambiente das Nações Unidas.

O projeto vem sendo realizado por cientistas brasileiros desde 2001. Consiste no detalhamento do potencial de energia solar e eólica do País.

De acordo com os estudos já feitos até agora, no dia menos ensolarado e mais nublado do ano, a incidência de radiação solar é de 3,6 quilowatts/hora (kWh) por metro quadrado no Rio e de 4,5 kWh no Ceará. Já na Alemanha, onde a energia solar é mais usada, o potencial é de 0,8 kWh por metro quadrado, de acordo com informação dada à Eletrobrás por Stefan Krauter, presidente para a América Latina do Conselho Mundial de Energias Renováveis.

Conforme os estudos realizados por Krauter, a capacidade de geração de energia de fonte solar é cerca de 14 mil vezes maior do que o consumo energético mundial necessário.

EQUIPAMENTO IMPORTADO

Apesar dos reconhecidos benefícios da energia solar, em locais como Brasília seu uso é quase que somente para o aquecimento de água.

Isto porque a produção de energia solar destinada à geração de energia elétrica para o consumo de aparelhos eletrodomésticos e lâmpadas, chamada de fotovoltaica, é excessivamente cara. Além disso, o equipamento é 100% importado.

Na região do Vale do Jequitinhonha, no nordeste de Minas, a geração de energia solar para alimentação de aparelhos eletrodomésticos de consumo pequeno é bem conhecida da população. De acordo com Roberto Devienni, representante em Brasília da ONG Rede Nacional de Energias Renováveis, há 15 anos a distribuidora de energia de Minas ofereceu à população local equipamentos de captação de energia solar, porque ficava mais barato instalá-los nas residências de baixo consumo de energia do que levar para o Vale do Jequitinhonha novas redes de transmissão de energia.

Prós e contras
Brasil tem um dos maiores potenciais do mundo, mas usa sistema apenas para aquecer água de piscina e ducha

João Domingos

Não poluente: A energia solar não polui durante o uso. A poluição decorrente da fabricação dos equipamentos usados na construção do painel solar é controlável

Economia: Os painéis solares são cada dia mais potentes, e o custo vem diminuindo

Viabilidade: Em países tropicais, como o Brasil, o uso da energia solar é viável em todo o território. Em locais distantes de centros de produção energética, a utilização ajuda a diminuir a demanda e a perda na transmissão

Insuficiência: De acordo com o clima, existe variação na quantia produzida de energia. À noite não há produção, obrigando a adotar outro meio de armazenamento

Variação: Locais com freqüente cobertura de nuvens tendem a ter oscilação na geração de energia

Instabilidade: As formas de armazenamento da energia solar são pouco eficientes quando comparadas a combustíveis fósseis (carvão e petróleo), energia hidrelétrica (água) e biomassa (bagaço da cana)

OESP, 11/03/2007, Vida, p. A27

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