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Sodiur diz que crime serve de pretexto

Folha de Boa Vista-Boa Vista-RR
15 de Jan de 2003

Silvestre Leocádio: "Crime requer apuração rigorosa para punir culpados"

"A morte do índio Aldo da Silva Mota pode ser o ponto de partida definitivo para a homologação da reserva indígena Raposa-Serra do Sol em área contínua. Isso será desastroso para o Estado". A afirmação é do presidente da Sodiur (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima), Silvestre Leocádio da Silva.

A homologação em área contínua dos 1,6 milhão de metros quadrados, com a efetiva retirada dos rizicultores (plantadores de arroz) e fazendeiros ou pequenos proprietários, contraria os interesses de parte das comunidades indígenas da região que defendem a reserva demarcada em ilhas.

"É triste a gente saber que um pequeno desentendimento tenha terminado na morte de um índio", lamentou Leocádio, questionando quem vai pagar pela vida do "parente" morto. "Se o índio soubesse que iria morrer, jamais teria aceitado a incumbência de se expor da forma como fez, obedecendo a ordens de terceiros. Agora, nem toda demarcação do mundo pode pagar pela vida dele".

Para o presidente da Sodiur, os "terceiros" que semeiam a intransigência e o ódio na região seriam conhecidos: integrantes da Igreja Católica e o próprio CIR (Conselho Indígena de Roraima). "Essas pessoas e entidades que deveriam ter como objetivo principal pregar não a guerra, mas a paz".

Leocádio acusou frontalmente os padres ligados à Diocese de Roraima, assim como o CIR, de fomentarem a intriga entre "parentes". "Eu mesmo durante longos anos ajudei a planejar ações terroristas dentro da área Raposa-Serra do Sol. Eu sei como é isso", disse.

Ele assegura que jamais esteve na linha de frente, mas quando trabalhava para a Diocese, 14 anos como funcionário dos padres, ajudou a preparar e planejar a derrubada de pontes, de torres, queima de casas de fazendas, além de vários outros ataques com o objetivo de semear o ódio e a discórdia. "Eu era empregado deles e era obrigado a fazer isso", justifica-se Leocádio.

ESTRATÉGIA
O índio macuxi Aldo Mota, morto provavelmente no dia 02 deste mês, fazia parte da comunidade indígena de Willimon, maloca plantada a mais de 40 quilômetros de distância do local onde foi morto, a fazenda Retiro, do vereador Francisco das Chagas Oliveira, o "Chico Tripa". Essa fazenda fica localizada a cerca de 30 minutos da vila de Mutum.

A ida de Aldo até a fazenda constitui um ponto a ser questionado, segundo a visão do vice-prefeito de Uiramutã, o também índio macuxi José Novais. Uma perambulação de tamanha envergadura reforça a idéia de provocação argüida pelos líderes da Sodiur, especialmente pelo seu presidente, Silvestre Leocádio.

Tanto Leocádio quanto José Novais concordam que Aldo fora incitado a provocar os vaqueiros da única propriedade não índia que explora a pecuária na região, visando a ocorrência de um fato grave. Assim, o circo estaria formado, não na região ou mesmo em Boa Vista, mas sim em Brasília, caixa de ressonância de todos os conflitos.

"A estratégia deu certo", disse Leocádio, lembrando "a forma como o CIR agiu, enviando cartas para autoridades federais e plantando a notícia de uma maneira extremamente fantasiosa na imprensa nacional". Segundo ele, para o Brasil inteiro, o que está acontecendo em Roraima é um conflito armado entre índios e não índios, quando na verdade tudo não passou de uma briga pessoal, onde lamentavelmente um índio foi morto.

Quando a Polícia Federal e homens da Polícia Militar chegaram ao local, na quinta-feira, encontraram a fazenda cercada por aproximadamente 200 índios ligados ao CIR. Depois que o corpo de Aldo foi retirado, os índios se dispersaram e não mais se teve notícia de qualquer ajuntamento de índios na região.

Na tarde de sexta-feira na sede de Uiramutã e na vila de Mutum não havia qualquer movimentação com relação ao fato ocorrido na fazenda Retiro. Essa calmaria é citada por Leocádio e de Novais como uma tese de que tudo não passou de uma armação para chamar a atenção de Brasília para a região. A PF e a PM deixaram o Município ainda na sexta-feira pela manhã.

"A Sodiur não compactua com a morte de ninguém, seja de índio ou não índio", assegura Leocádio. O desejo da entidade, segundo ele, é que a Justiça apure o que aconteceu e puna os culpados. "Mas não admitimos que o caso seja tratado com má-fé por parte do CIR ou da Igreja Católica. Agir por emoção, sem ouvir a razão, pode terminar na desarticulação do Município de Uiramutã e a total retirada de não índios da região".

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