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Sob Lula, invasões de terra se espalham e aumentam 24%

FSP, Brasil, p. A4
07 de Mai de 2007

Sob Lula, invasões de terra se espalham e aumentam 24%
Em comparação com segundo governo FHC, houve ações em maior número de cidades
Ministro da administração tucana vê expectativa de impunidade com petista, do que discorda o atual titular do Desenvolvimento Agrário

Thiago Reis
João Carlos Magalhães
Da agência Folha

No primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, os movimentos de trabalhadores sem-terra aumentaram o número de invasões de terra e ampliaram o seu campo de atuação em relação ao segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002).
Foram 1.708 invasões no primeiro governo Lula e 1.379 nos últimos quatro anos do tucano Fernando Henrique Cardoso, segundo a CPT (Comissão Pastoral da Terra) -aumento de 24% na administração petista.
Levantamento da Folha a partir desses dados revela que aumentou também em 24% o número de municípios com propriedades invadidas em relação ao segundo governo FHC. No primeiro mandato de Lula, houve invasões em 790 cidades -14% do total de municípios do país. Nos últimos quatro de FHC, foram 638.
Marabá (PA) lidera a lista das cidades com mais invasões no governo Lula. Foram 23. Bonito (PE) ficou em segundo, com 18. Teodoro Sampaio (SP), no Pontal do Paranapanema, 17, assim como Maragogi (AL).
Em quinto lugar, aparece Caruaru (PE), com 16 invasões. No segundo governo FHC, Marabá também ficou na primeira posição, com 16 ações.

Causas
Especialistas divergem sobre a causa da pulverização das ações. Para Bernardo Mançano, da Unesp (Universidade Estadual Paulista), ela é resultado da expansão do agronegócio, que ampliou os conflitos. "Não se trata de uma opção apenas política, mas do resultado direto do crescimento de um modelo concentrador e excludente."
O deputado federal Raul Jungmann (PPS-PE), que foi ministro do Desenvolvimento Agrário no segundo governo de FHC, afirma que o otimismo dos movimentos sociais com o aliado histórico Lula gerou uma expectativa de impunidade. "Eles pensavam: "É só ocupar que o Lula resolve"."
Ele cita também o não-cumprimento da medida provisória 2.027, de 2000, que impede a vistoria e a desapropriação de áreas invadidas, como outro fator para a impunidade. "Foi criado um vazio jurídico."
O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel (PT-RS), rebate. "Houve uma expectativa legítima e justa, mas não impunidade. O governo tem cumplicidade com a luta pela reforma agrária."

Mais movimentos
Já Ariovaldo Umbelino de Oliveira, da USP, cita o aumento no número de movimentos agrários como um dos motivos para a nova geografia das invasões. "Os outros movimentos [afora MST] estão invadindo muito mais."
De acordo com os dados da CPT, o MST foi responsável, durante os três primeiros anos sob Lula, por quase 60% das ações. Apenas em 2006 -ano eleitoral-, o movimento diminuiu o ímpeto, com 212 invasões (53% do total). Ainda assim, os outros movimentos mantiveram as invasões.
Na avaliação de Jungmann, o MST não tem mais um inimigo no poder contra quem se afirmar. "Surgem essas dissidências mais radicais, que podem muito bem ser cooptadas por dinheiro estatal", afirma.
Os dados da CPT mostram que, no primeira gestão de Lula, Pernambuco foi o Estado com o maior número de invasões: 344. São Paulo teve 228 e o Paraná, 157. A Folha utilizou os dados da CPT porque a Ouvidoria Agrária Nacional não os estratifica por município.
Colaborou Cíntia Acayaba , da Agência Folha

Marabá lidera o ranking nos dois governos

Da agência Folha

Marabá (a 568 km de Belém, capital do Pará), foco histórico de conflitos rurais, é campeã de invasões de terra tanto no primeiro governo Lula como no segundo governo FHC.
A cidade do sul do Pará registrou 23 invasões a fazendas nos últimos quatro anos. De 1999 a 2002, foram 16 ações.
"É uma área de expansão de fronteira agrícola, com muitos latifúndios e terras griladas", diz Bernardo Mançano, da Unesp. Ariovaldo de Oliveira, da USP, afirma que "Marabá é uma cidade que tem 1,5 milhão de hectares, mas 63% deles são terras devolutas [sem registro privado nem uso pelo poder público] da União. Há 126 grandes imóveis improdutivos".
Outros dois fatores ajudaram a atração de sem-terra no lugar: o fechamento, em 1992, do garimpo de Serra Pelada, que deixou cerca de 80 mil desempregados na região. O outro é a existência de uma linha férrea da Vale do Rio Doce ligando São Luís a Parauapebas (município próximo a Marabá), o que facilitou o deslocamento de migrantes.
O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel (PT-RS), diz que o governo investe na qualidade dos assentamentos de Marabá.
Em relação a Bonito -segundo lugar no ranking- e a Caruaru -quinto-, Pernambuco tem forte monocultura latifundiária da cana-de-açúcar. Já Teodoro Sampaio (SP) -terceiro lugar- fica no Pontal do Paranapanema, onde o MST é bem organizado. Maragogi (AL) -quarto lugar- tem alto índice de terras devolutas. (JCM, TR e CA)

Saiba mais:

MP que proíbe vistoria do INCRA está vigente, mas não é aplicada

A medida provisória 2.027, editada em 2000 por FHC e modificada em 2001 (MP 2.183), proíbe que o Instituto de Colonização e Reforma Agrária realize vistoria, por dois anos, em terras invadidas. Assim, o processo de desapropriação da área fica paralisado. Quando Lula assumiu, os movimentos do campo o pressionaram para que revogasse a MP. O ministro do Desenvolvimento Agrário à época, Miguel Rosseto, disse que mudaria alguns artigos. Mas a MP não foi revogada ou modificada até hoje, apesar de não ser aplicada.

FSP, 07/05/2007, Brasil, p. A4

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